Encruzilhada II
Geraldo morava na comunidade Enjeitado, próximo à comunidade Lajedo. Vivia desiludido com a vida. Reclamava de tudo. Dizia que tudo só dava errado em sua vida. Sua fé estava abalada. Falava que não acreditava mais em Deus, pois Ele o tinha abandonado em muitas situações. Estava descrente da presença do Senhor em sua miserável vida.
Certa noite a esposa de Geraldo acorda aos prantos, se contorcendo toda no fundo de sua velha rede. Era por volta das 23 horas. Maria reclamava muito de dor na barriga e se derramando em suor grita o nome de Deus. Geraldo responde a Maria que Deus não iria fazer nada por ela, então Maria pede a Geraldo que vá até a casa de sua mão que morava na comunidade vizinha pegar um remédio que aliviasse seu sofrimento.
Mesmo contra sua vontade Geraldo decide ir. Já era quase meia noite. Noite escura sem uma estrela no céu. Geraldo coloca seu chapéu de palha sobre seus cabelos ralos e grisalhos para proteger a cabeça contra o sereno na noite, pega seu facão, prepara um facho de marmeleiro e sai rumo ao Lajedo.
Acostumado a andar de noite nas caçadas, Geraldo não demonstra ter nenhum tipo de medo. Nos seus quase 50 anos nunca teve medo de gente morta ou mesmo viva. Seguia tranquilamente seu percurso, quando de repente, ele começa a ouvir uns barulhos estranhos para aquele horário.
Não era nenhum barulho de pássaro noturno, nem rasga mortalha, nem coruja, tão pouco caburé. Geraldo ouvia um barulho de cabrito, como se o mesmo estivesse o seguindo. Ele para por um instante, ouve atentamente o barulho novamente e percebe o berro do ruminante se aproximando. Geraldo segue sua trajetória quando é interrompido por um fungado em suas costas. Nessa hora Geraldo sente um arrepio na espinha, uns calafrios no corpo e vira-se na direção oposta para ver que marmota era aquela. Quando Geraldo faz o movimento e vira-se com a tocha de luz do facho na direção contrária, ele quase morre de susto, pois quando ele fixa o facho ele não ver coisa alguma.
Neste momento, Geraldo que nunca havia sentido tal sensação começou a ficar aperreado, pois o barulho que estava em seu encalço passa para sua dianteira e não era mais apenas o som de um cabrito berrando, agora Geraldo ouvia um bode adulto bodejando em sua frente.
Geraldo fica pensando que marmota seria aquela. Ficou pensando se não seria um sinal para ele voltar, pois a mulher não havia resistido e havia morrido.
Mas o homem decide prosseguir em sua jornada. Pois pensa na esposa que precisa de socorro. Com o facho na mão direita quase se apagando ele vai rompendo a escuridão.
O barulho se intensifica em sua frente, quando de súbito Geraldo lembra que ali a diante fica uma encruzilhada. O homem recorda que muitos já se assombraram naquele local. Muitos diziam que naquela encruzilhada já tinham visto muita coisa feia. Ele pensa novamente na esposa, no estado em que ele a deixou e vai seguindo com os pensamentos a mil.
Em nenhum momento Geraldo se lembra que Deus existe, seus pensamentos eram apenas terrenos, os pensamentos celestes já fazia um bom tempo havia deixado de povoar sua cabeça.
Seus passos em câmera lenta rumam em direção ao som bestial, aproximando-se do local Geraldo sente sensações até então desconhecidas. Começa a suar além da conta, sentir um frio gélido, sentir calafrios por todo o seu corpo, o coração a bater descompassadamente. A poucos metros da encruzilhada ele percebe a presença de uma figura, ao mesmo tempo, familiar e desconhecida. Bem no centro da cruz, no meio do caminho de Geraldo, ali está um bode padechiqueiro reluzindo um brilho fúnebre do seu pelo empretecido em contraste com a tocha de luz do facho aceso. Geraldo quase cai para trás, quando ele mira a tocha de luz em direção ao bode e percebe o bicho fungando e bodejando em sua direção. Seus olhos em puro sangue de um vermelho intenso, Geraldo nessa hora começa a tremer mais que vara verde, pois jamais havia visto um bicho tão horrível obstruindo o seu caminho.
A uma distância de poucos metros, Geraldo encontrava-se imóvel assombrado com a figura assustadora, quando decide dirige-se a ele. Estático Geraldo decide fazer algo que já fazia um bom tempo não havia feito. Não sabia se daria certo, mas naquele momento era o único recurso que dispunha. Fecha os olhos e começa a rezar o Credo, depois um Pai Nosso e uma Ave Maria, quando ele abre os olhos adivinhem o que ele ver...
Pedro Barros