NA CAMPINA ESVERDEADA DE FLORES VIOLÁCEAS E ALARANJADAS

Na linda campina esverdeada, com lindos arbustos de flores violáceas e alaranjadas, viviam o grisalho Ananias dos Reis, garboso nos seus sessenta e quatro anos e sua morena sobrinha Letícia Lemos dos Reis, já beirando os quarenta anos, mulher de absoluta formosura e timidez, era uma convivência harmoniosa e tranquila, em seu lar de contos de fadas. Uma casinha branca de janelas azuis, com uma varanda sombreada por uma laranjeira frondosa e saudável, lhes brindado durante todo o ano, com belas frutas adocicadas e suculentas.

Ananias cuidava da terra com vigor, tinham uma pequena plantação de verduras e batatas, duas goiabeiras, uma macieira e também, alguns poucos pés de milho e feijão. Ao lado da casa mantinham também, uma vaquinha leiteira, dois bezerrinhos e algumas galinhas poedeiras, cujo o trato era feito por Letícia. Tinham uma vida simples, comiam o que plantavam, sobreviviam com as suas aposentadorias, a de Ananias, como capataz de uma antiga estância da região e Letícia como professora primária, da escola da cidadezinha próxima.

Ananias não tivera esposa nem filhos, Letícia perdera seus pais muito cedo, e desde então morava com o tio, nunca se interessou por rapazes, nem nunca se apaixonou, talvez por sua imensa timidez, só se soltava um pouco no trato com as crianças, nas reuniões de pais e mestres, mais ouvia do que falava, mas, nunca sentiu solidão, era bem resolvida nesse assunto, lhe bastava o trato com os animais, com o seu cantinho encantado e a convivência carinhosa e agradável com o tio Ananias.

Vez por outra, iam à cidade para colocar cartas no correio para algum parente distante, comprar açúcar, farinha, carne seca, linguiça, mel, algum curativo e ferramentas, papel, canetas, passar pela consulta médica semestral e muitas pilhas para o rádio, não tinham televisão, os jornais que recebiam todos os dias por um
mulatinho risonho de nome Evaristo, já lhes deixava a par do mundo. Adoravam ler os muitos livros, que tinham numa bela estante, na salinha de casa e conversar sobre a natureza e seus encantos.

Quando conseguia, convencer seu tio a ir para uma missa por mês que fosse, se postavam com suas roupas domingueiras, tomavam chá com bolo de maçã, na antiga confeitaria que tinha na cidade e voltavam no seu fiel furgão, duro na queda, este sim era um guerreiro, já existia e os servia há muitos anos e cada vez que iam até a cidade, lhe faziam uma revisão e ele voltava sorrindo feliz para a casinha branca de
janelas azuis, pronto para mais uma temporada.

A época que mais gostavam, era quando suas galinhas colocavam muitos e muitos ovos, e as verduras prosperavam no solo, assim conseguiam uma renda extra, para se esbaldar na livraria e na confeitaria. Ananias e Letícia eram loucos por doces cremosos e tortas bem molhadinhas, isso para eles é o que chamavam de diversão. Sentiam-se abençoados pela saúde que tinham e pelas dádivas da Natureza farta em seu território, nada lhes faltava, eram felizes na sua campina
esverdeada de flores violáceas e alaranjadas. Naquele lugar o clima era sempre ameno, o Verão não torrava a plantação, nem o Inverno era muito rigoroso, com a graça do bom Deus.

Nas suas cadeiras de balanço, colocadas na varanda à sobra da frondosa laranjeira, viam a vida passar, serenos e agradecidos, tomavam suas limonadas às vezes um café fresquinho com algum docinho, conversavam sobre o que ouviam no rádio, ou apenas ficavam admirando a paisagem, absortos em nenhum pensamento, só sentindo o ar entrar em seus pulmões, pura paz.

Quando sua vaquinha dava leite de sobra, Letícia fazia queijo e conservava, preparava alguns potes de doce de leite, que logo o tio Ananias e ela, davam conta, pois eles eram verdadeiras formigas quando se tratava de doces, quando achavam que estavam exagerando, davam queijo e doce de leite para o risonho
mulatinho Evaristo, aquele moleque simpático era só alegria, estava sempre muito ocupado, mas, tirava alguns momentos para tomar uma limonada e prosear com eles todas as manhãs.

Um dia o
mulatinho risonho Evaristo, chegou meio tristinho, pouco falava e quando montou de novo em sua bicicleta para voltar para as suas entregas de jornais, Leticia o parou e perguntou o que é que ele tinha, pois estava estranhando a carinha triste que ele estava e sentiu falta de sua alegria e do sorriso farto. Ele falou que era órfão e quem cuidava dele há muitos anos, era o pároco da igreja, e que como já estava muito velho, o pessoal do orfanato estava procurando, alguma família que pudesse adotá-lo, e ele estava prestes a ser deixado de volta no orfanato, pois ninguém havia se interessado em adotá-lo até agora, Gostava do padre, mas, sabia que isso um dia iria acontecer e apesar disso, não queria ir para o orfanato. Letícia disse que ele tivesse fé, que tudo iria se resolver, lhe deu um beijo na testa e um bom pedaço de bolo e deixou que ele seguisse seu caminho.

Letícia comentou o fato com o tio e Ananias disse que iria sentir muita falta do garoto, iria rezar para que tudo corresse a contento, e foram cuidar dos seus afazeres, lá pela tardinha, ambos ainda estavam pensando no
mulatinho e agora tristonho Evaristo, Letícia e Ananias não falaram mais no assunto, mas, isso não lhes saia da cabeça, pobre menino risonho.

Na manhã seguinte, muito mais cedo do que o costume, Ananias levantou cedo, fez o café, pôs a mesa e esperou Letícia acordar, depois que ela tomou banho e se juntou a ele na cozinha, ele falou de um tiro só.
- E, se nós adotássemos o moleque?
Letícia tomou um susto e se pôs a cantarolar gargalhando em volta do tio, pois era nisso mesmo, que estivera pensando o dia e a noite toda, mas, não sabia como o tio iria receber essa suposição, então, estava resolvido,  quando Evaristo chegasse, para a entrega do jornal, eles colocariam sua bicicleta no furgão e iriam com ele até ao cartório da cidade, verificar o precisariam fazer, para tornar aquele moleque feliz e risonho, parte de sua pequena família, e iriam fazer isso de todo o coração, não por pena, pois já gostavam demais daquele menino.

Vocês podem imaginar, a felicidade que Evaristo ficou quando soube da notícia, nem eu poderia, e olhem que sou eu que estou contando essa história familiar e lúdica. O
mulatinho risonho era só pulinhos de alegria, corria, abraçava a morena Letícia e o grisalho Ananias que quase os sufocava, tudo era festa naquele momento, pediram que ele esperasse para que eles trocassem de roupa, não queriam perder nem um minuto sequer, para resolver aquele assunto. Deixaram Evaristo na cozinha saboreando um queijinho com goiabada e um suco de laranja, rapidamente se aprontaram e foram no velho furgão velho de guerra, dar início a sua nova e feliz família.

Ananias e Letícia pegaram algum dinheiro, para comprar coisinhas que um menino iria precisar, precisavam também, ver como ficariam as coisas no colégio do novo membro da família, resolver tudo no orfanato e no cartório. Por causa dos trâmites legais, a papelada demoraria pelo menos um mês para ficar pronta, mas, no final da tarde, já retornaram abraçados com o
mulatinho risonho, cheios de sacolas de compras na cabine do furgão, felizes e falantes.

E no final do mês, o jovem Evaristo dos Reis, mostrava seu boletim escolar, com belas notas para que Ananias assinasse, orgulhoso pelas tantas, o menino era realmente uma benção enviada por Deus, Letícia o mimava e ensinava o trato com os animais, colocaram um balanço na árvore mais frondosa para que ele brincasse, compraram uma televisão, passaram habitualmente à ir à missa todos os domingos e acompanhavam Evaristo dos Reis, no parquinho da cidade para que ele se divertisse e convivesse com outras crianças, eram uma família harmoniosa e feliz, até Letícia perdera a timidez e numa das quermesses da igreja, conheceu um rapaz
moreno e trabalhador, que parecia estar se interessando muito por ela, e ela também por ele, por mais que não admitisse, o Universo conspirava a favor.

Ananias estava prevendo que sua família iria aumentar logo, logo, tratou de compras algumas madeiras e aumentar mais dois quartos na casinha branca de
janelas azuis, pois, aquela campina esverdeada de flores violáceas e alaranjadas, estava prestes a ficar um pouco mais povoada, nem podia imaginar que pudesse ser, ainda mais feliz do que já era, tinha mesmo que fazer as pazes com o Todo Poderoso, pois bênçãos, era o que não faltava por ali.

Então, vou ficando por aqui, deixando por conta do tempo, o desenrolar dessa nova e auspiciosa história, espero que tenham gostado desse relato bucólico e feliz, fiquem com Deus em seus corações, até a próxima...

 
Cristina Gaspar
Rio de Janeiro, 07 de julho e 2015.
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 07/07/2015
Reeditado em 08/07/2015
Código do texto: T5303318
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