Diário de um viciado em apps de paquera

Diário de um viciado em apps de paquera

4:50: acordo (sim, acordo bem cedo), mal abro os olhos e já procuro o meu celular. Ando para a sala em direção à cozinha enquanto deslizo para a direita ou para a esquerda alguns perfis no Tinder. Na verdade, nem analiso os perfis, só vejo a foto principal mesmo e tomo a minha decisão. Meio sonolento ainda, estou com preguiça de ler e colocar em prática o meu rito de aprovação.

5:00: enquanto tomo meu café com leite, deixo o Tinder um pouco de lado. Confesso que nunca parei para contar, mas as curtidas limitadas são numerosas, posso entrar de novo mais tarde, mais atento. Agora, outro app, o “Adote um Cara”. Diferentemente do Tinder, não se clica em coração ou em X, mas se joga um “charme”, que a mulher sabe quem lançou e decide se dá ou não a chance ao cortejador. São dez charmes por dia.

Nesse momento, prefiro aquelas que responderam todo o formulário. Desde altura até preferências literárias; ganham pontos aqueças acima de 1,60 ou as que curtem Harry Potter. De cor do cabelo até gostos musicais; não procuro restringir aqui, só evito quem gosta de sertanejo universitário e afins. Ah, lógico, falhar na ortografia já me levam imediatamente ao próximo perfil.

Lanço os meus dez charmes do dia. Raramente é recíproco. Quisera eles soubessem que o nerd de hoje é o cara rico, o bom marido de amanhã. Quando dá match, não adianta eu dizer que sou o melhor partido da cidade, elas não costumam achar graça na piada – e não é piada. Enfim, acho que todas estão dormindo ainda. Melhor ficar atento ao longo do dia e ver como me saio.

5:10: Partiu Happn. Deixar o celular durante a madrugada perto da janela ou em outro cômoda da sala não ajuda a cruzar com alguma gatinha perdida aqui perto de casa. A boa mesmo é ativar o app quando estou na academia, na balada, no barzinho, no samba, vai que alguma pretendente está fazendo a mesma coisa. (Nesse momento, você pergunta: “ué, não é mais fácil interagir ao vivo, face a face com as pessoas nos referidos lugares? Err... Se isso fosse realmente fácil, eu não teria cinco aplicativos diferentes aqui.

Infelizmente, não costumo ter sorte no Happn. Nem nos outros, na verdade, mas esse aqui parece ter uma implicância comigo. A impressão é a de que todas as mulheres usuárias são amigas daqueles caras do fundão da sala que praticavam bullying em mim no ensino médio. Parecido com o Adote um Cara, também dá para lançar os tais charmes aqui. Porém, você os ganha só quando instala o app, depois, raramente são cedidos gratuitamente de novo. Chega a ser desesperador quando vejo aquela gata meu alvo da academia em um quadrinho, “cruzou com você na rua tal”, e o máximo que se pode fazer é clicar no coração, tipo no Tinder, e torcer para que ela faça o mesmo. Ela não faz. Santo Antônio vai continuar de castigo.

5:20: Kick Off. Parece nome de joguinho de futebol, verdade. Dá para encontrar nele amigas de amigos e por aí vai. Estilo parecido com os outros, desliza para a direta ou esquerda, coração ou x, 20 pessoas possíveis por dia. Pode jogar um “uow”, aí a escolhida vê que despertou uma paixonite. Gasto pouco tempo, mais propaganda do que qualquer coisa nesse app. Só deu certo uma vez. Vale contar uma parte do encontro.

Primeiro, ela me assustou. Já deu o Whatsapp logo de cara e me fez umas dez perguntas seguidas. Foi logo sugerindo um encontro para o dia seguinte. Pensei:

(a) Vou amanhecer numa banheira com gelo e dois cortes nas costas, sem os meus rins.

(b) Olá, esse é o Diogo. Hoje ele vai participar do programa “Fala que eu te escuto com o tema: sou viciado em apps de paquera”.

(c) Rá, pegadinha do Mallandro!

(d) Já pensou em ser um revendedor Jequiti?

Durante nosso passeio no shopping, andamos por uma loja de departamentos. Ele ficava o tempo todo me dando coisas para segurar e logo depois retirando. Me senti um cabide. Num momento, restaram duas, devolvi para ela. Levei uma bronca, ofendida, disse que não estava tentando fazer com que eu pagasse nada para ela e (segue um sermão de mais 10 minutos) e fomos para o caixa. Enquanto ela pagava, outra atendente me chama, pois eu tinha escolhido uma camiseta, fui, levei outro esporro. “por que você me deixou sozinha no caixa? Porque outra mulher te chamou? Quer dizer que se a gente está em algum lugar e uma outra te chama, você me abandona também?”. Que drama, acho que esse encontro foi uma bola fora.

5:30: OkCupid. Ok, cupido, mas uma tentativa. Talvez este seja o menor popular de apps do tipo. Recursos parecidos com os outros, mas a possibilidade de abrir um chat a a qualquer momento com a escolhida da vez. Pena que raramente me escolhem. Opa, melhor ir, de casa para o trabalho.

O dia passa, o gps do celular fica ligado, a internet também. Assim, quem sabe, rodando a cidade, quem sabe não esbarro, virtualmente, com aquela que vai me ajudar a reproduzir a cena do beijo de Homem-Aranha 1. Nem precisa ser ruiva. Nem vou comrparu ma fantasia do teioso também. Só quero uma namorada, poxa, não aguento 700ml de Ovomaltine sozinho.

18:30: estou na academia. Adivinha quem está lá?

1) Aquela para quem já deixei dois bilhetinhos na série com trechos de músicas dos Beatles e um adesivo pequeno do Lennon.

2) Aquela para quem já mandei msg no Spotted do bairro em que moro.

Elas mal sabem que existo. Outro dia, tentei um flerte, mas não ajuda ter sempre a mesma expressão na cara e nem estar com o nariz escorrendo.

Entro no Tinder. Coloco nas configurações a distância de 1km. Escolho idades entre 24... e 25. Por sorte, encontro a primeira. Super-like, ela vai ver. Suborno o professor e coloco no som da academia a música dos Beatles que leva o nome dela. Carol. Altero a minha descrição no app para “aquele que coloca bilhetinhos na série da menina da academia”. Espero. Só espero mesmo. Se ela viu, ignorou. Um bombado qualquer pediu para revezar um aparelho com ela e ganhou em troca um sorriso e uma mexida no cabelo.

Vou para casa. Será que ainda existe o chat da Uol?