Caminho de Santiago - Cap. 09/32 - De Puente la Reina a Estella
Acordei na manhã seguinte com o "cura", uma espécie de administrador do albergue, entrando no dormitório e entoando desafinadamente um cântico religioso cuja única finalidade era colocar-nos para fora. Isto é compreensível porque precisam limpar e arrumar tudo para a chegada de novos peregrinos. Parei num bar ali perto para tomar café e lembrei-me da noite anterior. Onde estaria Jerry agora? Na realidade não tornaria a vê-lo.
Atravessei a famosa ponte em estilo românico sobre o rio Arga e dirigi-me para Estella (Lizarra, em basco) que ficava a 22 km dali. Uma "moleza" porque praticamente não havia subidas neste percurso, exceto uma bem pronunciada logo na saída de Puente la Reina. Eu caminhava muito bem e sem nenhum resquício dos canecões de cerveja tomados na véspera.
No Brasil, eu havia reduzido meu peso de 117 para 93 kg em três meses com dietas e muitos exercícios físicos, caminhando, pedalando e nadando diariamente. Ainda não sabia que isso me seria útil alguns meses depois quando resolvi fazer o Caminho. Foi pura coincidência.
Ou será que não?
Alguém ou algo estaria me preparando para essa aventura de tal forma que eu não me transformasse em mais uma cruz à beira do caminho como aquelas que havia visto?
Caminhando cheguei a Mañeru cruzando depois Cirauqui, Lorca e Villatuerta e após passar pela histórica Ermita de San Miguel, comecei a avistar os primeiros sinais de Estella.
Ali encontrei-me com um casal de italianos que tinha conhecido nos Pirineus. Eram Andrea e Giovanna.
Indicaram-me o albergue onde estavam e ficaram me aguardando numa praça até que eu retornasse para jantarmos juntos.
Meia hora depois nos encontramos e começamos a andar pela cidade.
Não conseguíamos nos decidir por um restaurante. Queríamos, obviamente, unir o bom, bonito e o barato, na medida do possível.
Ao virarmos uma esquina vimos um casal de meia idade caminhando em nossa direção e resolvemos perguntar se eles poderiam nos indicar alguma coisa. Eram peregrinos Australianos, bastante simpáticos.
Nos sugeriram um lugar excepcional do tipo que procurávamos onde tinham exatamente acabado de jantar. Mas seria meio complicado chegar lá, disseram. Percebendo nossa desilusão, resolveram fazer todo o caminho de volta levando-nos até bem próximo ao restaurante. Os peregrinos sempre se ajudam - faz parte das regras desse mágico Caminho de Santiago.
Comemos um pernil mais que delicioso com molho agridoce e cogumelos, logo após termos tomado algumas boas taças de vinho.
Andrea e Giovanna me perguntaram: "ma Sergio, come è possibile che tu parli così bene la nostra lingua se sei un brasiliano?".
Expliquei-lhes que era filho de italiana e que também havia morado por 2 anos na Itália.
Voltamos para o nosso albergue felizes pelo vinho e pelo delicioso pernil.
No dia seguinte outros 22 km me esperavam até Los Arcos.