Sonhos Interrompidos



Poderia discorrer sobre mil sonhos lindos que terminaram se realizando com o matrimônio. Mas o sonho não termina, ele continua no dia a dia. Cada dia um sonho, que nasce dos sonhos realizados, mas... E os sonhos que são interrompidos, que dilaceram o coração e fazem sangrar a alma... E o corpo definha, e a mente se refugia no passado tão presente. Sonhos de aposentadorias e passeios, sonhos da casa própria, dos filhos formados e os netos no colo, e a casa cheia de alegrias com o gargalhar de toda família. Sonhos interrompidos por morte prematura, por afastamento de mudanças de cidades ou por brigas dentro da família. Cresce a família, os sonhos mudaram. Novos sonhos, nova meta. Algo permanece. O amor sonhado... Sonhado? Aquela mulher ao meu lado ou aquele homem não é o meu príncipe encantado... Pesadelo. E se encontram novamente no mundo dos sonhos, e nasce novamente o desejo de amar, da procura de sua alma gêmea. E se encontrar. Este encontro gera novos sonhos e uma guerra íntima, que novamente faz a alma sangrar. Tantos sonhos lindos de alegria e felicidade. Enfim amores reunidos à vida com seus tropeços e flores... A velhice chega. Sonhos do passado tanto esperaram o futuro e só o que os faz sorrir é o passado. E o mais cruel desenlace é a separação de dois seres que se amam. E a família coloca um no asilo, e o outro vai para longe com o filho, que acolhe a mãe, mas não o pai, porque será além de suas possibilidades. E a senhora de cabelos brancos sonha com o passado, e procura no meio da noite aquele corpo que a acalentava, aquecia não só o corpo, mas preenchia sua alma. A dor da solidão e o sonho de novamente estar junto, sonha com o toque das mãos do amado. Como seria bom escutar novamente aquela voz, e sentir o beijo morno em sua face ressequida pelas lágrimas, e seu olhar apagado sem rumo, que só olha o passado. Sonha acordada a pobre amada, longe de seu amor. Adoece... Seu espírito não vive com ela, sonha longe. Definha, e entra em colapso aquele corpo esvaziado, preenchido por sofrimento. Agoniza no leito, um, dois, 20 dias... Enfim quando nada mais resta, entra seu amado. O corpo já morto sente o chamado, e volta à vida para estar com quem tanto ama. “Querida”, escuta chamando, o beijo molhado em sua face tem a chama da vida. Sonhos? Não! Realidade dos sonhos retirados, ali presentes. Lágrimas que se misturam. Mãos que acalentam. Final de tarde... A primeira estrela no céu brilha. Hora do amado voltar ao asilo. Ou seria exílio... Parte com a alma despedaçada, sentindo na alma o peso da vida. Perdeu o direito de ser ele mesmo. Sua amada doente e ele já não têm o direito da escolha. É obrigado a deixá-la moribunda e voltar... Trabalhou anos, economizou e sonhou que era um homem, que vivia no meio de homens... Cabisbaixo e tropeço, caminha com passos lentos para sua cela no exílio. Pela manhã, toca o telefone. Sua esposa falecera após sua visita. Os atendentes do asilo vão ao seu quarto levar a notícia, e param surpresos. Jaz na cama o velho caduco, que nas noites chamava sua amada dormindo. No rosto, estranho sorriso. Nas mãos, um lenço escrito “sempre com você”. No hospital, quando morreu a senhora, ela segurava um pergaminho escrito "partiremos juntos". Em sua face, um estranho sorriso. Partiram para o infinito, onde não existem barreiras para almas gêmeas separadas. Apenas uma alma completa chega ao paraíso. Apresentam-se as almas, enfim unidas.
Dione Fonseca