O Travesseiro*
Desde que era um bebezinho aquela menina dormia com o mesmo travesseiro. Por várias vezes sua mãe tentou trocá-lo por um novo e mais adequado ao seu tamanho, pois ela crescera, mas ela sempre se recusava substituí-lo.
Gostava de dormir com aquele travesseiro que, para ela era o mais fofinho e cheiroso que havia. Onde quer que a menina fosse ela o carregava consigo para o caso de, sentindo soninho, poder recostar a cabeça sobre ele.
Um dia, sua família fez uma longa visita aos avós, passando na fazenda quase todo o período de férias. Claro que não esqueceram o travesseiro preferido da filha mais velha, para que ela se sentisse segura e confortável durante aqueles dias.
Foram as melhores férias que a menina já teve. A fazenda tinha inúmeros atrativos para uma criança de sua idade. Ela acordava bem cedinho, largava o travesseiro na cama e corria para o curral a esperar o leite quentinho que era tirado da vaca assim que amanhecia.
Depois de tomar o seu leite e o seu café e de comer os bolinhos que a avó fritava, ela ia brincar no quintal junto com a irmã mais nova e as primas. Elas inventavam brincadeiras divertidas e ficavam bastante tempo envolvidas num mundo de faz de conta provocado pelas sensações advindas da atmosfera do campo.
Entretanto, as férias chegaram ao fim e a família teve de voltar pra casa. Na hora de arrumar as malas, o travesseiro da menina acabou ficando para trás. Ninguém se lembrara de buscá-lo para guardar junto com as outras coisas no carro.
Somente à noite, na hora de dormir, foi que a menina se lembrou do travesseiro e queria porque queria encontrá-lo naquele momento. O pai lhe explicou com muita paciência que o travesseiro estava muito longe e ela teria de se conformar. Ela choramingou um pouco e demorou a pegar no sono. O pai lhe prometeu que assim que retornassem à fazenda, eles trariam o travesseiro de volta.
Passaram-se algumas semanas até que eles pudessem retornar lá. Todas as noites a menina dormia a sonhar com o antigo travesseiro. Ainda que lhe dissessem que o novo era muito melhor, ela ainda sentia falta daquele ao qual ela primeiro havia se habituado.
Quando chegou o dia de retornarem à fazenda, ela ficou contente em rever os avós, mas também porque finalmente teria o seu travesseiro preferido de volta. A primeira coisa que ela perguntou ao chegar foi a respeito do travesseiro. No entanto, estranhamente, ninguém sabia dizer onde ele estava.
Passado algum tempo, muito sem jeito, o avô confessou que havia entregue o travesseiro aos porcos. Uma porca dera cria e, sem saber da predileção da menina pelo travesseiro, ele o colocou junto aos porquinhos que sentiam frio. Era verdade que o travesseiro estava bem velhinho, mas entregá-lo aos porcos, foi uma surpresa bastante desagradável para aquela menina.
Ela ainda quis ver como ele havia ficado após tantas semanas sendo usado por porcos. Acreditava que, lavando-o direitinho ainda seria possível utilizá-lo. Logo que conseguiu distingui-lo no meio do chiqueiro, porém, ela percebeu que não tinha mais jeito. Nunca mais poderia utilizar aquele travesseiro de novo.
Ela se fingiu conformada para não desagradar os avós que a amavam reciprocamente, mas, no seu interior, ela nunca se esqueceu daquele episódio. E, mesmo adormecendo com travesseiros confortáveis, ela ainda sonhava com aquele que foi parar no chiqueiro.
* Kelly Vyanna. Membro da ACEIB/DF.
Disponível em: www.aceib-gremioliterario-df.blogspot.com
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