MICRODRAMA RODRIGUEANO
A voz do outro lado não queria diálogo.
- Hoje, às sete, quarto 18 do Motel Les Amants. Acorda, rapaz!
Ele retornou a ligação. Telefone público. Ninguém atendeu.
- Dorinha, paixão, vamos vai...
- Não sei. O Artur já vai sair do trabalho.
- Liga pra ele. Inventa uma bobagem.
- No Les Amants?
- Claro. Quarto 18.
O celular de novo. Agora número conhecido.
- Oi, Artur. A comida está pronta. Vou um pouco na mamãe.
Não se arrependeu de nenhuma noite com Dolores, a pretexto de estar trabalhando. Cachorra!
Inventou:
- Vai tranquila. Hoje fico até mais tarde.
Bia, ou loirinha casada, hesitou, mas enfim apertou o enter que dizia sim a meses de cortejo virtual.
Era a primeira vez que iria a um motel sem seu marido.
Antunes passou os dedos pelos longos cabelos ruivos de Dora. O carro parado. A recepcionista não poderia atendê-lo.
- O 18 já está ocupado, senhor.
- Então vai qualquer um, pô!
Com um pontapé, Artur abriu a porta aos gritos de eu te mato vagabunda.
Apontou o revólver para os corpos na penumbra. Uma bala correu até a cabeça dourada de Bia, a pecadora incipiente.
Ao mesmo tempo, no mesmo quarto, a vítima gritava enganada:
- Meu Deus! O meu marido!
Levou um susto quando entrou em casa e viu a mulher comendo à mesa. A polícia logo o encontraria, teria que partir.
Acreditava-se uma vítima de um trote fatal. Guardaria na memória aquela última imagem.
Para ele agora, a mulher virara uma santa.