Tomaz . . . Vá em paz !!

Dia lindo, com sol e céu azul. Avenida movimentada do Rio de Janeiro com vários carros indo e vindo. Pelos modelos dos carros e as placas amarelas, podemos notar que se trata da época dos anos oitenta. Um jovem rapaz de dezesseis anos, escutando “walkman” com um fone enorme tipo de “DJ”, vestindo camiseta, jeans e tênis All Star vermelho, atravessa a avenida. No sentido oposto vem um fusca branco e o atropela.

Teto branco do hospital. O Soro está pingando e um aparelho apita constantemente. O jovem rapaz está na cama inconsciente.

Uma mulher aparentando um pouco mais de trinta anos, se aproxima da cama e passa a mão nos cabelos do rapaz. Ela começa a chorar e vai até a janela. Sua imagem fica contra a luz que vem de fora, ficando visível apenas a sua silhueta.

Quando ela sai da janela e volta pra perto da cama, podemos notar que o tempo passou. A mãe aparece agora mais velha. Quinze anos se passaram, mas pela aparência dela parece ter passado muito mais.

O rapaz ainda está na cama, perdeu a feição de adolescente, agora é um homem aparentando trinta e poucos anos. Os aparelhos e os objetos do quarto estão diferentes e mais modernos.

A mãe vai até a cama e quando vai passar as mãos nos cabelos do filho , ENTRA um médico.

___ Bom dia !

___ Bom dia, doutor !

___ Precisamos conversar. Os sinais vitais do Tomaz estão cada vez mais fracos e precisamos rever a real necessidade da sua manutenção neste estado de coma!

___ Mas como assim, doutor ??

___ Dona Leocádia, quanto tempo a senhora já está nesse sofrimento. Olha só pra senhora . .. Não foi só o seu filho que parou de viver . . . A senhora também . . . Vive assim ...Visivelmente esgotada e cansada . . .

___ Não . . . Ele está bem . . . Ele vai se recuperar ...Eu sei doutor . Algo dentro de mim me diz que ele vai voltar.

___ O caso não é tão simples assim . . . A direção do hospital não quer mais manter o seu filho nestas condições por acharem desnecessário tal procedimento. E estão decididos a cortar o convênio e a verba do auxílio medicação.

Dona Leocádia começa a chorar

___ A senhora não sabe o quanto está sendo difícil pra mim, ter que dar esta notícia.

Tomaz é transferido para casa, onde é montada uma verdadeira clinica, com toda a aparelhagem necessária para mantê-lo vivo.

Até que um dia, quando Dona Leocádia acaba de fazer a barba do filho, Tomaz abre os olhos e acorda do coma. A mãe demorava a acreditar. Chorando abraçava e beijava o filho insistentemente, de tanta alegria.

Dona Leocádia explica que ele ficou quinze anos em coma.

Com alguns dias, Tomaz já estava totalmente recuperado.

Como sugestão do médico, Tomaz tem um diário, no qual relata todo o seu dia a dia depois do coma.

A vida de Dona Leocádia mudou. Ela está novamente feliz e sorri constantemente.

___ Mãe . . . Vou dar uma volta . . . Fiquei tanto tempo fora de mim, que preciso ver o mundo, as pessoas !!

A mãe hesita um pouco, mas logo concede que Tomaz faça seu passeio, afinal ele não é mais nenhuma criança. Dá um abraço bem apertado no filho e um beijo na testa.

___Vá com Deus ! Cuidado.

Tomaz anda pela na rua, sem destino. Fica admirado como as coisas estão diferentes no bairro .

___ Poxa, não sei nem onde procurar os amigos de antigamente.

Até que caminhando passa um motoqueiro, fica olhando pra ele . O rapaz tira o capacete e diz.

___ Tomaz ??

Tomaz olha para o rapaz franzindo a testa, meio confuso.

___ Léo ??

Acaba reconhecendo Leonardo, um de seus velhos amigos.

___ Caramba . . . Não acredito, me disseram que você estava entre a vida e a morte.

Os dois amigos se abraçam.

___ Pois é . . . Eu realmente estava, mas depois de quinze anos de coma, num belo dia, resolvi acordar.

___ Nossa, que coisa . . . Até parece coisa de filme.

___ Nem fala . . . Está sendo tudo novo pra mim.

Tomaz olha a moto do amigo

___ Poxa . . . Essa moto é linda, hein !!

Leonardo entrega um capacete para Tomaz.

___ Toma, vamos dar um role pela cidade !!

Os dois passeiam por vários lugares da cidade. Vão à praia, ao Maracanã e em diversos pontos turísticos do Rio de Janeiro.

Ao cair da tarde, os dois chegam à esquina da casa de Tomaz, que desce da moto e tira o capacete.

Tomaz atravessa a avenida e entra em casa. Conta todas as novidades pra mãe.

___ Nós iremos amanhã novamente. O Léo vai passar aqui de moto pra me pegar.

___ De moto, Tomaz . . . Não é perigoso ??

___ Claro que não mãe . . . Confia em mim . . . Olha esse aparelho que ele me deu, se chama mp3. Preciso me habituar com as novas músicas que estão rolando por aí.

Tomaz está muito empolgado com tudo que está redescobrindo. No dia seguinte, Tomaz toma o café e sai novamente de moto com o Léo. Novamente eles percorrem vários lugares da cidade, sempre esbanjando sorrisos de felicidade.

Dona Leocádia visivelmente triste, está toda vestida de preto, no quarto de Tomaz olhando a cama e os pertences. Ela para diante da cômoda, acaricia o retrato do filho, folheia o diário de Tomaz, até a última página escrita e começa a ler :

“Tive um dos dias mais felizes da minha vida . . . Revi uma verdadeira amizade, vi o sol, o céu azul, o mar . . . Vivi intensamente esse dia, compensando todos esses anos que estive ausente á toda essa beleza que o mundo tem a nos oferecer. E além de tudo isso, pude ver minha mãe sorrir de novo . . . Pude perceber o quanto o amor dela transcende qualquer explicação. Agradeço a Deus por todo o amor que ela me dedicou, mesmo durante todos esses anos que eu estive fora de mim. Como eu a amo . . . Se eu morrer hoje, eu morro em paz . . . Morro feliz !! “

Dona Leocádia começa a chorar e rir ao mesmo tempo, abraçando o diário de Tomaz. Ela olha para cima e diz:

___ Te amo, meu filho . . . Sempre irei te amar . . . Tomaz . . . Vá em paz !!

( Dia anterior . . . )

Tomaz está sorridente, no outro lado da avenida, se despedindo de Léo. Está com um fone de ouvido escutando música no mp3. Ao atravessar a avenida, um caminhão o atropela e arremessa seu corpo a alguns metros, como aconteceu com o fusca,há quinze anos atrás. . . Seu corpo fica ao chão e seu espírito levanta em forma humana.

Surge um rapaz sorridente com aparência bem jovial e lentamente vai ao seu encontro.

____Estava a sua espera. . . Vamos,Tomaz . . .

Tomaz com a aparência extremamente serena, segura na mão do sorridente desconhecido . Brotam imensas asas brancas das costas do rapaz, e os dois somem num brilho no céu .

FIM

Luiz Brigadeiro
Enviado por Luiz Brigadeiro em 09/07/2008
Código do texto: T1072359
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