A Parábola do Velho Cais

Durante o feriado da Páscoa/Semana Santa eu praticamente não saí de casa, passei quase todos os dias em casa curtindo/aturando Yoshi e Toph, que são a noor dos meus olhos. "Não sai de casa" é, obviamente, um modo de falar, sai uma vez pra comprar comida e, foi nessa rápida saída, que conheci aquele velho Cais...

Era um Cais velho, muito velho mesmo, cheguei, inclusive, a relembrar a sensação que tive do encontro dos Hobbits com Barbárvore, o Ent. Pois bem, não obstante ao fato de ser velho, o cais ainda era resistente, fora bem projetado, as estacas eram de andiroba, madeira bastante resistente à água e o soalho feito de largas tábuas de cumaru presas por longos parafusos galvanizados. Atualmente andava meio desnivelado, várias tábuas já lhe faltavam e algumas estavam mal pregadas ou soltas, mas ele continuava lá, como que a ostentar a velha imponência de outrora, dos tempos de antanho, como diria Jorge Amado.

O Cais situava-se bem no meio da praia Bragantina Independente, e era constantemente açoitado pelas marés de água salgada características daquela região. Duas marés por dia, catorze dias de maré lançando e catorze quebrando, durante os 365 dias do ano. Dura rotina. Em verdade, se a rotina fosse só essa, até que seria, de certo modo, deveras aprazível ao velho Cais, mas não era esse o caso: o velho Cais tinha, sempre atado a ele, seis embarcações que foram abandonadas há tempos e acabavam por desgastar ainda mais a já comprometida estrutura do Cais.

Um pescador que por lá passou contou-me que, há cerca de um ano, um dos barcos, de tão velho, cedeu à própria improdutividade, apatia e desmazelo e acabou por partir-se e afundar, deixando o Cais, ao mesmo tempo, triste e aliviado. Triste por perder um companheiro, já que, queira ou não, os barcos eram os únicos que conversavam com o Cais, e aliviado por ter se livrado das dores e atribulações que o barco provocava.

Esse pescador costuma utilizar o Cais como local de reflexão e, depois de já desfrutar de uma certa intimidade, segredou-lhe uma verdade: alguns barcos ainda eram relativamente novos e poderiam lançar-se ao mar, desbravá-lo enquanto ainda havia um lugar para onde voltar, mas deveriam fazê-lo antes que o Cais sucumbisse, desse modo, todos estariam livre e, ao mesmo tempo, atados à suas próprias liberdades, caso contrário, o mar levaria todos, um a um, sem comiseração alguma.

Magno Brito e Silva
Enviado por Magno Brito e Silva em 20/06/2011
Código do texto: T3046817
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