Uma coisa chamada amor
Eu sempre achei que, quando me apaixonasse, seria como Camões falou: uma rede de paradoxos. Aquele papo de "Amor é fogo que arde sem se ver" etc. Mas estava errado. É mil vezes pior. Ou melhor, dependendo do ponto de vista.
Estar apaixonado é uma coisa muito maluca. É uma montanha-russa de sentimentos: ela sobe os trilhos quando estou feliz (praticamente, quando a vejo) e desce quando estou triste (quando não a vejo). Tudo fica mais intenso, as inseguranças sobrepujam os doces momentos em que observamos a pessoa amada (será que ela está percebendo, e se sim, será que gosta?), principalmente quando o amor é platônico, como no meu caso.
Eu, como qualquer adolescente de 17 anos, nunca sequer imaginei que ficaria vidrado em alguém. Curtia minha vida, saía com os amigos e com garotas... Coisas desse tipo. Quando via um garoto apaixonado, eu ria da cara de otário dele. Não que eu tivesse algo contra o amor. O que me deixava ressabiado era o que ele fazia com a gente. Quer dizer, qual é? Como uma coisa aparentemente boa nos fazia sofrer tanto? Naquela época, não entendia. Agora estou vivendo isso.
Neste momento, estou escrevendo um poema. Também achava isso bastante idiota. Mas ultimamente tenho pensado muito nela e escrever sobre o que sinto é como guardar o meu amor, entende? Torná-lo eterno. O objeto dos meus pensamentos está lá embaixo, na sala. Ela é a melhor amiga da minha irmã. Estranho eu ter me apaixonado logo por ela, pois a via todos os dias e nunca tinha sentido nada. Mas tudo mudou. Eu gosto de pensar que o meu amor chegou atrasado, que ele estava sempre comigo, só esperando o momento certo.
Patético, sei. Mas é a única explicação que posso dar. Como é que se diz mesmo? Ah, sim: "O amor tem razões que a própria razão desconhece."
Agora vem a cartada final: se eu esbarro com ela quase todos os dias, por que não me declaro? Bem, por muitos motivos. Acho que o principal é o medo de ser rejeitado. Não por eu ser feio ou chato, mas porque ela me conhece há muito tempo, e pode me ver só como amigo. Porém, se meus sentimentos mudaram, os dela também podem, certo?
Essa dúvida me corrói, e sempre quando chego perto de indagá-la, minha velha amiga, a insegurança, vem me visitar e no fim das contas não pergunto nada.
Mas hoje essa dúvida está mais forte e meu coração parece um carro em alta velocidade. Dor. Deviam criar um manual para os apaixonados novatos, ou um curso que nos preparasse antes de entrarmos neste mundo confuso e estranho.
Paro de escrever e me dou um ultimato: Você vai lá embaixo e vai se declarar. Não amanhã. Não semana que vem. Neste instante.
Minha confiança se eleva. Saio do quarto e desço as escadas, em direção a sala. Quando lá chego, vejo-a sentada, esperando minha irmã, que certamente está se arrumando para elas saírem. Hoje é meu dia de sorte, pois minha maninha demora mais de meia hora para esconder a cara em quilos de maquiagem. Nem sempre funcionava.
Estou nervoso, o que não é novidade, e falo oi. Ela sorri, linda e simpática como sempre. Devo ter ficado encarando-a por muito tempo, porque ela para de sorrir e pergunta se está tudo bem.
Vai, vai, vai, fala logo!!
E como nos dias anteriores, meu entusiasmo inicial murcha. Desvio o olhar, dizendo que estou bem e fujo da sala.
Espera aí, você vai desistir de novo?
Esse pensamento me atinge, e eu sei a resposta: não, não vou desistir. Os meus pés, que já alcançavam a escadaria, retornam para a sala.
Começo o meu discurso, já na ponta da língua, e dou vazão a tudo que guardava no peito. Falo o quanto ela é maravilhosa e especial, terminando minha declaração brega com as três palavrinhas essenciais: EU TE AMO.
Ela me olha estupefata e quando abria a boca para falar, minha irmã chega, parecendo o Bozo, e a puxa para a porta da saída. Antes de sair minha amada me fita por sobre os ombros e sorri. Não aquele sorrisinho sem graça, mas um que mostra todos os dentes. Um sorriso cheio de promessas...