História de Amor Cruzado

Apenas um rio e suas garças. E o palco dos expostos um banco de praça. Melhor seria dizer, um banco de praça na beira de um rio.

- Nossa como você está pálida!

- Deve ter sido à noite. Longa e fria me descorou.

- Não compreendo bem dessas delicadezas, mas a senhorita me afigura uma bailarina?

- Sofia. Aqui exposta por um pormenor de distração. E a sua graça senhor?

- Hemengardo. Mas deixe de mim e conte de si. Algum dissabor? Por que aqui ao relento? Sozinha numa madrugada fria? Ai, vhrumm.

- Depois do abandono, ainda um meu sapatinho perdi. Disse Sofia e suspirou.

- É um prazer escutá-la, senhorita Sofia. Mas por obséquio, está tudo indo muito rápido e flutuo.

- Eu dançava, dançava só para ela e aquela ingrata! A menina me esqueceu e o pirilampo que me dava um pouco de alento, de repente fugiu. Vhrumm.

E Sofia contou sobre a fatídica noite e como desde então vive em um banco de praça na beira do rio, hoje o seu lar. Ela enfrentando a aragem, cruzava as noites. Vhrmm! Foi dizendo numa narrativa entre suspiros e tremor.

E de meu ver até que podia ser assim as noites. Sofia ao relento, mas sob um céu crivado de estrelas. No ar um perfume suave e uma bailarina que já não mais dançava para uma menina. Ela narrando, narrando sua história à Hemengardo e eu ia dizendo por acreditar que era para mim.

Justo ali, neste mesmo banco, onde tenho passado os meus dias, a menina a esqueceu. E eu só me afastei por uns instantes! Causa de destino ter nascido com dever de lanterninha. Alumiar corações inexperientes ao primeiro sinal de “Se apaixonou”.

Eu bem compreendo a mágoa de Sofia, é difícil aceitar um repentino abandono. Mas também sei sobre corações de meninas. São terríveis criaturas, cada uma no seu ser belo de ser.

E penso que esses esquecimentos, não se tratam de desamor. Todavia há as estradas a percorrer. Cada um com seu destino. Mas por hora me retiro, é melhor que continuem escutando Sofia e Hemengardo. Já tão amigos! Vhrumm

- Digo que tens razão, senhorita. As meninas prezam pela distração. E confesso que já tentei andar no encalço de uma.

- Eu bem que tive um desconfiar por minha dona. Vinha com um tal estranhamento.

- E no meu caso se não desistia estava por agora a agonizar por aí.

- Ah! Eu gostava tanto de dançar pra ela. Era quando o meu corpo alcançava o indizível. E mais suspira Sofia.

- É de ver uma menina e sua bailarina! Pirilampo perde o juízo e o rumo.

- Mas notei que parece cansado senhor? Diz Sofia.

- As noites seriam dos larápios se não houvesse quem por dentro delas alumiar os escuros. E Hemengardo já está também por uns estranhamentos.

- Eu tenho tanto medo. No escuro o frio, vhrumm As sombras...

Foram as últimas palavras de Sofia e por esta noite se calou. Mas antes de começar o seu silêncio a vi, ir do banco a beira do rio, com olhos de procurando. Os pezinhos molhou.

Ah! Isso me doeu. A bela em seu orgulho ferido, depois de ter sido sempre a preferida. E em verdade penso que só eu sabia. Sofia vivendo em caixinha de música, bailarina! Apenas brinquedo de menina-menina.

Um dia em um canto qualquer, uma gaveta e lá ficaria. Até que num outro e distanciado dia, um olhar de reencontrando. Talvez? Quanto tempo para esperar destino de Sofia? Por hora página em branco, sem grafia.

Ah, que me apena lembrar aquele dia. Foi justo quando mais lindo ela dançou e o menino surgiu. E Sofia por um definitivo pormenor de abandono. Suspirou dobrado. O corpo esguio e gracioso se recolheu.

Na caixinha a música parou e aquele rodopio suave, a bailarina dançando... Digo de querer e por encantamento, que dançava só para mim. Mas agora tem ali, a seus pés Hemengado. E eu, ai de mim!

Dizem da menina que pela primeira vez se apaixonou. Do menino, ela bem deve ter sido a primeira namorada. Mas acho tudo isso muito injusto. Sofia, a bailarina dançava só para ela. E a menina, ingrata, esquecê-la assim. E justo neste meu banco desbotado de beira de rio!

Todavia a injustiça ainda consegue ser maior. Eu vaga-lume, pirilampo se quiserem. Irmão de Hemengardo, que ali está, neste momento, procurando o sapatinho de Sofia. Já tão afeiçoado a ela. E eu, só existo em vaga lembrança para Sofia, como “O fujão”!

Mas como explicar a Sofia que enquanto tão bela dançava, os suspiros que lhe fugiam do peito, em dobrado, porque levava junto um meu. Eu, O fujão! Como dizer que tive que sair às pressas por causa de chamado urgente: tinha que bem alumiar dois corações de meninos. Em instante de nascimento de um primeiro amor.

E porque amar de meninos tem grande necessidade de ser alumiado por lanterninha-vaga-lume, eu perdi e Hemengardo meu irmão vai tão gracioso, cativando o meu primeiro amor.

E Sofia que de tanto pensar-menina nem percebeu! Não está mais sozinha no Mundo. São dois corações acelerados e cada um em si descompassa. São de ter quatro olhos para zelar por uma bailarina - Sofia.