O segredo de Lugduno

[Continuação de "Confronto em Lugduno"]

Meia-noite. Eu estava novamente a sós - ou assim o acreditava - no salão principal do palacete de Amulius Probus, luzes apagadas, apenas a luz da minha fax elétrica cortando a escuridão. Ia começar meu ritual, quando ouvi um arrastar de correntes acima da minha cabeça Apontei o facho para o alto da escadaria que levava ao andar superior, e iluminei um vulto pálido coberto pelo que parecia gaze branca. A aparição me estendeu um braço, dedo em riste, e proclamou com voz roufenha:

- Fora de minha casa, impostor!

Acima de minha cabeça, o arrastar de correntes recomeçou. Tudo muito convincente, devo reconhecer; só que eu não era um leigo impressionável.

- Se eu não sair, o que vai fazer? - Questionei, sacando a pistola que levava à cintura.

E, para não deixar dúvidas sobre minhas intenções, dei três disparos propositalmente acima da cabeça do vulto. Como não se tratava de um fantasma, ele correu de volta para onde quer que estivesse escondido anteriormente. Neste instante, as luzes do imóvel foram acesas e uma equipe de dez homens da Guarda Pretoriana saíram de seus esconderijos e subiram rapidamente as escadas, esclopetos de grosso calibre nas mãos. Voltaram pouco depois arrastando o "lêmur", um tipo usando uma barba branca falsa, e duas garotas escravas, muito assustadas.

- É o Vopiscus Probus - informou o comandante dos pretorianos, arrancando a barba falsa do sujeito.

- Bem que eu desconfiava - retruquei. - E as garotas?

- Escravas do Vopiscus. Ele as obrigou a arrastar correntes e atirar pedras no telhado do palacete.

- Mas que salafrário! Tomara que dobrem a pena só por conta disso - declarei, aproximando-me do prisioneiro.

- Quero meu advogado! - Resmungou ele, me lançando um olhar cheio de ódio.

- Daqui a pouco ele vai pedir um julgamento justo - ironizou o comandante dos pretorianos, para escárnio geral.

* * *

Pela manhã, já de volta ao meu quarto no deversório, telefonei ao Tertius Acilius para prestar contas do meu sucesso em desmascarar a fraude de Vopiscus Probus.

- Parabéns, mas isso também significa que você perdeu a aposta - riu-se ele.

- Aí é que está: não perdi - atalhei com firmeza. - Lembra do nosso colega, Octavianus Decumius? Ao ser preso pelos pretorianos, ele confessou que havia sido cúmplice de Vopiscus sim, mas que só soubera da minha existência quando fui ao escritório dele, no dia seguinte à minha chegada.

- Então os feijões que desapareceram após o ritual...

- Não havia mais ninguém comigo na casa aquela noite. Exceto, talvez, o espírito de Amulius Probus, que podemos portanto considerar apaziguado.

- Não vejo porque nosso colega iria mentir a este respeito - ponderou meu sócio. - Vou dispensá-lo do pagamento da promessa...

- Ah, mas eu faço questão de lhe levar um excelente vinho tinto do Ródano!

- Inclua na conta de Canutia Proba - sugeriu ele. - Vou considerar como parte do ritual de exorcismo...

[FIM]

- [31-12-2018]