A Fada Azul
Madrugada do dia 10 de julho de 2003. Roberto desesperado voa com seu carro pelas ruas desertas da cidade de São Paulo. A bolsa de Mônica, no oitavo mês de gestação, havia estourado. Ele corria contra o tempo. A esposa no banco de trás gemia, vitima de muitas dores. Era uma gravidez de risco, desde o inicio ela esteve sujeita a sofrer um aborto a qualquer momento. Os médicos recomendaram repouso absoluto, e revelaram a Roberto que temiam pela vida de ambos, mãe e filho.
Roberto ligou para o hospital, assim que saiu de casa, avisando que já estava a caminho. No hospital, localizado no Paraíso, bairro próximo do centro de São Paulo, tudo estava pronto à espera de Mônica. Assim que ela chegou colocaram-na em uma maca e a levaram imediatamente para a sala de parto.
Roberto ficou na sala de espera, caminhando de um lado para outro, nervoso, temendo pela vida de ambos, ou mesmo que fosse pela vida de um deles. O tique taque do relógio retumbando com as batidas do seu coração, lhe parecia uma bomba relógio em contagem regressiva para explodir dentro da sua cabeça, latejando, doendo.
Finalmente o medico veio ao seu encontro e o levou até o vidro do berçário para ver o seu filho no colo da enfermeira que lhe sorria de uma maneira piedosa. Roberto jubiloso olhou extasiado pela primeira vez para o seu filho. Em seguida perguntou pela esposa, cheio de esperança de boas noticias, já que com o filho estava tudo bem. O medico olhou-o nos olhos e apenas disse.
_Seja forte. Não foi possível - abraçou Roberto que chorou como uma criança, soluçando, com a cabeça recostada em seu peito.
Cinco anos se passaram. Dave ficou forte, bonito. Porem era um menino triste, calado, solitario, se mantinha longe dos amiguinhos, sempre sonhando com sua mãe, sentindo a sua falta. Ele não sabia que ela morrera para ele viver, que optou por isso durante o parto para que ele nascesse bem, mesmo sabendo que agindo, como o fez, arriscaria a própria vida. Roberto dizia a ele que sua mãe estava no céu, em uma terra encantada cheia de fadas que a faziam sorrir, e que de lá ela o via, feliz por ter um filho tão bonito como ele.
Dave fazia o prezinho na escola Catatau. A perua escolar o pegava de manhã, em frente a sua casa e o trazia à tarde. Lá, ele tinha apenas uma amiguinha, Laurinha. Os dois ficavam juntos a maior parte do dia conversando especialmente sobre mãe, assunto escolhido sempre pelo Dave. Ele perguntava curioso o que a mãe de Laurinha fazia pra ela e invejoso ficava imaginando sua mãe lhe fazendo o mesmo.
_O meu pai falou que a minha mãe mora com as fadas, em uma terra encantada com muitas árvores, flores e animaizinhos, desabafou Dave, sem assunto para corresponder sobre o relacionamento de Laurinha e sua mãe.
_Eu conheço uma fada, a Fada Azul, revelou Laurinha.
_Fada Azul? perguntou intrigado.
_É! Eu sei onde ela mora.
_Ela mora no céu, junto com minha mãe, afirmou Dave, demonstrando saber disso melhor que ela.
_Não, ela mora perto da minha casa. Eu sei onde é. Ela deve conhecer sua mãe, porque ela é fada, também.
_É mesmo? Você pergunta para ela, e depois fala para mim?
_Pergunto. Se você quiser, eu levo você lá. E você mesmo pergunta.
_Leva? Quando?
_Hoje mesmo.
_Eba! Então, está bom. Dave pensou um pouco e remendou – Hoje, não. Amanhã.
_Está bom! O dia que você quiser.
Dave mudou a visita para o dia seguinte, pois se lembrou de levar o quadro com o retrato de sua mãe, com o qual sempre dormia abraçado ao peito; e que, assim que adormecia, seu pai o recolocava ao lado de sua cabeça, no criado-mudo. No dia seguinte, apanhou o quadro e o enfiou dentro de sua mochila. Dentro da perua escolar, mostrou-o, cheio de orgulho, para a Laurinha, que a achou muito bonita. À tarde, quando a perua escolar os levava de volta para casa, Dave deu um jeito e desceu junto com Laurinha, sem que o motorista e a zeladora de crianças percebessem. Laurinha pegou na mão de Dave e o levou para a casa da Fada Azul. Andaram duas quadras e viraram a direita.
_É ali! indicou Laurinha, apontando com o dedo para uma casa cheia de plantas e flores. Pássaros canoros, beija-flores e borboletas, enfeitavam o jardim, dando-lhe um ar de terra encantada.
Laurinha apertou a campainha da referida casa, e uma senhora de cabelos grisalhos veio atendê-los. Seus cabelos cinza claríssimos, levemente agitados pelo vento, iluminados pelo sol, refletiam um tom azulado, emitindo uma áurea celeste: razão de a Laurinha a chamar de Fada Azul. Ela tinha um semblante bondoso, mas denotava muita tristeza no olhar. Vendo aquelas duas crianças sozinhas no seu portão, abriu-o, e questionou-as, curiosa, e ao mesmo tempo preocupada.
_O que faz aqui duas crianças tão bonitinhas?
_Fala, Dave, sussurrou Laurinha, cutucando Dave, que estava paralisado com a boca entreaberta, admirado com a Fada Azul e aquela casa encantada.
_A senhora conhece a minha mãe? gaguejou Dave.
_E quem é a sua mãe, para que eu possa saber?
Dave rapidamente tirou a mochila das costas, colocou-a no chão, abriu o zíper, retirou o quadro com a fotografia da sua mãe, e o mostrou confiante para a Fada Azul.
_Esta! gritou Dave, segurando o quadro com ambas as mãos, elevando-o o mais próximo possível dos olhos da espantada senhora.
_Não é possível, gaguejou a velha senhora, enquanto se amparava no portão, sofrendo uma vertigem.
Dave e Laurinha assustados, olhavam a Fada Azul arquear e prostrar-se de joelhos no chão. Os dois ficaram ali paralisados, enquanto a Fada Azul aos poucos se recobrava e com muito esforço conseguiu se reerguer.
_Quem os mandou aqui? indagou, cansada.
_A Laurinha me trouxe aqui para você encontrar a minha mãe, respondeu Dave, apontando primeira para a Laurinha e depois olhando para a fotografia da sua mãe.
A ofegante senhora convidou-os a entrar e lentamente dirigiu-os até a sala da casa. Pediu que esperassem ali e amparando-se nos móveis retirou-se do recinto. Dave e Laurinha apreensivos aconchegaram-se um ao outro com os olhos arregalados e não os desviavam do corredor por onde a Fada Azul havia saído. Minutos depois, surgiu abruptamente uma jovem mulher de olhar assustado que estancou estupefata no umbral da sala.
_Mamãe! Dave deu um grito de satisfação. Mas, reparou que sua mãe o olhava como se não o reconhecesse. Então, apresentou-se, duvidando do seu pai que lhe falava que sua mãe o via de lá onde estava e o achava bonito.
_Eu sou o Dave, mamãe.
_Dave, meu filho? perguntou sem saber a quem, intrigada com aquela situação.
_É, mamãe, o seu filho.
_Como você cresceu. Você é tão bonito.
Abraçaram-se felizes. Ele, por ter finalmente encontrado sua mãe, graças à Fada Azul. Ela, acreditando em um milagre, reencontrando seu filho, agora crescido, que morrera logo após o seu nascimento em 10 de julho de 2003. Seu marido e o filho recém nascido Dave desceram de elevador, enquanto ela e seus pais ficaram para trás, desceriam a seguir. Porém, o elevador social parou de funcionar, tiverem de descer no elevador de serviço. Chegando ao térreo souberam da tragédia que acabara de acontecer: o elevador social sem freio despencou do 3º andar, matando todos os ocupantes, entre eles, seu marido e o filho.
Da. Gloria, a suposta Fada Azul, retorna a sala, ainda cambaleando, senta-se em uma cadeira, ofegante, e pergunta a Dave quem são seus pais e seus avós.
_Meu pai se chama Roberto e minha mãe, olha para aquela que acredita ser sua mãe, sorrindo com desdém, Mônica.
Mônica, a mãe que Dave insistia em ser sua, teve um sobressalto, aquele menino tinha o mesmo nome do seu falecido filho, e ela o mesmo nome de sua mãe: era muita coincidência. Só os nomes dos pais não coincidiam.
_Meu avô, continua Dave, se chama Vicente e a minha avó Amália.
Da. Glória teve uma nova vertigem e Mônica sua neta, amparou-a. Recuperando-se um pouco, perguntou ao Dave se ele sabia ligar para sua casa. O menino respondeu afirmativamente e pegou o telefone que lhe ofereceu Mônica a pedido da avó. Ligou para casa e seu pai, aflito com o seu desaparecimento, atendeu. Reconhecendo a voz do filho passou a fazer milhões de perguntas. Dave não respondia a nenhuma e repetia ao pai o que a Fada Azul lhe orientava.
_Pai, está tudo bem comigo, afastava o fone da boca e prestava atenção no próximo recado.
_Estou na casa de amigos.
_O endereço é Rua Alvorada numero 236.
_O senhor deve vir junto com o vovô e a vovó.
_Estou esperando vocês. Um beijo, e desligou, conforme recomendação da Fada Azul.
Roberto, Vicente e Amália, sem muita demora, chegaram ao endereço informado. Quem os recebeu, foi o pai de Laurinha, que também fora chamado, juntamente com a mãe, devido à presença da filha, que Da. Glória presumiu, também devia estar sendo procurada. Encaminhou-os à sala onde todos estavam à espera deles.
Quando Roberto, Vicente e Amália viram Mônica quase tiveram uma síncope. Gritaram em uníssono o nome dela, pálidos e assombrados. Mônica espantou-se, também. Não entendendo o que ela representava para aquelas pessoas que aparentemente a conheciam intimamente, se ela nunca os vira até aquele dia.
Da. Gloria respirava com dificuldade. Estava a ponto de desfalecer novamente. Apresentava um quadro de infarto. Com dificuldade pediu que a levassem para o quarto e que Mônica, Roberto, Vicente e Amália, somente eles, fossem juntos. Mônica, preocupada com a saúde da avó, falou que antes ligaria para o resgate, o que era mais urgente. Da. Gloria a impediu, dizendo que o que ela tinha para contar era muito mais urgente que tudo. Ela não podia morrer sem antes revelar um crime tão terrível que a atormenta desde o dia em que o cometeu.
Fechados no quarto, Da. Gloria se pôs a relatar uma historia insólita que envolvia todos naquele cômodo.
_Há trinta anos, eu era enfermeira da ala de neonatal. Rosana, minha filha, acabara de ser internada para dar à luz uma menina. O parto foi muito complicado e quase que ambas morreram. Rosana foi para o quarto ainda com risco de morte e os médicos sentenciaram que ela nunca mais poderia ter filho. Mônica, assim se chamaria a menina recém nascida, foi para a U.T.I. e no dia seguinte faleceu.
Vicente e Amália se entreolharam desconfiados, tentavam adivinhar o que aquela mulher à beira da morte, estava para revelar. À frente deles, uma moça idêntica à filha que morrera no parto de Dave, até o mesmo nome tinha: era muita coincidência.
Da. Gloria continuou o relato.
_Eu estava sozinha na U.T.I.. Olhava para aquela criança morta, ansiada por tanto tempo pela minha filha, que nunca mais poderia ter outra. Ali próximo, havia duas gêmeas que teriam alta nos próximos dias. A minha neta e as gêmeas eram bem parecidas. Ninguém saberia quem era quem, se as três estivessem sem pulseiras em um mesmo local. Aquela mãe tinha duas filhas lindas, perfeitas, e a minha filha ficaria sem nenhuma e nunca mais poderia ter outra. Então...
_Não, não acredito que você fez isso, gemeu Amália adivinhando o que ela ia revelar.
_... troquei a minha neta morta, por uma daquelas gêmeas, Mônica, quem agora lhe devolvo. Perdoem-me se puderem, porque eu nunca me perdoei. Depois desta terrível revelação, Da. Gloria expirou. Foi espiar o crime que cometeu.
_Maldita! Você não podia ter feito isso. – praguejou Vicente, dando um chute no guarda-roupa, para não esganar aquela mulher que tanta dor lhes causou.
Amália e Mônica, mãe e filha, se reencontraram depois de tantos anos, sem saber uma da outra. Abraçaram-se ternamente preocupadas apenas em resgatar o tempo que perderam em razão de uma pessoa inconseqüente e egoísta.
Dave, preocupado com a demora da sua mãe, entra no quarto a sua procura e vê a Fada Azul que parece estar dormindo.
_A Fada Azul está dormindo? pergunta, agarrando-se fortemente a Mônica.
_Fada Azul? pergunta Mônica, olhando admirado para Dave.
_É, a Fada Azul, foi ela que encontrou você para mim.
_E como foi que você a encontrou?
_Meu pai sempre me falou que você estava na terra das fadas. Eu contei para a Laurinha e ela me falou que perto da casa dela morava a Fada Azul. Então, ela me trouxe aqui. Eu peguei o seu retrato e mostrei para a Fada Azul, aí ela me trouxe você.
_A Fada Azul foi para uma terra encantada onde todos são felizes, esclareceu Mônica.
_Ela vai levar você de novo? argüiu Dave assustado.
_Não, desta vez eu vou ficar aqui.
_Você não vai mais me deixar sozinho?
_Não, Dave. Nós vamos ficar juntos para sempre.
Madrugada do dia 10 de julho de 2003. Roberto desesperado voa com seu carro pelas ruas desertas da cidade de São Paulo. A bolsa de Mônica, no oitavo mês de gestação, havia estourado. Ele corria contra o tempo. A esposa no banco de trás gemia, vitima de muitas dores. Era uma gravidez de risco, desde o inicio ela esteve sujeita a sofrer um aborto a qualquer momento. Os médicos recomendaram repouso absoluto, e revelaram a Roberto que temiam pela vida de ambos, mãe e filho.
Roberto ligou para o hospital, assim que saiu de casa, avisando que já estava a caminho. No hospital, localizado no Paraíso, bairro próximo do centro de São Paulo, tudo estava pronto à espera de Mônica. Assim que ela chegou colocaram-na em uma maca e a levaram imediatamente para a sala de parto.
Roberto ficou na sala de espera, caminhando de um lado para outro, nervoso, temendo pela vida de ambos, ou mesmo que fosse pela vida de um deles. O tique taque do relógio retumbando com as batidas do seu coração, lhe parecia uma bomba relógio em contagem regressiva para explodir dentro da sua cabeça, latejando, doendo.
Finalmente o medico veio ao seu encontro e o levou até o vidro do berçário para ver o seu filho no colo da enfermeira que lhe sorria de uma maneira piedosa. Roberto jubiloso olhou extasiado pela primeira vez para o seu filho. Em seguida perguntou pela esposa, cheio de esperança de boas noticias, já que com o filho estava tudo bem. O medico olhou-o nos olhos e apenas disse.
_Seja forte. Não foi possível - abraçou Roberto que chorou como uma criança, soluçando, com a cabeça recostada em seu peito.
Cinco anos se passaram. Dave ficou forte, bonito. Porem era um menino triste, calado, solitario, se mantinha longe dos amiguinhos, sempre sonhando com sua mãe, sentindo a sua falta. Ele não sabia que ela morrera para ele viver, que optou por isso durante o parto para que ele nascesse bem, mesmo sabendo que agindo, como o fez, arriscaria a própria vida. Roberto dizia a ele que sua mãe estava no céu, em uma terra encantada cheia de fadas que a faziam sorrir, e que de lá ela o via, feliz por ter um filho tão bonito como ele.
Dave fazia o prezinho na escola Catatau. A perua escolar o pegava de manhã, em frente a sua casa e o trazia à tarde. Lá, ele tinha apenas uma amiguinha, Laurinha. Os dois ficavam juntos a maior parte do dia conversando especialmente sobre mãe, assunto escolhido sempre pelo Dave. Ele perguntava curioso o que a mãe de Laurinha fazia pra ela e invejoso ficava imaginando sua mãe lhe fazendo o mesmo.
_O meu pai falou que a minha mãe mora com as fadas, em uma terra encantada com muitas árvores, flores e animaizinhos, desabafou Dave, sem assunto para corresponder sobre o relacionamento de Laurinha e sua mãe.
_Eu conheço uma fada, a Fada Azul, revelou Laurinha.
_Fada Azul? perguntou intrigado.
_É! Eu sei onde ela mora.
_Ela mora no céu, junto com minha mãe, afirmou Dave, demonstrando saber disso melhor que ela.
_Não, ela mora perto da minha casa. Eu sei onde é. Ela deve conhecer sua mãe, porque ela é fada, também.
_É mesmo? Você pergunta para ela, e depois fala para mim?
_Pergunto. Se você quiser, eu levo você lá. E você mesmo pergunta.
_Leva? Quando?
_Hoje mesmo.
_Eba! Então, está bom. Dave pensou um pouco e remendou – Hoje, não. Amanhã.
_Está bom! O dia que você quiser.
Dave mudou a visita para o dia seguinte, pois se lembrou de levar o quadro com o retrato de sua mãe, com o qual sempre dormia abraçado ao peito; e que, assim que adormecia, seu pai o recolocava ao lado de sua cabeça, no criado-mudo. No dia seguinte, apanhou o quadro e o enfiou dentro de sua mochila. Dentro da perua escolar, mostrou-o, cheio de orgulho, para a Laurinha, que a achou muito bonita. À tarde, quando a perua escolar os levava de volta para casa, Dave deu um jeito e desceu junto com Laurinha, sem que o motorista e a zeladora de crianças percebessem. Laurinha pegou na mão de Dave e o levou para a casa da Fada Azul. Andaram duas quadras e viraram a direita.
_É ali! indicou Laurinha, apontando com o dedo para uma casa cheia de plantas e flores. Pássaros canoros, beija-flores e borboletas, enfeitavam o jardim, dando-lhe um ar de terra encantada.
Laurinha apertou a campainha da referida casa, e uma senhora de cabelos grisalhos veio atendê-los. Seus cabelos cinza claríssimos, levemente agitados pelo vento, iluminados pelo sol, refletiam um tom azulado, emitindo uma áurea celeste: razão de a Laurinha a chamar de Fada Azul. Ela tinha um semblante bondoso, mas denotava muita tristeza no olhar. Vendo aquelas duas crianças sozinhas no seu portão, abriu-o, e questionou-as, curiosa, e ao mesmo tempo preocupada.
_O que faz aqui duas crianças tão bonitinhas?
_Fala, Dave, sussurrou Laurinha, cutucando Dave, que estava paralisado com a boca entreaberta, admirado com a Fada Azul e aquela casa encantada.
_A senhora conhece a minha mãe? gaguejou Dave.
_E quem é a sua mãe, para que eu possa saber?
Dave rapidamente tirou a mochila das costas, colocou-a no chão, abriu o zíper, retirou o quadro com a fotografia da sua mãe, e o mostrou confiante para a Fada Azul.
_Esta! gritou Dave, segurando o quadro com ambas as mãos, elevando-o o mais próximo possível dos olhos da espantada senhora.
_Não é possível, gaguejou a velha senhora, enquanto se amparava no portão, sofrendo uma vertigem.
Dave e Laurinha assustados, olhavam a Fada Azul arquear e prostrar-se de joelhos no chão. Os dois ficaram ali paralisados, enquanto a Fada Azul aos poucos se recobrava e com muito esforço conseguiu se reerguer.
_Quem os mandou aqui? indagou, cansada.
_A Laurinha me trouxe aqui para você encontrar a minha mãe, respondeu Dave, apontando primeira para a Laurinha e depois olhando para a fotografia da sua mãe.
A ofegante senhora convidou-os a entrar e lentamente dirigiu-os até a sala da casa. Pediu que esperassem ali e amparando-se nos móveis retirou-se do recinto. Dave e Laurinha apreensivos aconchegaram-se um ao outro com os olhos arregalados e não os desviavam do corredor por onde a Fada Azul havia saído. Minutos depois, surgiu abruptamente uma jovem mulher de olhar assustado que estancou estupefata no umbral da sala.
_Mamãe! Dave deu um grito de satisfação. Mas, reparou que sua mãe o olhava como se não o reconhecesse. Então, apresentou-se, duvidando do seu pai que lhe falava que sua mãe o via de lá onde estava e o achava bonito.
_Eu sou o Dave, mamãe.
_Dave, meu filho? perguntou sem saber a quem, intrigada com aquela situação.
_É, mamãe, o seu filho.
_Como você cresceu. Você é tão bonito.
Abraçaram-se felizes. Ele, por ter finalmente encontrado sua mãe, graças à Fada Azul. Ela, acreditando em um milagre, reencontrando seu filho, agora crescido, que morrera logo após o seu nascimento em 10 de julho de 2003. Seu marido e o filho recém nascido Dave desceram de elevador, enquanto ela e seus pais ficaram para trás, desceriam a seguir. Porém, o elevador social parou de funcionar, tiverem de descer no elevador de serviço. Chegando ao térreo souberam da tragédia que acabara de acontecer: o elevador social sem freio despencou do 3º andar, matando todos os ocupantes, entre eles, seu marido e o filho.
Da. Gloria, a suposta Fada Azul, retorna a sala, ainda cambaleando, senta-se em uma cadeira, ofegante, e pergunta a Dave quem são seus pais e seus avós.
_Meu pai se chama Roberto e minha mãe, olha para aquela que acredita ser sua mãe, sorrindo com desdém, Mônica.
Mônica, a mãe que Dave insistia em ser sua, teve um sobressalto, aquele menino tinha o mesmo nome do seu falecido filho, e ela o mesmo nome de sua mãe: era muita coincidência. Só os nomes dos pais não coincidiam.
_Meu avô, continua Dave, se chama Vicente e a minha avó Amália.
Da. Glória teve uma nova vertigem e Mônica sua neta, amparou-a. Recuperando-se um pouco, perguntou ao Dave se ele sabia ligar para sua casa. O menino respondeu afirmativamente e pegou o telefone que lhe ofereceu Mônica a pedido da avó. Ligou para casa e seu pai, aflito com o seu desaparecimento, atendeu. Reconhecendo a voz do filho passou a fazer milhões de perguntas. Dave não respondia a nenhuma e repetia ao pai o que a Fada Azul lhe orientava.
_Pai, está tudo bem comigo, afastava o fone da boca e prestava atenção no próximo recado.
_Estou na casa de amigos.
_O endereço é Rua Alvorada numero 236.
_O senhor deve vir junto com o vovô e a vovó.
_Estou esperando vocês. Um beijo, e desligou, conforme recomendação da Fada Azul.
Roberto, Vicente e Amália, sem muita demora, chegaram ao endereço informado. Quem os recebeu, foi o pai de Laurinha, que também fora chamado, juntamente com a mãe, devido à presença da filha, que Da. Glória presumiu, também devia estar sendo procurada. Encaminhou-os à sala onde todos estavam à espera deles.
Quando Roberto, Vicente e Amália viram Mônica quase tiveram uma síncope. Gritaram em uníssono o nome dela, pálidos e assombrados. Mônica espantou-se, também. Não entendendo o que ela representava para aquelas pessoas que aparentemente a conheciam intimamente, se ela nunca os vira até aquele dia.
Da. Gloria respirava com dificuldade. Estava a ponto de desfalecer novamente. Apresentava um quadro de infarto. Com dificuldade pediu que a levassem para o quarto e que Mônica, Roberto, Vicente e Amália, somente eles, fossem juntos. Mônica, preocupada com a saúde da avó, falou que antes ligaria para o resgate, o que era mais urgente. Da. Gloria a impediu, dizendo que o que ela tinha para contar era muito mais urgente que tudo. Ela não podia morrer sem antes revelar um crime tão terrível que a atormenta desde o dia em que o cometeu.
Fechados no quarto, Da. Gloria se pôs a relatar uma historia insólita que envolvia todos naquele cômodo.
_Há trinta anos, eu era enfermeira da ala de neonatal. Rosana, minha filha, acabara de ser internada para dar à luz uma menina. O parto foi muito complicado e quase que ambas morreram. Rosana foi para o quarto ainda com risco de morte e os médicos sentenciaram que ela nunca mais poderia ter filho. Mônica, assim se chamaria a menina recém nascida, foi para a U.T.I. e no dia seguinte faleceu.
Vicente e Amália se entreolharam desconfiados, tentavam adivinhar o que aquela mulher à beira da morte, estava para revelar. À frente deles, uma moça idêntica à filha que morrera no parto de Dave, até o mesmo nome tinha: era muita coincidência.
Da. Gloria continuou o relato.
_Eu estava sozinha na U.T.I.. Olhava para aquela criança morta, ansiada por tanto tempo pela minha filha, que nunca mais poderia ter outra. Ali próximo, havia duas gêmeas que teriam alta nos próximos dias. A minha neta e as gêmeas eram bem parecidas. Ninguém saberia quem era quem, se as três estivessem sem pulseiras em um mesmo local. Aquela mãe tinha duas filhas lindas, perfeitas, e a minha filha ficaria sem nenhuma e nunca mais poderia ter outra. Então...
_Não, não acredito que você fez isso, gemeu Amália adivinhando o que ela ia revelar.
_... troquei a minha neta morta, por uma daquelas gêmeas, Mônica, quem agora lhe devolvo. Perdoem-me se puderem, porque eu nunca me perdoei. Depois desta terrível revelação, Da. Gloria expirou. Foi espiar o crime que cometeu.
_Maldita! Você não podia ter feito isso. – praguejou Vicente, dando um chute no guarda-roupa, para não esganar aquela mulher que tanta dor lhes causou.
Amália e Mônica, mãe e filha, se reencontraram depois de tantos anos, sem saber uma da outra. Abraçaram-se ternamente preocupadas apenas em resgatar o tempo que perderam em razão de uma pessoa inconseqüente e egoísta.
Dave, preocupado com a demora da sua mãe, entra no quarto a sua procura e vê a Fada Azul que parece estar dormindo.
_A Fada Azul está dormindo? pergunta, agarrando-se fortemente a Mônica.
_Fada Azul? pergunta Mônica, olhando admirado para Dave.
_É, a Fada Azul, foi ela que encontrou você para mim.
_E como foi que você a encontrou?
_Meu pai sempre me falou que você estava na terra das fadas. Eu contei para a Laurinha e ela me falou que perto da casa dela morava a Fada Azul. Então, ela me trouxe aqui. Eu peguei o seu retrato e mostrei para a Fada Azul, aí ela me trouxe você.
_A Fada Azul foi para uma terra encantada onde todos são felizes, esclareceu Mônica.
_Ela vai levar você de novo? argüiu Dave assustado.
_Não, desta vez eu vou ficar aqui.
_Você não vai mais me deixar sozinho?
_Não, Dave. Nós vamos ficar juntos para sempre.