Migalhas.

Migalhas.

Era uma manha chuvosa. O vento sussurrava um idioma inteligível apenas aos loucos. Os pingos da chuva batucavam na janela uma sinfonia à claustrofobia daquela cozinha. Sandra estava sentada na mesa olhando para as migalhas de pão do que fora o café-da-manhã. Refletia.

“será que tudo que sobra do amor é isso. Migalhas de pão numa manha chuvosa e solitária de despedidas?”.

Minutos de silêncio contemplativo característicos de almas pesadas, olhar baixo, suspiros e cigarros. Algo lhe chama a atenção.

“mas olhe. Dessas migalhas, no meio dessas sobras insignificantes. Formigas. As formigas aproveitam o que rejeitamos para se alimentar. Migalhas de coração podem sorver alimento para quem aceita o que foi rejeitado?” O olhar de quem tem uma idéia. O olhar da epifania, da revelação toma conta de Sandra. “é isso!”.

Retirou-se, foi para o quarto.Tomou um banho, vestiu seu melhor vestido. Ficou bonita. Depois saiu para alimentar os vermes com as migalhas de seu coração mutilado.