O HOMEM INOMINÁVEL
O tom amargo na voz se assemelhava ao gosto amargo na língua. Excruciante era a saudade, tão impiedosa quanto boba. Sem nome, sem endereço, sem documento que o comprovasse ser indivíduo de fato, ruminava os fardos diariamente, como um boi mastigando. Era perfeito demais para caber em algum local onde gente quisesse ser raríssima diante dos olhos de terceiros.
Era tolice lutar contra todo o amargor.
Ele sabia, ainda que negasse. E ainda assim, permanecia fiel a quem quisesse ser seja lá qual fosse sua verdadeira vocação existencial. Estava apenas assoprando as velas de seu túmulo, ainda que este não existisse de fato. Ousava querer morrer na praia, tendo as estrelas como únicas testemunhas de seu desapego carnal, ou melhor, morrer em algum local tão gélido quanto se tornara o seu coração antes pulsante de vida. Era pequeno demais para sentir dúvidas.
Outros vieram logo a seguir.
O seguiram noite à fora. Era inevitável não se importar com aquele pobre ser abominável, e sim, estava coberto de todas as razões possíveis, pronto para voar em um breu interminável. Sendo assim, saberia encontrar quem quer que fosse dentro de qualquer conversa capciosa. Era inocente demais para perceber quem era de fato. Somente um menino amedrontado no corpo de homem.
Seu nome... Bem... Prefiro não dizer. E nem mesmo ele me autorizaria a tal profanação de sua intocável áurea. Era mortal agora, sem qualquer escudo, apenas incoerente ser que habitava as correntezas daquele rio estreito em lugar algum senão nos confins da própria perdição.
E ele se foi.
A queda do penhasco o jogou para águas turvas. Estava encontrando sua mãe agora, dois indivíduos problemáticos, coisa de sangue, geração para geração.
Era o fim, afinal de contas. Nem mesmo ele poderia salvar-se.
Era o fim?