*Não Pensei Que Iria Ser Assim*
Não pensei que iria ser assim, mas foi.
Você era e continua sendo insistente e persistente... Em sua determinação, chega a ser chata e mesmo quando tudo parece perdido, você acaba dando um jeitinho e consegue o que quer.
Você tem o dom de me deixar nervoso e parece não se importar.
Me irritar, com certeza, é o seu passatempo favorito.
Tudo o que você vai fazer, faz dançando, cantando, como se a vida fosse um parque de diversões... Tarefas e deveres que requerem atenção e responsabilidade, você os realiza também brincando e rindo, tirando sarro de tudo o que estiver a sua frente.
Eu não sei de onde vem tanta energia, não consigo descobrir como faz para estar sempre sorrindo e brincando, todos os dias, sem exceção.
Quantas vezes estive a ponto de, senta-la em meu colo e dar-lhe umas chineladas... Quantas vezes tentei pegá-la, correndo para lá e para cá e você ainda me desafiava.
- Vem, vem! Vai seu velho rabugento, me pega... Vem me pegar hominho das cavernas...
Depois do insucesso da minha perseguição, exausto e ela morrendo de rir.
Devagar ela se aproximava, esgueirando sorrateiramente e em seu rostinho lindo, aquele olhar faceiro de menina peralta que acabara de fazer uma grande arte.
De repente, pulava em meus braços e começava a me beijar, a me morder e fazer-me cócegas... Era impossível não rir mediante a tanta infantilidade.
Quem diria... Uma menina crescida de quarenta anos... Uma mulher vibrante, alegre, efervescente, fantástica... Super responsável e cumpridora dos seus deveres, mas, continuava a se parecer com uma criança, espirito infantil, tremendamente espirituosa como se na vida, não existissem problemas.
Me pego a pensar... Voltei ao passado... Flash back.
Eu tinha trinta anos e trabalhava como um louco para realizar os meus sonhos... Era um homem focado, retraído e caseiro... Raramente passeava ou curtia uma balada... Não era dado a festas e comemorações.
Estava fazendo compras no supermercado quando em uma curva, nossos carrinhos se chocaram... Ela me olhou e abriu um lindo sorriso dizendo;
- Você não ligou a seta e fez a curva muito fechada... - Não viu que o semáforo estava aberto para mim?
Desculpei-me, rindo da forma espirituosa de lidar com aquela situação e com um aceno de cabeça me despedi.
Certa manhã, no ponto de ônibus, escuto alguém dizer;
- Já tirou a carta de motorista ou foi reprovado mais uma vez?
Novamente aquele sorriso encantador bailava em sua face.
- Olá... Respondendo a sua pergunta, ainda estou tomando aulas, mas, derrubo as balizas toda vez que vou estacionar.
- Era para adivinhar, vendo-o aqui no ponto de ônibus... Ainda bem, pois assim, os postes lhe serão eternamente gratos.
Ri daquela observação e ela fez tchau com a mão e se foi.
Um dia, no Shopping Center, estava em cartaz o filme, O silêncio dos inocentes e pelos maravilhosos comentários que eu escutara, resolvi assisti-lo.
Qual não foi a minha surpresa ao escutar;
- Eu sabia que iria encontrar um cavalheiro para pagar-me a pipoca e a Coca-Cola, afinal, cinema sem pipoca não é cinema, não é mesmo?
E assim foi feito... Comprei pipoca e a Coca-Cola e juntos assistimos um belo espetáculo... O filme era realmente maravilhoso, mas, eu teria que assisti-lo novamente.
Durante o filme, ela roubava da minha pipoca e me cutucava sempre que havia alguma cena mais empolgante... Ela era agitada demais, como se tivesse formigas na cadeira.
Na saída do cinema, sorrindo ela agradeceu o cavalheirismo, deu-me um beijo no rosto e na maior cara de pau, perguntou-me;
- Você não quer casar comigo? Eu sei estourar pipoca como ninguém.
- Kkkkkk, quer dizer que você tem todos estes atributos?
- Hum rum... Faço pipoca e um miojo delicioso... Sou uma excelente cozinheira.
Ainda rindo, a vi se afastar... Os pais se encontravam na praça de alimentação.
Um belo dia, encostado no carrinho e vendo a data da validade de um produto, me assusto com o barulho e o choque de outro carrinho no meu... Novamente aquele lindo sorriso, novamente aquele jeitinho faceiro de menina peralta.
- Opsss, foi mal... Ao invés de pisar no freio, pisei no acelerador.
- Só podia ser mulher...
- Ooooopppaaa... Isto é preconceito! Posso processá-lo por calúnia e preconceito e a sua pena serááááá...
- Caramba... Você já sabe até o final do julgamento? E a minha defesa? Qual será a minha pena Meritíssima Juíza?
- Hummmmm, pensando... Pensando... Pensando... Ahhh, já sei!
- Você está condenado a casar-se comigo e fazer-me feliz para o resto da vida.
- Eu sabia! Sabia que isto iria dar cadeia... Estou condenado a comer pipoca e miojo pelo resto da vida?
Não sei se foi praga... Não sei se foi premonição... Não sei se foi, obra do destino.
Estamos casados há vinte anos... Vinte anos de companheirismo, amor e risadas... Ela continua sendo aquela menina peralta que não deixa escapar uma chance para brincar.
No último domingo do mês, jogo bola com uma turma de colegas do trabalho, mas...
Ela está com as minhas chuteiras na mão, correndo pela casa toda e eu atrás dela... Ela consegue me irritar, realmente me deixar nervoso, entretanto...
Ela foi e continua sendo, a maior e melhor alegria que aconteceu em meu viver.