Um
- Conto originalmente escrito em 2011, numa outra encarnação.
Estava muito escuro. Mesmo apreciando o escuro, Ele se sentia apreensivo. Não queria se levantar, não sabia onde estava, podia estar em alguma sala pequena. Tateou o chão de terra e seguiu engatinhando. Não se arriscaria a tentar levantar ou sequer colocar a mão para cima. Até onde sabia, podia ter um ventilador ou um moedor de carne em cima de si, mas Ele não ouvia nada. Queria gritar, mas tinha medo. Não podia sequer ouvir sua respiração. Continuou sua engatinhada por algum tempo, até deparar-se com um feixe de luz vermelha.
- Olá. – Chamou, mas a cor não respondeu. Sequer pareceu notá-lo, continuou seguindo seu caminho pela escuridão, deixando um feixe de luz por onde passava. Ele resolveu segui-la.
Seguiu caminho, guiado pelo feixe de luz. Conforme caminhavam, esperava que a luz revelasse algo em seu caminho. Onde estava e do que era feito aquele lugar. Nada. Parecia que do que quer que fosse feito aquele chão, não era percebido pela luz, nem mesmo a textura.
- Nunca vi uma terra tão bem batida. – Disse. Quando estava sozinho, sentia que sua voz era uma extensão de sua consciência.
Foi só depois das primeiras linhas de diálogo com a cor que caminhava que Ele percebeu que podia ouvir de novo. Sua respiração, seus batimentos cardíacos, tudo havia voltado, e mesmo assim, não ouvia nada. Foi quando resolveu ficar de pé.
Caminhar era uma tarefa árdua. Suas pernas não respondiam, como se estivesse há anos sem se mover. Era bom esticar as pernas novamente, mesmo a passos lentos. Seguindo a luz mais de perto, Ele pode ter um vislumbre de seus pés.
- São menores do que eu lembrava. Não acham que estão menores? – A cor não respondeu.
Ele havia adquirido certo carinho pela luz. Tinha essa mania chata de se atrair por coisas pequenas. Talvez por esse fascínio, não tivesse percebido que não estavam sozinhos. Olhou para trás só para ver que outras cores o seguiam. Azul, verde, rosa, amarelo, ciano, violeta. Haviam feixes de luz de todas as cores seguindo o vermelho.
- Você é realmente muito bem relacionado. – Por um segundo, ele jurara que a cor havia corado. Se é que isso era possível.
O vermelho parou. O garoto parou junto dele, observando o que as outras cores fariam. Foi quando viu o azul se aproximar do vermelho e se unir a ele, formando uma nova tonalidade. As outras cores faziam o mesmo. Uma a uma, se uniam ao vermelho para formarem novas tonalidades, crescendo não só em escopo como em tamanho. O que antes era um pequeno feixe, um naco de algo, tornara-se uma massa disforme de luzes, que aos poucos criava forma.
- Um cãozinho? – Não, não era um cãozinho. Poderia ser outro animal, talvez. Por um segundo, quase pareceu um macaco prego. Mas sua verdadeira forma se revelou depois que a fúcsia se juntara ao corpo.
- Um garoto.
Foi então que Ele percebeu que seu desejo havia se realizado.