Dúvida extrema
Largou a navalha. Estava pronto finalmente. Aliás, quase pronto. Ainda faltava se vestir. Saiu do banheiro e foi para o quarto. Tirou a toalha vermelha, a qual estava cobrindo seu corpo da cintura para baixo. Vestiu-se, o smoking alugado para a ocasião parecia recém saído da loja, estava como novo. Sentiu-se especialmente importante apenas por usar aquela roupa, não pensava mais no evento que o fizera alugá-la. Não pensava mais em seu discurso, nem que uma multidão o estaria analisando, ouvindo e também aplaudindo, mesmo que falsamente, suas palavras.
Voltou ao banheiro, acabou se lembrando do discurso que faria em breve, sentiu um nervosismo se apoderando de sua mente, seu estômago voltara a doer, ficou tonto, nauseado. Gotas de suor lhe molharam a testa. Olhou-se no espelho novamente e se lembrou de um filme, no qual um barbeiro, seriamente perturbado, usava sua navalha afiada para matar pessoas, cortando suas gargantas. A dona de uma loja de empadas, comparsa do ensandecido barbeiro, transformava os corpos em empadas de carne e as vendia em sua loja. Guilherme voltou a si. Pensou em usar sua navalha, não tão bem afiada, para cortar a garganta dos falsos que iriam lhe sorrir e aplaudir em breve. Assim se livraria do discurso. Odiava falar em público! Mas o que faria com os corpos? Não conhecia nenhuma dona de loja de empadas para ceder a matéria prima para confeccionar as saborosas empadas de carne. E muito menos sabia cozinhar ou até mesmo fazer empadas!
Pegou as chaves do carro e saiu, decidira fazer seu discurso, mas por via das dúvidas, guardara a navalha no bolso direito da calça.