Sara
Se cada ser humano inventasse de contar seus infortúnios, de qualquer natureza, todas as pessoas teriam uma aparato a mais para desenvolver a aprendizagem sobre as relações pessoais e sociais. Talvez voltássemos aos tempos mágicos que viveram os mais belos escritores, caso esses contos fossem escritos. E encerrando essa reflexão, não seríamos massacrados com ideias mentirosas pregadas pelas novelas, e desse modo as pessoas voltaria ao antigo ato de ler.
Sim, mas deixa-me contar o que aconteceu desta feita. Lembram-se do causo da Cámile? Lembram-se de meu infortúnio? Pois é, dessa vez eu paguei o pato por aquele caso e com juros e correções, falando na linguagem dos economistas. Quem apanhou fui eu, e uma bela surra. Bem feito!!!
E não demorou muito, foi na mesma época que àquele caso. Neste tempo, existia por ali uma bela moça também debutante, como a Cámile, chamada Sara. Linda também, só que não apresentava as outras características da Cámile. O engraçado é que a bela Sara estava sendo muito paquerada pelos “pequenos” garanhões de sua idade. Mas parece que faltava coragem para esses moços conquistarem aquela fada benfazeja.
Eu também comecei a observá-la com mais frequência. Olhava-lhe com muita atenção. Perscrutava seu semblante, suas ações, mas nada mais que isso. Não tomei iniciativa de conhecê-la melhor, pois, apesar de bela, eu a achava muito nova ainda. Só não contava que ela também fazia as mesmas observações acerca de minha pessoa. E com mais ousadia, vivia suspirando pelos cantos.
Chegou a arrumar um namorado com que ficou um bom tempo. Diziam até que noivaram e iam casarem-se logo, logo. Terminaram o romance, não sei por que.
O fato é que de vez em quando alguém chegava para mim com uma conversa meio atravessada dizendo que a bela Sara tinha dito isso ou aquilo de mim. Eu às vezes duvidava do que eles diziam, às vezes dava crédito. Mas sempre desconfiado da situação. Alguém um dia chegou a me contar que ela havia sussurrado em minha homenagem dizendo “ai seu eu pego aquele nego”.
Outra pessoa disse-me que ela havia comentado que seu sonho era namorar comigo. Enquanto as informações vinham de outras pessoas não ligava para o caso. Como disse, não dava crédito. Mesmo assim comecei a observar a situação e fui notando algo interessante. Comecei gastar mais a atenção com a maneira que a jovem me olhava. Estudar seus comportamentos em minha presença.
Certa vez, enquanto viajava de ônibus para cumprir meu diário escolar, observei o momento em que a jovem Sara entrou e sentou em uma cadeira. Estava acompanhada de sua irmã. Eu a saldei com um gesto de cortesia e recebi o mesmo como volta. Foi nesse instante que fiquei perscrutando as duas, olhando de soslaio em busca de algo suspeito. Percebi que Sara comentava sobre mim. Eu ainda ouvi uma coisa do tipo “maninha é esse menino aí que eu...”. Cortou a frase nesse instante porque percebeu que eu observava.
Noutra vez, a jovem serelepe resolveu visitar as paragens onde esse enfadado matuto gastava a vida. Fora visitar parentes seus e desconfio se não estava com suas segundas intenções. À tarde daquele dia, enquanto eu tirava uma sesta para descansar dos açoites de minhas lutas do dia anterior - que incluía o trabalho pesado na agricultura durante o dia e um esforço mental sobre-humano durante a noite para estudar na cidade vizinha – Sara resolveu dar uma rápida passada em minha casa. Só que eu estava dormindo. Mas ouvi quando disse de forma ousada “aquele Nego gostoso tá aí? Diz a ele que se eu pegá-lo...”. Eu ouvi tudo e quando um dos meus manos lhe avisara de minha presença por ali, ela ficou receosa. Saí de meu quarto e fui contemplar a jovem, mas ela fugiu.
A partir daí eu dei créditos a tudo que diziam sobre esse caso. Pesei os prós e contras de uma investidura neste romance e quando dei fé de mim, estava bem envolvido. Resolvi conhecer melhor aquela debutante. Como não poderia ser diferente, ela negara tudo e dissera que o interesse parecia ser o meu e não dela. Compreendi na hora o recado. Toda mulher quer ser conquistada, desejada, procurada. Então aproveitei e cortei o queijo bem direitinho dizendo a jovem que antes não, mas agora estava com interesse nela. E com muita vontade!
Conversas rolaram. Àquelas coisas interessantes que rolam nesses momentos. Então combinamos de “ficar”. Essa palavra entre aspas foi uma das piores desgraças que me aconteceram por esses tempos.
A oportunidade para esse caso seria uma bela festa que acontecia na cidade, não lembro de que. Eu descrevi noutro conto que nessas horas (festas) eu costumara beber muito. Ficar embriagado. Neste dia foi diferente. Não tomara nada mais quem uma cerveja, e fui ao encontro da jovem. Ela estava estranha e parecia que nem me conhecia. Mesmo assim começamos a “ficar”. Uma noite bem agradável para esse amante que vos relata. Huumm... Gostei demais! Beijei à vontade e me esbaldei na jovem. Ela fazia o mesmo. Passou-se... Fiquei apaixonado.
Na noite seguinte fui ao encontro da moça novamente e tive uma surpresa bem desagradável: ela não queria mais saber de mim garantindo que aquilo teria sido só um “fica”. Que frustração! “Caí em uma armadilha”, pensei comigo. Esse negócio de ficar não é para homem como eu. Para um matuto amante. A jovem ainda disse que não queria “ficar com ninguém àquela noite”. Deixei-a. Fui procurar uns consolos e “curtir” a festa. Esta já estava estragada para mim e garantida em minha memória por um bom tempo.
No final da festa eu vi a Sara passando toda sorridente, em minha frente, com outro cara. Estava “ficando” novamente. Dei um sorriso sarcástico e deixei-a novamente.
Eu fiquei com a moça por um bom tempo na memória, mas a fiz desaparecer dos pensamentos. Aquilo foi uma enganação total, mas necessário para um jovem ainda iniciante nesses infortúnios. Eu ainda acho que nesse campo das relações humanas é melhor morrer infortunado, do que padecer no “quase” como acontecia comigo.
Foi assim que eu paguei os maus tratos que fiz com outra pessoa, outrora. Daquele dia em diante, pictóricos leitores, esse desafortunado herói que vos dirige a palavra nunca mais quis saber de “ficar”.