O menino que gostava de futebol mas não sabia jogar.
Desde muito pequeno Augusto, comumente apelidado pelos colegas de Gugu sempre gostara de futebol. Não perdia um só jogo pela TV. Era fã de carteirinha de grandes craques do futebol brasileiro e do time de sua cidade, que disputava o campeonato estadual e o brasileiro da terceira divisão.
Quando ia ao estádio municipal com seu pai nos finais de semana ver os jogos do seu time de coração, era para ele sempre uma grande alegria.
Porém, mesmo sabendo o nome de todos os jogadores, os títulos já conquistados, qual o maior artilheiro de seu time favorito, não aprendera a jogar futebol com desenvoltura.
Mesmo assim estava sempre na quadra da escola, de tênis e meião, pronto para entrar em quadra se alguém de bom coração o escalasse.
Os seus colegas quase nunca o convidavam para bater aquela pelada na quadra da escola, seus coleguinhas já haviam percebido que Gugu não levava muito jeito pra coisa.
Para ele, ser deixado de lado, todas as vezes que seus coleguinhas montavam os times para disputar o campeonato escolar era um grande incomodo. No máximo por alguma consideração era deixado na reserva e quando era escalado era porque não havia jogadores suficientes para completar duas equipes.
Todo final de semestre na escola, acontecia o campeonato de futsal organizado pelo professor de educação física.
No jogo de abertura o goleiro Dedé titular do time do Makelelê, não pode vir. Admirado por suas defesas espetaculares, todas as equipes de futebol da escola o queriam no time, pois era certeza de que não tomariam muitos gols.
O professor Raimundinho organizador do torneio perguntou:
- Onde está o goleiro Dedé?
Alguém respondeu :
- Não pode vir, está doente.
E agora?! Falou o Makelelê, capitão do Picoense futebol clube e responsável pela escalação.
Olhou para um lado, olhou para o outro e lá estava o Gugu, sentado na arquibancada observando tudo, encabulado e ansioso pra que alguém lhe chamasse para entrar no jogo. Tinha quase certeza que isso iria acontecer, pois não havia jogadores suficientes para formar o time da 2ª série.
Makelelê que tinha este apelido por se parecer muito com o jogador africano, gritou:
- Oh Gugu!, quer jogar no gol enquanto aparece alguém?
A pergunta doeu lá no fundo.
Olhou para a arquibancada lotada, todos os garotos e garotas que ele conhecia estavam lá. A charanga tocando, todos gritando, aplaudindo e torcendo para o time de sua classe.
Naquele momento na cabeça de Gugu uma multidão de pensamentos positivos e negativos o afligia. Que decisão tomar. E pensava com seus botões.
Jogar no gol?! Nunca fiz isso, será se vai dar certo?! Se perguntava ele inseguro. E se eu tomar um frango vão me zoar pro resto da minha vida escolar.
Mas ele não titubeou, não podia perder aquela chance, poderia ser a última.
Balançou a cabeça afirmativamente e foi logo se aproximando.
O jogo começou era o time do Bino, batizado por ele próprio de Parnaiba futebol clube (cidade do norte do Piauí onde ele nascera) contra o time do Makelelê o Picoense foguete futebol ( diziam que era o time mais rápido da escola) com o Gugo improvisado no gol, a expectativa é geral.
A partida se inicia ao apito do juiz.
Logo de cara o Parnaiba, time do Bino arrumou logo um escanteio pela direita. Cabeçada no ângulo superior direito, parecia indefensável, mas não era. Gugu com grande agilidade e reflexo, saltou e de mão trocada e no ar como manda o figurino, fez uma defesa de tirar o fôlego.
A surpresa foi geral. Todos os jogadores inclusive os de seu time olharam uns para os outros não acreditando no que viram.
Gugu, todo orgulhoso, ouvia as meninas da terceira série na arquibancada gritando:
- Âo, âo, âo... gugu é um paredão.
Quando Gugu ameaçava um grito de desabafo, ouviu algo que lhe deixou meio desanimado. O Bino que havia dado a cabeçada falou baixinho para o Meleca, que tinha esse apelido por viver enfiando o dedo no nariz:
- A defesa dele foi sem querer, vamos ver na próxima.
Gugu ouviu, mas fez de conta que não ouviu e não se deixou abalar. Encorajou-se mais ainda para confirmar que sua defesa não fora acidental e manteve a concentração na partida.
Na jogada seguinte o time de Gugu, numa cobrança de falta marca o gol. Agora 1 x 0 para o Picoense futebol clube.
Na seqüência um chute forte de longa distância, Gugu está lá e faz a defesa com segurança. Aplaudido por toda a torcida ainda desconfiada.
No lance posterior, pênalti marcado contra o time de gugu. Era a chance de Gugu provar para todos que havia achado a posição certa pra jogar futebol. Evitar o gol de empate e garantir o 1x0 no placar. Até porque o jogo já estava nos minutos finais.
Todos do time ainda não acreditando em Gugu como goleiro, gritavam e sorriam e a torcida em coro cantava:
- ê ê ê, agora eu quero ver, o Augusto defender.
Bino muito arrogante pediu a bola e falou:
- Deixa que eu cobro!
Ninguém tinha dúvida, Bino além de ser um bom jogador de futebol, tinha um chute muito forte.
Gugu sabia que todos estavam avaliando seu desempenho e se concentrou. Sabia que se pegasse aquele pênalti venceriam o jogo, seu time classificaria para a decisão e como goleiro se consagraria perante seus colegas de classe e talvez até se tornasse goleiro titular em definitivo do time Picoense futebol clube. Enfim, mudaria sua vida.
Porém, caso não defendesse, poderiam perder o jogo e ainda correria o risco de ser responsabilizado por seus companheiros de time.
Mesmo assim ele estava convicto de que já era um vencedor, pois tinha feito uma grande partida com grandes defesas evitando uma goleada. O pênalti seria só um lance isolado no jogo.
Como se vê Gugu começa a adquirir confiança e gosto e pela posição de goleiro, posição que até então, nunca se imaginara jogando.
Gugu se concentra no centro do gol. Desvia o olhar do cobrador evitando assim cair na sua ginga de batedor experiente. De postura firme, olho fixo na bola para identificar sua trajetória e sair no lance, espera a cobrança, que vem em alta velocidade no canto esquerdo.
Gugu sai para a direita e a bola acerta a trave esquerda volta para a quadra onde o jogador arremata de primeira, uma bomba em direção ao gol na tentativa de finalizar o pênalti perdido, Gugu espalma para escanteio e ouve o apito do juiz marcando o final do jogo. Era a classificação consagradora.
O Picoense finalmente havia vencido o Parnaiba pela primeira vez, graças a goleiro que naquela noite inspirada fechou o gol.
Todos correram para abraçá-lo, inclusive as meninas da torcida. Ele era agora o novo goleiro da escola, prestigiado por todos.
Desde então Augusto nunca mais fora discriminado e os coleguinhas aprenderam que ninguém é tão incapaz que nada possa aprender a fazer algo novo.
Se você não faz algo que quase todos fazem com facilidade, você pode fazer outra coisa que também é útil a você e a todos que lhe rodeiam. Você só precisa descobrir o que pode fazer com habilidade, alegria e satisfação a partir de suas características e possibilidades pessoais. E será reconhecido e admirado por todos também.