REALIDADE NÃO VIRTUAL

- E então doutor? – diz empolgado – Estou contratado?

- Senhor Luís, eu sinto muito.

- Como? O que o senhor está querendo dizer? – sua empolgação se transforma em apreensão, é como se tivesse levado um banho de água fria.

- Estou querendo dizer que...Que...Infelizmente...Infelizmente...

- Infelizmente???

- Eu sinto muito. Sinto muito, mas, infelizmente o senhor não será contratado pela nossa empresa, por favor, me desculpe.

- O senhor está brincando não é? É tudo brincadeira. Tudo bem o senhor quase me enganou. Agora vamos acertar tudo, não é verdade?

- Não senhor. Isto não é uma brincadeira. Gostaria que fosse, mas, infelizmente não é.

- O que aconteceu? Eu tenho um ótimo currículo, o senhor mesmo me disse isso. Disse que eu era o melhor que tinha aparecido para essa vaga. O que aconteceu? – grita – O que realmente aconteceu?

- Por favor, acalme-se senhor. O senhor está muito nervoso. O senhor é um ótimo profissional, um dos melhores, talvez o melhor que apareceu aqui atrás deste emprego, mas, infelizmente o senhor não se encaixa no perfil de funcionário que a empresa procura. Eu sinto muito senhor, com certeza seria um prazer tê-lo como companheiro de trabalho, mas infelizmente não posso fazer nada.

- Como assim? Como eu não me encaixo no perfil desta empresa? Que perfil é esse?

- Senhor, temos algumas regras aqui, eu já disse que o senhor é um ótimo profissional, mas, a empresa procura outro tipo de profissional, é uma pena que o senhor não se encaixe, agora...

- Tudo bem, entendi.O perfil procurado pela empresa é: jovem, recém formado, de preferência com um sorriso superficial no rosto. Não é preciso experiência anterior, pois, nosso cartão de visitas é a beleza e a jovialidade de nossos funcionários. Com certeza a fotografia de final de ano da sua empresa irá causar suspiros nas mocinhas de plantão e calafrios nos seus clientes.Não é verdade?

- Não é bem assim senhor Luis, mas, procuramos jovens talentos, se o senhor tivesse uns dez anos a menos com certeza seria um ótimo funcionário para nossa empresa, mas o senhor não tem dez anos a menos, infelizmente, para ambas as partes. Agora, por favor, me dê licença, tenho uma agenda super lotada hoje.

- Quarenta e três anos. Quarenta e três anos e já sou considerado velho para exercer minha profissão. Olhe aqui – grita – Olhe bem no meu rosto e diga, sou velho? Pareço um velho?

- Para o perfil pretendido pela empresa sim. Agora, por favor, passar bem.

- Passar bem. – Luis se levanta e vai saindo chateado, derepente ao chegar na porta ele se vira e grita com todas as suas forças – Passar bem. É isso que você tem a dizer para um profissional como eu? Passar bem.

- Senhor Luis, se o senhor não sair daqui imediatamente vou chamar a segurança.

- Seu engravatado filho da puta!

Dizendo isso Luis saca um revólver e aponta para o executivo.

- E agora? Quem é velho aqui? Heim? Vamos, diga que eu sou velho para trabalhar nessa merda de empresa? Diga?

O rapaz está assustado e não sabe o que fazer, ele sua frio, suas mãos estão trêmulas, ele está com medo, muito medo.

- Diga – diz gritando – Diga que eu sou velho antes que eu estoure seus miolos.

- Você...O senhor está velho para exercer o cargo que pretende aqui na empresa, infelizmente procuramos uma pessoa mais jovem.

- Desgraçado filho da puta.

Derepente a porta se abre, em um movimento rápido Luis avança sobre o executivo, agarrando-o pelo pescoço e colocando o revólver na sua cabeça, Maria a secretária entra.

- O que está acontecendo...Meu Deus – diz ela ao ver seu chefe assustado, com uma arma sendo empunhada contra sua cabeça.

- Saia daqui – grita Luis – ou eu o mato.

- O que está acontecendo aqui? – diz ela.

- Saia daqui – diz Luis engatilhando sua arma.

Ela sai fechando a porta.

- O que você acha que está fazendo? Você só está tornando as coisas mais difíceis do que estão? O que você quer? É dinheiro? Vamos diga o que você quer.

- Eu quero um emprego. Só isso. Um emprego.

- Eu não posso te dar um emprego, são normas da empresa, eu não posso desobedece-las, sou empregado aqui, eu gostaria muito de tê-lo como companheiro de trabalho, mas não sou eu quem manda por aqui.

- Droga. Droga. Droga. – grita. – será que é tão difícil assim, será que eu não conseguirei, mas nenhum emprego nessa minha vida.

A policia entra na sala, são dois homens armados.

- Senhor, por favor, solte esse homem – diz um deles- ou atiraremos.

- Vocês estão loucos – diz o executivo – Ele pode me matar.

- Fique tranqüilo senhor, temos a situação sobre controle.

- Um passo a mais e eu estouro os miolos dele. É só dar um passinho a mais, e vocês verão o que vai acontecer aqui.

- Senhor Luis me solte, eu prometo que conversarei com meu chefe, e procuraremos encaixa-lo em uma outra função. Uma função que condiz com as normas estabelecidas pela nossa empresa.

- As normas estabelecidas pela empresa, é só isso que você sabe dizer? Se eu solta-lo com certeza serei preso, não sou nenhum idiota.

- Eu lhe dou minha palavra. Nada acontecerá com o senhor, é só me soltar e esqueceremos o que aconteceu por aqui, passaremos uma borracha nesse episódio de nossas vidas, e talvez venhamos até a trabalhar juntos, é só me soltar.

Luis abaixa um pouco a arma, aos poucos vai soltando seu refém.

- Você promete que vai interceder por mim perante seu patrão? Promete?

- Sim. Eu te dou minha palavra que sim.

Luis o solta. Quando Luis abaixa a arma, um tiro é disparado, o executivo grita, mas em vão, o tira acerta Luis que cai no chão quase sem vida.

- Ai!!! – grita Luis

- Seu idiota, veja o que voce fez, voce matou o rapaz.

- Senhor ele estava pondo sua vida em risco.

- Luis...Luis...Você está bem.

Luis esta com a respiração ofegante, ainda lhe resta um sopro de vida.

- Acho que sim, pois tudo acabou.

- Não, não acabou, você não pode...

- Posso sim. – sua respiração vai se tornando cada vez mais difícil – Agora eu vou descansar...Sinto muito pelo o ocorrido, eu estava desesperado, precisava muito desse emprego, muito mesmo...

- Ele é seu, amigo.Ele é seu.

- Obrigado, mas creio que eu não preciso mais dele...

- Precisa sim...

- Não, não preciso...Você me faz um pequeno favor?

- Claro, pode pedir o que quiser. O que quiser.

- Diga a minha esposa e a minha filha que eu amo muito elas.Que onde eu estiver farei de tudo para protege-las, de tudo.

- Eu acho que é melhor você dizer isso a elas.

- Promete que vai fazer isso?

- Mas...

- Promete?

- Prometo!

- Diga também...Que...Eu...Sinto muito...Não era para ser assim...- suas forças estão no limite, ele começa a chorar baixinho, pois não tem mais força – Sinto...Muito.

Dizendo isto Luis fecha os olhos, morrendo nos braços do executivo que chora, chora como nunca havia chorado antes.

Marc Souz
Enviado por Marc Souz em 24/08/2006
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