O passeio na Varginha
Nosso passeio a São José da Varginha durou, se muito, um fim-de-semana, embrenhado naqueles anos cinquenta, de tanta estrada poeirenta. E embora não tenha ido para os anais, volta e meia lembrança nos traz, de tantas aventuras que aí vivemos, com papai e mamãe, na companhia de tia Conceição, tio Hildebrando, e o primo Zenrique, no auge de sua pre-puberdade.
Não sei se já era cidade aquele São José varginhal, mas era acolhedor, em seu melhor sinal. Ficamos logo na pracinha central, que ostentava uma igreja no meio, e o casario miúdo e algum nascente e renitente comércio à sua volta. E nos acomodamos ali, naquela casinha assoalhada, com uma bica d´água no quintal.
Entregues os maiores à conversação, contação de causos, e começão de biscoitos, fomos badalar na rua seguindo o primo Zen. Quanta travessura ele não nos doutrinou ao longo de uma única jornada. A que mais se ressaltou, e até alguma fé inspirou, foi na expulsão dos morcegos na torre da igrejinha. Bambu em punho, primo Zen, como Cristo com o chicote a mão, deixou o tempo limpo, feito o Olimpo de Zeus. Morcegos, adeus. A caçoação com o moleque Bodega foi outra parte da refrega. Bodega vivia a ruar e de primo Zen nunca queria se afastar, apesar.
O fato mais notório entretanto, estripulia e tanto, ficou por conta e ponta de papai, que pra mostrar suas artes de ginete, pegou o cavalo d´alguém foi dar a volta na praça, esbanjando coragem e graça. E não foi que, a certa altura, o animal empinou com ele e por muito pouco não caia de costas, esborrachando-o contra o chão. E o susto não teve igual não, para aquele destemido peão.
Noitinha, janta servida e sorvida, foi a hora de ouvir histórias. Escabrosas na língua de tia Ção, sobre demandas de terra e feitiçaria, tema predileto na região. Se me já foi o enredo, lembro ainda com medo, de um esperto e traiçoeiro Zé do Nato, que só perdia na maldade para um Nico Amâncio, feiticeiro de verdade.
Mas dormir no assoalho, apertadinho, naquele zelo, tirou toda chance de pesadelo.