Deixa de ser frouxo, caboclo frouxo.

Naquela noite eu decidi ficar por causa das brincadeiras com os meus primos, mas se eu soubesse que não havia um lugar para dormir juro que tinha ido embora com os meus pais. Havia pouco tempo que meu avô tinha falecido e meus tios ficaram morando na casa dele. Meu avô era um homem alto, corpo esbelto para a idade que tinha, pele enrugada e com as marcas do tempo, voz aguda, mas suave aos meus ouvidos. Quando faleceu já estava beirando a casa dos 80. Homem muito trabalhador, amigo de todo mundo. Eu particularmente adorava o meu avô, era um dos netos por quem ele tinha bastante afeição. Talvez por isso ele tenha me deixado quieto naquela noite.

Era apenas mais um final de semana em que eu sempre acompanhava meus pais as visitas ao interior depois que nos mudamos para a cidade. Naquele sábado decidi ficar na casa do meu tio pensando que havia um lugar para eu dormir, mas quando chegou à noite que vi todo mundo se aninhando em suas redes e eu fui sobrando, comecei a ficar preocupado quando observei que o único lugar para eu dormir era a velha rede de tucum do meu finado avô. Não deu outra. Aquela era realmente o único lugar para eu relaxar depois de um dia bastante agitado, devido às brincadeiras com a galera. Enquanto a lamparina estava acesa na alcova dos meus tios, até que estava bem, mas quando os velhos aparam o candeeiro, aí meu amigo, não prestou, não. Até então eu estava sentado na rede de tucum, pensando e quase chorando na besteirada de ter ficado para dormir.

Não tendo outro remédio e já perto da meia noite acabei me deitando na velha rede. Um escuro danada de meter dedo no olho, não se enxergava nada, mesmo se quisesse. Não tinha uma tira de pano nem para cobrir os mocotós. Procurei um jeito mais confortável, uma posição para tirar ao menos um cochilo até que adormeci por completo.

Quando despertei meio atordoado, com os olhos grelados procurando o clarão do dia, não vi foi nada. Apenas escutei umas pisadas para as bandas da cozinha. Fiquei assuntando em quem poderia está no escuro brabo daqueles babatando feito doido. Será que era o tio tentando achar uma brasa no fogareiro por ter acabado os fósforos. As minhas suspeitas acabaram quando o velho deu uma tossida pigarreada, devido o uso constante de cigarro, no quarto e outro barulho me chamar atenção. Era o som de pancadas de bengalas sendo tocadas ao chão. Nessa hora foi como se eu tivesse ido ao céu e voltado, porque eram justamente as mesmas pisadas que meu avô dava quando estava vivo.

Dali em diante eu fiquei paralisado. Um frio gélido tomava conta do meu corpo e aumentou mais quando eu ouvi as pisadas vindo em minha direção. Saiu da cozinha e parou na sala. Ouvi quando o caneco desceu ao fundo do pote e o som da água enchendo o copo. Tudo era só medo naquele momento. Até que tudo silenciou de repente. Quando eu já estava mais tranquilo, senti um calafrio no corpo todo. Comecei a ficar todo inchado e quase morro quando alguém sacudiu os punhos da velha rede. Meu coração começou a disparar. Eu tentava gritar, chamar alguém. Abri um palmo de boca e nada, só o medo reinava absoluto. O movimento cessou e as pisadas retornaram para a sala.

E eu ficava pensando! Seria alguém tentando pregar uma peça em mim, se fosse isso já podiam parar porque eu já estava me borrando todo. Mas não era nada disso, o negócio era muito mais sério. Aquilo não era traquinagem não. Aquilo era assombração mesmo. E fui surpreendido mais uma vez, dessa vez com mais força. Sentia a rede sendo jogada de um lado para o outro, como que alguém me pedindo para sair dali. Eu não tinha reação nenhuma, só o medo me dominava. Tentava abrir os olhos e nada. Tentava gritar, a mesma coisa, nada. Certo que depois de alguns minutos eu consegui abrir os olhos e vocês nem imaginam o que eu vi, quando eu arregalei bem os olhos para desvendar o mistério em que estava envolvido adivinhem o que eu vi? Aí se eu estava com medo, nessa hora eu fiquei foi apavorado, porque quando eu estava com os olhos fechados, tudo bem, mas quando eu abrir os olhos bem abertos que não vi coisa nenhuma, só faltei foi morrer de medo.

Depois de muito sufoco. A barra do dia já quase aparecendo e nada de eu sair da rede a única alternativa foi tentar assustar alguém mais medroso do que eu. Dito e feito, só foi dá uma sacolejada na rede do meu primo que estava dormindo do meu lado, o homem acordou até os cabritos no chiqueiro, deu uns berros lá que parecia que estava morrendo. Certo é que ele acordou todo mundo dizendo que tinha alguém sacudindo a rede dele e eu já fui logo dizendo “deixa de ser frouxo, caboclo frouxo”.

Pedro Barros.

Barros Nasimento
Enviado por Barros Nasimento em 09/07/2016
Reeditado em 09/07/2016
Código do texto: T5692526
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