Caminho de Santiago - Cap. 07/32 - Em Pamplona

Vale aqui uma explicação: os Albergues Municipais são mantidos pelos "Ayuntamientos", ou seja, pelas prefeituras das cidades que por sua vez têm ajuda do governo. É compreensível essa filosofia espanhola, já que os milhares de peregrinos que realizam o Caminho de Santiago todos os anos, contribuem decisivamente para o incremento das verbas obtidas com o turismo.

O preço para um bom banho, uma vaga em uma cama beliche, com direito a usar cozinhas totalmente aparelhadas, inclusive com geladeiras e microondas, sanitários limpos, sala de descanso e lugar para lavar e estender a roupa, custa em média 6 euros. Uma bagatela!

Geralmente abrem às 10H00 para entrada dos peregrinos e fecham às 22H00, horário em que todos já devem estar em suas camas quando a luz é então apagada. Costumam ser operados por voluntários, normalmente peregrinos que já concluíram o Caminho e querem, assim, expressar seu reconhecimento e gratidão.

Depois existem os Albergues Paroquiais, normalmente mantidos por igrejas e situados quase sempre ao lado delas. Oferecem esses mesmos serviços, além do jantar e café da manhã. Normalmente nada cobram, aceitando qualquer valor como donativo. Costumam engajar o peregrino em dinâmicas de grupo e solicitar sua presença em missa na própria igreja, não tolerando grupos, falatórios, nem o consumo abusivo de bebidas, ainda que seja o secular vinho.

Um outro segmento é o dos Albergues Aderidos, ou seja, albergues particulares cujo funcionamento é autorizado pelos "Ayuntamientos" e que cobram em média 12 euros. Costumam ser mais organizados e modernos.

A regra contém exceções. Conheci muitos bons albergues municipais, como o de Burgos (Los Cubos), que tem até elevadores com cabines em aço escovado e comandos digitais e também albergues aderidos bem mais simples. Entretanto, todos atendem adequadamente aos peregrinos. Muitos deles têm máquinas de lavar e secar roupa, para a venda de sanduíches, sorvetes, café, refrigerantes, internet, WI-FI e outras facilidades.

Resolvi perguntar ali mesmo onde poderia encontrar um hostal, que normalmente variam entre 20 e 40 euros, quando tive minha atenção despertada por um homem e duas mulheres com o mesmo problema. Ele chamava-se Jerry, um padre Irlandês que fazia o Caminho sozinho, como mais tarde viria a saber. As mulheres eram duas australianas de cujos nomes não me recordo. Juntei-me a eles, já que estávamos todos no mesmo barco e após as apresentações de praxe, como: "what's your name" e "where you from", Jerry me disse que haviam sido informados da existência de um hostal modesto (Pensión Eslava), mas situado em pleno centro de Pamplona, onde poderíamos encontrar quartos para duas pessoas cada, com banho no corredor.

Fomos os quatro batendo papo pelas vielas seculares, rindo de nossas topadas e desenganos, até que chegamos ao local desejado onde constatamos haver vagas - exatamente dois quartos. O preço era justo: 30 euros por quarto que dividi com Jerry. As duas australianas ficaram com o outro quarto e não mais nos veríamos.

Deixei Jerry tomar banho primeiro. Aproveitei para jogar todo o conteúdo da minha mochila sobre a minha cama e comecei a procurar por itens supérfluos, pois achava que estava demasiadamente pesada.

Acabei eliminando muita coisa como vários sabonetes, idem tubos de creme dental, aparelhos de barba descartáveis, loção após barba, diversos pares de meia, uma bússola, desodorante, um apito (por que raios eu tinha trazido isso?). Me desfiz também de parte da minha roupa (fiquei só com 3 bermudas, 3 cuecas, 3 camisas, 1 casaco de frio, uma calça e uma só toalha de banho).

No Caminho a gente aprende a ter menos. Constatamos que não necessitamos de muito para viver nossas vidas e que a maioria das coisas e bens materiais que possuímos, são apenas excessos - nada mais. Quantas vezes nem lembramos das roupas e sapatos que temos nos armários? De Saint-Jean a Pamplona, aprendi que míseros gramas fazem muita diferença num percurso de 70 km que era o que eu tinha andado até aqui.

Jerry saiu do banho e disse que me esperaria num determinado bar no centro de Pamplona para conversarmos e tomarmos umas cervejas.

Após o meu banho desci e comecei a procurar por ele buscando o tal bar cujo nome, confesso, não havia memorizado muito bem.

Sem conseguir encontrar nem um, nem outro (a noite em Pamplona estava animada, com muita gente nas ruas e nos bares), resolvi jantar e voltar para o quarto, onde me joguei na cama e adormeci imediatamente. Percebi quando Jerry chegou, bem mais tarde, mas fingi estar dormindo. Ele se recolheu sem dizer nada.

Na manhã seguinte, meio aborrecido, ele quis saber o porquê de eu não ter cumprido com o combinado na noite anterior.

Após minhas vagas explicações, que aparentemente não o convenceram, saímos do hostal e fomos tomar café para logo depois iniciarmos nossa caminhada. Como de praxe, comecei a parar para fazer minhas fotos o que acabou por aborrecê-lo, pois ele tinha pressa. Disse-me então que iria seguir sozinho para Puente la Reina, caso eu não me importasse.

Era tudo o que eu queria.

Sergio Righy
Enviado por Sergio Righy em 06/08/2017
Reeditado em 22/09/2017
Código do texto: T6075892
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