Meus anjos e meus demônios
Os anjos e demônios que criei me carregavam pelo corredor das verdades não ditas, que parecia não ter fim, e eles andavam juntos e vagarosamente. Cada um deles segurava em uma ponta do fino lençol sobre o qual eu me encontrava deitada, como se eu estivesse levitando, em meio ao pouco de luz que entranhava nas rachaduras das rochas. Assim, mesmo de olhos abertos, não enxergava lucidamente para onde ia e nem mesmo quem ou como eram os seres que me levavam, e, então, decidi só ouvir e observar o teto, que, também, aparentemente, não me mostrava absolutamente nada. Passado um tempo imperceptível, comecei a me cansar de tal monotonia, fui atrás de olhar para os outros lados, na tentativa de significados maiores, mas estava difícil me mover naquele tecido molenga, e, quanto mais eu tentava, mais me embolava, aí acabei por não chegar na borda diversas vezes. De repente, caí naquele chão ríspido e espinhoso, a dor foi terrível, meus ossos frágeis bateram contra a dura superfície e não mais me levantei. Os quatro sentaram-se ao meu redor com a expressão mais preocupada que já havia visto na vida e deram-se as mãos. Nisso, meu corpo tremia feito uma taça ao encontro da nota perfeita, e não por sentir medo, mas pela forte energia da presença que estava diante de mim. Perguntei a eles o que queriam e afirmaram que cansaram de me carregar sem reconhecimento, mas que, agora, sabendo de sua existência, as coisas se tornariam mais fáceis, a ponto de eu poder voltar à caminhada do corredor com mais luminância. Aqueles seres me carregaram tanto sem que eu notasse, esses anos todos, mas agora os sentia comigo, pois perdoei-os pelos altos e baixos e me perdoaram pela desatenção.