A apresentação
Para sua apresentação sobre os efeitos do mesmerismo na comunicação entre os espíritos, o doutor Ethan Doyle convidou os principais expoentes da comunidade científica britânica e europeia, tendo franqueado a entrada para estudantes e professores em geral. Dentre estes, Nathan Chambers, com o qual Doyle havia tido uma série de desentendimentos anos antes, aparentemente não relacionados com a vida acadêmica de ambos. Chambers, contudo, não pôde sentar-se nas primeiras fileiras, como havia anunciado, já que estavam reservadas aos convidados, eu entre eles.
Uma ausência muito sentida e comentada foi a do professor von Baumgarten, da Universidade de Keinplatz. O velho mestre, cujo experimento seria emulado pelo doutor Doyle, alegou problemas de saúde para não comparecer. À boca pequena, comentava-se que von Baumgarten preferia que o público e a comunidade científica esquecessem que um dia ele estivera por trás da iniciativa, algo que de modo algum parecia intimidar Ethan Doyle.
- Pretendo fazer história, meu caro Byrne. E você será testemunha do meu sucesso - assegurou.
Na noite marcada para o experimento, grande público compareceu ao auditório da Universidade de Santa Ágata. No palco, havia sido colocada uma cadeira de espaldar reto, em frente à uma grande caixa coberta por um pano. Parecia não o cenário de uma apresentação científica, mas de um número de mágica. Os comentários sobre isso começaram a ganhar volume tão logo o doutor Doyle, de casaca escura e cartola, adentrou o cenário misterioso.
- Agora ele vai tirar um coelho da cartola - comentou alguém às minhas costas, tendo eu reconhecido o tom zombeteiro de Nathan Chambers.
O doutor Doyle, contudo, parecia muito seguro de si. Encarou o público confiantemente e elevando a voz, para ser ouvido até no fundo do salão, declarou:
- O que estão prestes a presenciar, não é uma simples repetição da experiência de Keinplatz, feita pelo professor von Baumgarten, mas sua utilização num novo patamar de investigação científica. Para tanto, irei utilizar o mesmerismo para colocar em estado cataléptico a criatura que se encontra dentro desta caixa, e em seguida, a mim mesmo. Em seguida, por meio de uma intervenção cujos princípios estarei patenteando, a minha consciência e a da criatura trocarão de lugar pelo intervalo de 60 minutos. Para minha segurança e de todos os presentes, no decorrer desta hora, apenas a criatura, cujo corpo controlarei, poderá se mover livremente. O meu próprio corpo permanecerá em estado cataléptico até o fim do experimento.
- Criatura. Do que ele está falando? - Alguém indagou à minha esquerda.
- O que há naquela caixa? - Questionou outro.
Nossas dúvidas não permaneceram sem resposta durante muito tempo. Com um gesto elegante, Doyle puxou o pano que cobria a caixa, revelando que esta, na verdade, tratava-se de uma jaula.
[Continua]
- [21-12-2019]