Apimentando a relação- Giselle Sato



Sete horas. Até o sol parecia preguiçoso. Disquei pela terceira vez e a linha continuava ocupada, naquela segunda-feira infernal pós dia dos namorados, imaginei ser a única mulher tentando um horário na agenda apertada da ginecologista mais disputada da cidade, estava completamente equivocada.
Oito e meia da manhã desbotada, desde as seis eu estava com o celular nas mãos tentando decidir ser ou não ser inconveniente em nome do alívio de uma situação insuportável. Meu marido roncando ao meu lado, sinceramente, era inspiração para as piores maldades que uma mulher revoltada pode pensar.
Homem é uma raça, aliás, eles pensam o mesmo de nós mulheres, portanto ficam elas por elas. Então... somos duas raças distintas, que precisam amar, acasalar, confortar, e por aí vai. Mas definitivamente vivemos em pares, pelo menos a grande maioria.


Mas o que realmente interessa é que anatomicamente somos diferentes, deve ser por isso que nesta época do ano, dia dos namorados, as vitrines exibem lingeries, coisinhas lindas para dar uma sacudida na libido e nós mulheres, adoramos estas coisas.
Eu gosto tanto, que tenho uma coleção completa de roupinhas sensuais e fantasias eróticas, o pior é que as vendedoras não sabem nem disfarçar quando resolvo ir às compras. Talvez meus cinquentinha e uns quebrados assustem ou minha aversão às dietas, ou todo o meu conjunto. Não sei, só sei que é discriminação não fabricar tamanho GG, mas eu sempre acabo voltando pra casa com um monte de novidades após horas de buscas exaustivas. Portanto, sou uma jovem senhora moderninha, que gosta de sexo, fantasias, curte a vida e não finge falso pudores. Esta sou eu.


Meu marido adora todas as minhas comprinhas, ou finge, não sei... mas ele me incentiva bastante. Afinal, são trinta anos juntos sem deixar a peteca cair, salvo alguns deslizes e desconfianças jamais comprovadas. Da parte dele, é claro! Por estas e outras, haja imaginação para manter a chama acesa, e nós estamos sempre dispostos a experimentar. Finalmente a recepcionista da clínica atendeu:

-consultório da doutora Ana Paula, bom dia.- Só de escutar aquele bom dia, meu corpo tremeu de ansiedade.

- Oi Valéria, é a Ivonete. Estou com uma emergência, tem alguma vaga para hoje pelo amor de Deus? - Apelei mesmo, total desespero.

-Dona Ivonete, impossível, só pro dia vinte e cinco às dezenove horas.

-Menina, é uma emergência! Hoje é dia doze, como vou esperar até lá? Me encaixe aí, criatura

-Não tem como, a doutora não autoriza mais encaixe, mas se alguém desistir eu ligo pra senhora, pode deixar.

-Tá sonhando? E se não desistirem? Como é que eu fico? Valéria, estou desesperada.

-Olha, tem vaga para o doutor Ramiro, é aqui na clínica e se é uma emergência....

-Ai meu Deus! Vá lá... pode marcar mas eu quero a minha médica, já estou acostumada.

-A senhora consegue chegar em uma hora?

Peguei a bolsa e entrei no carro sem pensar em nada, Botafogo é um inferno para encontrar vaga pela manhã, mas era pegar ou largar. Preciso contar como tudo começou para o medico, e isto será altamente constrangedor. Digito o número do meu marido, apesar de saber que ele deve estar todo enrolado no trabalho:

-Ivonete! A feira está começando, a barraca está cheia de freguesas, o que aconteceu?

-Estou indo para a clínica, consegui uma vaguinha, não se importa nem um pouco não é? -silêncio-

-Manolo, você está me ouvindo?- agora eu já estou começando a ficar irritada.

-Mas é claro, não sou surdo. O que quer que eu diga? Boa sorte pra sua periquita?- e o palhaço solta uma gargalhada.

-Isto, ria bastante. Aproveite que vai almoçar na pensão e encomende quentinha pra semana toda. E pode levar sua roupa pra sua mãe lavar.

-Que é isso meu amor? Estou brincando? Minha mãe quase não enxerga, não faça isto Ivonete, a barraca está lotada e preciso trabalhar. Quer umas frutinhas? Uvas sem caroço? Quer?

-Não. Não quero nada Manolo. Lá em casa o que não falta são frutas, engraçadinho.

-Puxa, a ideia foi sua Ivonete, e por sua causa... não quero nem pensar neste assunto, senão me irrito. Espera aí! Você não está dirigindo e falando no celular? Está? Olhe eu não vou pagar mais multas por sua causa.

-Já estou desligando. Leve frutas pra você jantar, porque eu nem sei que horas volto. De repente fico internada a semana inteira até você se acalmar.

Odeio admitir mas Manolo estava certo, enquanto dirigia para a clínica ia pensando no que me levou a entrar naquela lojinha desconhecida e comprar praticamente todo o mostruário.
Sou impulsiva, compulsiva, mas desta vez tinha ido longe demais. Lembro que adorei a dona da loja, uma loura com jeito de bem vivida e sem meia palavras, foi logo me recebendo cheia de sorrisos, aquele diálogo ficará para sempre na minha memória:

-procurando novidades, amiga? Tenho cada coisinha aqui, muito interessantes... quer dar uma olhadinha?- e deu um sorriso.- Eu, já estava debruçada no balcão, meio acanhada com a presença de um rapaz e de um senhor na lojinha pequena no andar térreo do shopping.

-Meu marido e meu filho trabalham comigo, se incomodam eles podem dar uma voltinha.

-Não! Imagine! - Muito educados, eles se afastaram para um cantinho.

-Bem, o que gostaria de ver? Cremes? Temos novidades, gel lubrificante, excitante, comestível, perfumado, afrodisíaco, óleos que esquentam e esfriam...pastilhas.

-Humm... queria montar um kit para o motel, sabe como é né? Dia dos namorados? Meu marido reservou uma suíte para comemorarmos, e quero aquela roupinha da vitrine, aquela de noivinha...de tule e renda.

-Ah! aquela é linda mesmo! Vou te mostrar tudo e você escolhe.

-Tem aquela pomada que dizem que aperta a ''piriquita''?

-Heim? - De repente ela riu e pegou um potinho rosa, nele estava escrito apenas ''Love Tight'

-É americano? - Ainda perguntei e ela balançou a cabeça.

-Também não entendi o rótulo amiga, mas dizem que se passar na vagina, ela fica apertadinha por 15 minutos.

-Só 15 minutinhos? Puxa! Tem que ser rápido né? - Notei que ela não achou graça, mas coloquei o potinho em um coração de plástico vermelho, grande o suficiente para caber tudo que eu pretendia comprar.
E comprei. Quase duzentos reais em produtos, saí da lojinha cheia de apetrechos e feliz da vida, liguei para o meu marido. Claro! Ele ficou todo contente, estava com a barraca cheia de freguesas, mas falamos em código:

-Manolinho, adivinha só onde eu estou? - Quando eu quero, sou tão dengosa.

-Gastando meu dinheiro em algum shopping, para estar nesta felicidade.

-Tinha que estragar tudo, estou comprando nosso presente do dia dos namorados, acabei de sair de um ''sexshop'', lembra que você queria que eu comprasse umas novidades? Eu comprei tudo.

-Sério? Comprou tudo mesmo? Comprou o tal do creme?

-Puta que pariu! Você só pensa nisso, comprei...comprei o creme de dar a bunda.

-Ai! Ai que finalmente vou realizar meu sonho sem ter que ficar implorando, jura que comprou? Quantos vidros? Compra logo um monte Ivonete, contigo tudo é mais complicado.

-Não estou entendo, não tem freguesa aí na tua barraca não? Está muito assanhado.

-Ninguém sabe o que estou falando, compre os cremes de beleza que eu pago, de presente do dia dos namorados. Entendeu?

-Já comprei, e tem muitas outras coisas também, não é só isso não, pode ficar calmo

-.Oba! Então é hoje! Vamos sair de casa cedo, não vou pegar fila não.

-Tá maluco? Motel não é matinê. Se você reservou, vou chegar a hora que eu quiser.

Desliguei e fui para o salão, fiz depilação, unhas, fiz tudo e mais um pouco. Quando voltei para casa já era noite e Manolo estava arrumado, assistindo TV e bebendo cerveja. Com certeza havia dormido e estava pronto para a noitada, depois de tantos anos de casados, eu ainda achava meu marido muito atraente, exatamente como há trinta anos atras. Bem, vinte quilos a mais, alguns fios de cabelos brancos, mas ainda éramos os mesmos malucos apaixonados e implicantes. Manolo ficou parado admirando meu vestido novo, elogiou todos os detalhes e ainda me deu um perfume de presente:

-Não precisava querido, com este são quatro presentes.

-Mas se foi você que escolheu todos eles Ivonete, e ainda encomendou todos nas vizinhas, nem devolver eu posso senão vão me chamar de caloteiro. Você é bem cara de pau, saiu marcando nas revistinhas de todas elas e eu só abro a carteira.

-Você mandou eu escolher umas bobagens para impressionar as fofoqueiras, e isto porque você quer ser reeleito síndico. Bem cínico da sua parte, seu Manolo

Entramos no carro e partimos para o motel, bonito e novinho. Só a fachada era um requinte todo em mármore e neon, com estátuas gregas e fontes. Muito fino e de bom gosto.
A suíte era um sonho, cama imensa, teto com espelho, piscina, sauna, banheira enorme com uma fonte miniatura e até pista de dança. E a decoração era toda em vermelho, almofadas enormes, tapetes e som maravilhoso tocando musicas românticas

Corri para o banheiro e fui colocar a roupinha branca, o corpete de renda estava meio justo mas deu para vestir, já as meias não subiram de forma alguma e quando Manolo bateu na porta pela quarta vez, desisti e coloquei só a liga e calcei o sapato alto. Uma calcinha cheia de babadinhos curtos na frente e compridos atras, eram a graça da tal roupinha.

Quando saí, haviam rosas na cama e Manolo já estava usando um roupão vermelho de cetim, todo esparramado na cama king... fui caminhando até lá com um andar bem sexy, me sentindo a toda poderosa e sedutora:

-Nossa amor! Que noivinha mais linda!- Manolo estava realmente encantado.

-Vou pegar nossa surpresa. - peguei a caixinha em formato de coração e coloquei na cabeceira da cama.

-E então, o que você sugere? Você comprou tantas coisas... por mim testava o creme da bundinha.

-Ah! eu sei o que você tem em mente, calma que este é para o final.- E abri a caixinha. Os potinhos eram muito pequenos, peguei o tal rosinha que prometia a quase virgindade e discretamente me besuntei

-Este aí serve pra que Ivonete? - Manolo queria saber tudo.

-É um excitante feminino, mas vou passar em você o masculino, espera aí.- E abri o potinho azul que prometia retardar a ejaculação, por via das dúvidas também peguei uma boa porção e mandei ver no Manolo.

-Nossa Ivonete, este negócio é quentinho. Gostei, está ficando até dormente ….uma sensação de calor e parece até que está crescendo, ele não está maior? Olhe só Ivonete.

E começamos a brincadeira, peguei o óleo de chocolate que esquentava e derramei nos seios, ele foi escorrendo e melando tudo porque era comestível e muito doce. Manolo tentou fingir que estava gostando, mas enjoou e cheiro artificial de chocolate era muito forte. Discretamente, peguei uma toalha e passei no corpo tentando tirar o excesso, mas não adiantou muito. Zero ponto para o óleo açucarado.


Resolvemos então partir para o velho oral, porque este nunca falha, sempre dá um jeito na situação. Lá estava Manolo, tirando minhas calcinha de renda feliz da vida quando lembrei das pastilhas, e propus :

-Amor, tem uma pastilhinha de colocar no céu da boca, que dá uma sensação maravilhosa.

-Então me dá , anda logo Ivonete. Abre esta caixinha depressa. Nossa! mas é muito pequena, parece papel, é tão fininha, uma só? Me dá logo todas, que coisa mais mesquinha depois compramos mais. Me dá logo todas Ivonete.

Na caixinha estava escrito para usar uma folha de cada vez, mas meu marido colocou todo o pacotinho na boca e caiu de boca.
O grito que soltei definitivamente não foi de prazer, porque aquela quantidade me fez ver estrelas. O sabor de menta ardia insuportavelmente, esqueci tudo e corri para o banheiro, entrei debaixo do chuveiro e deu uma aliviada. Voltei morta de vergonha e raiva de Manolo:

-Uma, está escrito para usar uma folha de cada vez e você encheu a boca. Olha o que aconteceu, tá ardendo Manolo.

-Mas a tal balinha até que é gostosa, fiquei com a boca geladinha.- E ele ria tanto, que eu acabei rindo também, para não estragar a noite resolvi não dar importância e continuar com a noite de amor.

-Ivonete, não sei o que está acontecendo, não está dando para encaixar a coisa.

-Ai Manolo, acho que passei demais o tal creme que aperta.

-Mas Ivonete, que merda você fez... e agora? Estamos aqui há um tempão e não fizemos nada, sua xereca está fechada e o meu pau... Meu Deus! Olhe o meu pau! Ivonete!

-O efeito passa em quinze minutos. Calma...Calma...

-Tem mais que isso e não passou não. Olhe o meu pau, tá inchado e dormente, acho que você passou alguma coisa errada nele. Ivonete, vamos para o hospital agora.

-Calma Manolo, o efeito vai passar a mulher da loja falou.

-Que se dane a mulher da loja, quem vai ficar sem pau sou eu, põe a roupa que eu vou pro hospital. Olhe que horror Ivonete! Está ficando todo empolado e vermelho, Ivonete se meu pau cair eu te mato, juro que te mato.

-Manolo, calma. Tome um banho. Isto sai com água e sabão.

Mas não saiu, ele tomou banho e não adiantou nada, dali mesmo fomos para o pronto socorro. Manolo não falou uma só palavra, eu tive que assumir toda a culpa para o médico, depois de olhar os potinhos, ele disse que provavelmente Manolo era alérgico a alguma daquelas substancias. Perguntou se eu estava bem, e menti que estava ótima só para não dar o braço a torcer, Manolo voltou para a casa furioso, resmungando horrores e reclamando do preço dos remédios.






Dr. Ramiro






Mal entrei na clínica, agradeci à recepcionista e como é de praxe, entreguei uma cestinha de uvas variadas da nossa barraca de frutas, estes pequenos mimos sempre foram minha forma de agradecer. Dois minutos depois o médico me chamou, fez as perguntas, fui sincera e contei tudo.
Após o exame, me tranquilizou, medicou e recomendou que ponderasse sobre o uso dos apetrechos, fiz aquela cara de samambaia e balancei a cabeça concordando.


No fundo acho que fiz uma tremenda confusão, não li nada direito e não estudei os panfletos. Não vou me desfazer de nada que comprei no sexshop, pretendo fazer outra incursão no mundo dos potinhos mágicos, Manolo pode ser um problema mas desta vez vou usar tudo sozinha. Afinal, os vibradores ainda estão na embalagem e o gel estimulante promete um orgasmo incrível. Enquanto isso, sigo com a pomada prescrita pelo dr. Ramiro.

Giselle Sato
Enviado por Giselle Sato em 01/07/2011
Reeditado em 01/07/2011
Código do texto: T3067912
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.