BERENICE
Desembarcou no aeroporto de São Gonçalo e após pegar sua bagagem dirigiu-se ao ponto de Táxi.
- Ponta Negra – falou com um sotaque estrangeiro e entregou ao motorista um pedaço de papel com o nome e endereço da Pousada de destino.
Peter era um loiro de um metro e oitenta centímetros e de cabelos escorridos cortados em estilo moderno. Tinha o rosto perfilado e portava um permanente sorriso nos lábios e uns óculos escuros. Abriu a Janela do táxi e deixou que a brisa esvoaçasse sua cabelereira. Seus olhos brilhavam a cada cena das ruas por onde passava e às vezes assustava-se com o assédio dos flanelinhas e pedintes nos sinais de trânsito; ou impacientava-se com a lentidão do trânsito em certos trechos do percurso, até ao ponto em que o trânsito parou totalmente já próximo à encruzilhada da Av. Pudente de Morais com a Av. Bernardo Vieira. Era uma manifestação de servidores públicos que paralisara a Av. Bernardo Vieira em frente ao Shopping Midway Mall, e protestavam contra o atraso do recebimento de seus vencimentos.
Já era quase meio dia e o sol estava escaldante. O motorista pediu licença para abrir o restante dos vidros das portas, pois o aparelho de ar-condicionado não estava funcionando bem e o calor estava ficando insuportável no interior do veículo. Em seguida aproximou-se uma moto com dois jovens, cujos rostos estavam protegidos pelos capacetes. O rapaz do assento traseiro da moto apontou um revólver para o gringo e gritou: - Passa o celular!
- O que disse...não entendo? – perguntou Peter ao motorista, com um português arrastado; e este, que já acompanhara pelo retrovisor, com ar de preocupado, a aproximação dos motoqueiros, viu confirmada a sua suspeita.
- O celular...entregue para ele o celular – respondeu o motorista fazendo gestos com as mãos para Peter – Eles estão nos assaltando.
O motoqueiro irritado com a encenação e a demora provocada pelo gringo, aproximou o revolver de sua cabeça e gritou: - Vamos logo, passe o celular, se não eu atiro! – Nisso notou também ao lado da perna do gringo uma gorda carteira de couro e completou, dando uma coronhada em sua fronte que seus óculos foram parar no banco da frente.
- Passe a carteira também...vamos logo!
Peter logo percebeu a gravidade da cena e viu que não dava mais para fingir de desentendido e atendeu ao pedido dos assaltantes, que partiram em disparada em meio aos carros na avenida.
Peter resmungou algumas palavras em alemão que o motorista supôs ser um conjunto de palavrões.
- O senhor não quer dar queixa na delegacia? – inquiriu o motorista.
Peter Hans Rosa, comprimiu o rosto como quem constatava para se próprio o real imbróglio em que se metera e ao mesmo tempo em que refletia sobre o que deveria fazer.
Peter nascera em Hamburgo na Alemanha, filho de um pai alemão e uma mãe brasileira chamada Maria Berenice Rosa; Morena, esguia e de longas pernas grossas; conhecera seu pai em uma boate na Praia do Meio em Natal na década de oitenta. Johannes Hans apaixonara-se pela bela morena e a levou para a Alemanha, onde tiveram um filho. Com sua mãe aprendeu a falar português, mas com apenas oito anos de idade seus pais se separaram e sua mãe retornou ao Brasil e dela nunca mais obteve notícias.
- Onde fica isso?
- Fica no caminho, em Ponta Negra!
- Então vamos!
- Tome esse lenço, sua fronte está sangrando – falou o motorista entregando-lhe um guardanapo que retirou do porta luvas do veículo.
Após o motorista desembaraçar-se do trânsito, Peter pediu para levá-lo a um shopping, onde adquiriu um novo celular e logo após dirigiu-se para a delegacia, onde prestou a queixa; logo em seguida, dirigiu-se para a pousada onde iria se hospedar.
Na pousada enquanto desfazia a mala, deixou cair uma foto; era um retrato seu com Maria Berenice Rosa, sua mãe. Deitou-se na cama, estava exausto; e com a foto na mão, deixou que as imagens da infância transbordassem da memória; ainda sentia saudades dela; e jamais compreendeu o porquê de nunca mais ter recebido notícias sua. Com a foto apertada ao peito, fechou os olhos e adormeceu.
Acordou, já era noite; tomou um banho, vestiu uma blusa leve, uma bermuda e um tênis e saiu para um passeio à beira-mar. A lua estava cheia e no calçadão de Ponta Negra os habitantes locais misturavam-se com os turistas em passeio noturno; dispostos no calçadão encontrava-se barraquinhas de bebidas e lanches e banquinhas com souvenirs oferecidos à venda para os visitantes, bares e restaurantes com comidas regionais e frutos do mar à gosto.
Após curto passeio, resolveu parar em um dos bares com música ao vivo em que o cantor interpretava uma bela canção de Djavan. Peter adorava música brasileira, certamente devido a influência da mãe. Aliás, desde criança se interessava por tudo que dizia respeito ao Brasil. Em uma das mesas, encontrava-se um barulhento grupo de italianos acompanhados por algumas garotas, certamente de alguma boate noturna da cidade. O garçom ofereceu-lhe uma mesa e lhe entregou o cardápio; pediu uma cerveja e um camarão ao alho e óleo (ouvira muito falar desse prato e não resistiu ao apelo da foto do prato disposto no cardápio).
Após algumas cervejas, adentraram no bar dois caras conversando em alemão e sentaram-se em mesa vizinha à dele. Peter apresentou-se e convidou-os a sentarem-se em sua mesa. Tomaram mais algumas cervejas e convidaram-no para conhecer um outro bar que ficava do outro lado da Av, Roberto Freire e que era frequentado por garotas de programa. Pagaram a conta e seguiram juntos para o local.
Adentraram o bar, cujas mesas estavam dispostas à céu aberto. Parecia uma torre de babel. Um ambiente efusivo, onde, entre gargalhadas e um estridente vozerio masculino, podia-se ouvir pessoas falando espanhol, italiano, inglês, alemão, etc.; e quase todas as mesas com uma, duas ou três garotas a animarem as conversas. Escolheram ficar sentados próximo ao balcão e Peter resolveu experimentar a tão falada caipirinha; a noite prometia.
-Qual o seu nome?
- Rosinha! – Respondeu a bela morena. E o seu?
- Peter!
- Vai beber o quê?
- Martine, para mim! – respondeu Rosinha.
Sentiram-se mutualmente atraídos; parecia que já se conheciam há anos.
- Garçom, mais uma caipirinha e um Martine, por favor!
A lua cheia dava um ar de encantamento à beleza daquela morena. Corpo esguio, lábios carnudos, olhos negros, pernas longas. Bem mais jovem que ele. Peter estava inebriado e já quase embriagado.
- Vamos sair daqui – disse ela.
Pegaram um táxi e foram para um motel próximo à Ponta Negra.
O sol atravessou as vidraças e aqueceu o belo corpo desnudo de Rosinha, acordando-a. Levantou-se, abriu a janela e deixou entrar a brisa marinha. Peter ainda dormia.
Ela se sentou ao seu lado e passou a acariciar seu rosto. Havia gostado daquele loiro. Tivera uma noite maravilhosa. Peter abriu os olhos e sorriu. Beijaram-se.
- Peter, posso lhe fazer um convite?
- Claro!
- Hoje é o aniversário de minha mãe e gostaria de levá-lo para conhecê-la. Topas?
- Claro meu amor...e como ela se chama?
- Berenice!