A Marionete
Era uma vez uma linda marionete de porcelana. Tão impecável e perfeita que mal podia sair do pequeno palco feito pra ela. Seus traços bem desenhados demonstravam olhos vivos e um semblante alegre. Ela era manipulada por fortes cordões de aço e sempre se movia com delicadeza para alegrar seu dono.
Seus passos eram sempre marcados e seus atos sempre os mais corretos para que seu dono não se queixasse.
Ela era uma marionete exemplar, parecia estar numa eterna vitrine para que seu dono a exibisse com orgulho. Ele a apresentava nas festas, a enfeitava com finas roupas e em seu rosto um sorriso era muito bem desenhado... E os cordões, ah os cordões... Esses a limitavam a cercar seu dono que com destreza movia os dedos pra lá e pra cá, divertindo-se com marionete tão encantadora.
Todos o parabenizavam por ter como propriedade marionete tão rara. E um sorriso carregado de sinistra possessão brotava no canto da boca acompanhado de um olhar indecifrável que decaía sobre a marionete, que ao reconhecer tal expressão, tremia.
Ele a manipulava... A exibia quantas vezes fosse necessário, enquanto houvesse luzes no palco, ou pessoas para aplaudir.
Mas depois que a festa acabava... Depois que todos dormiam e as luzes se apagavam e a marionete era posta de lado, uma tristeza profunda e um grande vazio se apossavam dela. Ela não sabia o que eram as lágrimas, mas sentia que derrama-las fazia com que se sentisse melhor.
Era assim todos os dias...
Ninguém sabia, mas dentro dessa marionete havia um coração quebrado, um par de olhos vendados, e um diamante escondido.
Até que um dia seus cordões, ainda mais espessos que antes, a levaram a se apresentar num teatro diferente.
No palco, sob o comando dos cordões seus passos tropeçaram num lindo par de olhos sinceros e a marionete sentiu seu coração colar-se por inteiro! E tudo pareceu ganhar cor. O sorriso que acompanhava esses olhos não trazia consigo o dom de fazê-la temer, ao contrário, preenchiam de luz cada espaço vazio que havia dentro dela.
Pouco a pouco, os cordões ficavam mais leves e seus dias menos tristes e menos iguais. Seus olhos agora enxergavam com mais nitidez o horizonte.
A marionete começou a descobrir novas cores que se formavam da luz.
Pouco a pouco seu sorriso já não era mais desenhado, pois a vontade de sorrir brotava de dentro e nascia prazeroso a refletir o que brilhava em seu coração. O diamante queria sair!
Até que um dia, num instante preciso e nada ensaiado, a marionete sentiu um novo sabor a adoçar seus lábios, o encontro de dois sorrisos num delicado beijo!
Nesse pequeno instante ela teve a sensação de sentir flutuar o universo inteiro em sua garganta. Foi então que ela sentiu desintegrar-se os cordões que a prendiam e a pequena marionete soube pra quem daria seu precioso diamante escondido.
***********Este conto, dedico em especial a minha querida amiga C. e para todas as marionetes que ainda existem em pleno século XXI.**********