A DESPEDIDA (E-Relíquias de uma vida)
RELÍQUIAS DE UMA VIDA - CAP V
A DESPEDIDA
A Mel, já veio com o seu coração prometido para alguém da sua cidade...e aí, o Tom apareceu...e agora, o que fazer?? O seu coração batia por ele de um jeito diferente...de um jeito que nunca houvera vivido...isso às vezes a assustava um pouco. Em certos momentos, ela se via diante de um conflito, era os seus sentimentos se chocando...Mas ela, era uma menina que não admitia que a emoção suplantasse a razão e por assim ser, logo espantava o sentimento do Tom em detrimento de ficar com o outro, o prometido, o da razão...era mais garantido.
Toda vez que isso acontecia, ela esfriava um pouco com ele...procurava afastar da sua companhia, como se fosse uma defesa, mas no fundo ela não queria que ele ficasse longe e sentir que ele gostava dela também, fazia muito bem para sua alma, para o seu coração.
E assim, a vida seguia seu curso normal. O convívio dos dois agora ficou muito mais estreitado, voltaram como antes, a irem à missa durante à semana sempre que podiam ou mesmo aos domingos.
Nos finais de semana o Fred sempre ia para sua cidade e o Tom ficava sozinho. Então a Mel quando precisava estudar mais intensivamente, aproveitava e ficava lá estudando com ele, usando a mesa do Fred, pois tinha melhores acomodações, principalmente quanto a iluminação.
O quartinho dela tinha a janela virada para o lado por onde o Tom passava em direção ao seu cantinho, fato esse que fazia ele sentir lá no fundinho da sua alma, uma dose de carinho, de ternura, toda vez que olhava pra janela, era um sentimento inexplicável, algo muito grandioso, sublime.
Certa vez a dona Iolanda disse assim: ô Tom, a Mel tem tanta confiança em você, que ela disse que você é capaz de dormir na porta do quarto dela, se preciso for. E era bem isso, ele seria capaz disso e muito mais.
Eles eram muito estudiosos, sempre que possível, ele ia “puxando” disciplinas dos períodos seguintes e assim, adiantando algumas matérias e se tudo corresse bem, seria possível até formar em menos tempo que o previsto.
Logo vieram as férias e cada qual foi para suas cidades, e como das vezes anteriores, se comunicavam por cartas, o meio mais comum da época.
Ele aproveitava para fazer estágios e assim, aprimorar seus conhecimentos e também, manter sua mente ocupada porque a saudade lhe torturava demais.
Ela por sua vez, procurava aproveitar o máximo da suas férias, sentia falta do dele, do seu convívio, mas não deixava transparecer tanto. Nos escritos para o Tom, tinha o cuidado de limitar suas emoções e não ser tão transparente.
Tudo indicava que aquela seria as últimas férias dele, já que havia “puxado” várias disciplinas. Mas ele estava num dilema: queria se ver logo com o “canudo” nas mãos, mas iria se privar do convívio com a Mel em um semestre. Só o fato de pensar que iria se separar dela já ficava triste.
Ele precisaria tomar uma decisão, pois se optasse por forma antecipadamente, teria que matricular em todas as disciplinas. Tinha uma outra coisa que pensava muito, era de que, evitaria as despesas, tanto de custeio quanto de faculdade em meio semestre, etc.
Voltou das férias sem tomar a tal decisão, estava divido entre a razão e a emoção...
Chegou até mesmo a iniciar o curso com menos disciplinas e fazendo estágio numa empresa de terraplenagem numa cidade próxima, mas algo relevante o fez decidir pela conclusão do curso: ao pensar que a Mel também concluiria seu curso no final do ano, como normalmente seria o dele e que, dificilmente ele poderia compartilhar da formatura dela, talvez tivesse que ficar de longe, sem nem mesmo poder lhe dar um abraço, isso iria doer muito...melhor então evitar essa dor...
E assim, voltou a concentrar nos seus estudos. Algo agora começava a atormentá-lo, era a certeza iminente da separação... Teria pouco mais de 5 meses para desfrutar da companhia dela...e como seria o depois???como seria não tê-la mais por perto...ou não vê-la nunca mais...Só de imaginar, já sentia um dor imensa no seu coração...
Bem, com a decisão tomada, o ele não tinha alternativa a não ser estudar com afinco para concluir os estudos.
Por um lado ele queria que os dias passassem mais rápido para se ver logo formado, por outro, ele queria que os dias demorassem mais, para assim, poder ficar um pouco mais ao lado dela...
A Mel no quesito das coisas do coração era bem diferente do Tom, ela procurava sempre espantar os pensamentos quando eles insistiam muito em fazer morada e por assim ser, apesar de também já pensar em como seria o depois, não deixava esses pensamentos ficarem muito presentes. Ela não podia alimentar para si alguma esperança quanto ao Tom, pois tinha alguém já à sua espera.
Apesar de saber que o Tom iria se formar no meio daquele ano, a ficha não lhe havia caído de que, no próximo semestre ela não teria mais a companhia dele ali.
Os dois seguiam estudando cada vez mais, que mal se encontravam e não tinham tempo para ficar batendo papo, jogando conversa fora. Ela não queria pegar prova final e ele precisa se formar.
Assim, naquele semestre os dias pareciam passar mais rapidamente, estavam chegando ao final do semestre, chegando a hora da despedida...
A Mel ainda voltaria mais um semestre, o Tom iria embora de vez. Assim que recebesse o resultado das provas, se não pegasse prova final ela iria logo embora e a formatura dele aconteceria no meio do mês seguinte.
O dia da despedida estava aproximando...No coração do Tom a dor já se fazia presente...ele não sabia como iria ser...era tanta coisa pra dizer pra ela...tanta coisa...que talvez não teria coragem nem oportunidade para faze-lo. Resolveu que escreveria uma carta e assim, começou a redigir tentando colocar um pouco daquilo que estava no seu coração, na sua alma.
Numa sexta-feira a Mel foi buscar o resultado das provas e voltou arrasada, chateada, porque pegou prova final em uma matéria. Estava programada para ir embora no sábado, agora teria que ser só depois da prova na semana seguinte.
O Tom ficou triste por ela, mas ao mesmo tempo, feliz por ter a companhia dela por mais alguns dias.
E os dias seguiram....
Bem, agora não tinha mais jeito, no dia seguinte seria a despedida... Já era madrugada... O Tom ali no seu quartinho sozinho, sentado na sua mesinha de estudo, tentava concluir os últimos escritos que completaria sua carta de despedida. As lágrimas incontidas, banhavam seu rosto...molhando o papel...no seu coração uma dor...que parecia que iria sangrar...
Ele virava, olhando de lado para a mesinha onde tantas vezes ela esteve ali, sentada estudando com ele...agora, não mais estaria por perto...
Não aguentou...um nó fechou sua garganta e ele desabou a chorar...chorar...ah se ele pudesse segura-la ali...ah se ele pudesse "aprisioná-la" perto dele...
Que dor mais doída ele estava sentindo...foi a primeira vez que uma mulher o fez chorar...as lágrimas teimavam em jorrar...os teus olhos mais pareciam uma mina...
Teve que reescrever várias vezes àquela página, pois suas lágrimas deixaram a folha toda úmida. Quando terminou de escrever já era madrugada a dentro.
Bem, era chegada a hora da partida da Mel...
Ele sem demonstrar a sua dor, comportava como sempre o fazia quando ela ia pra casa, sempre alegre e cortês.
Ela, eufórica para chegar em casa e curtir suas férias também se comportava como das outras vezes, como se àquilo fosse um até logo, se veriam em breve.
Pegaram então a bagagem e seguiram para o ponto do ônibus.
O ônibus não demorou muito a chegar. Ele se encarregou de colocar as bolsas no bagageiro, verificando se estas ficaram bem agasalhadas.
Não tiveram muito tempo mais, era chegada a hora da despedida...Mas nada de abraços, de choros, ou outra coisa assim, apenas um aperto de mão...entre eles era assim...sempre foi assim...Cada um zelava daquele sentimento do seu jeito.
Nesse momento, o tom tira a carta que trazia no bolso e entrega a ela.
É pra você abrir na estrada – Disse ele.
Ta bom – respondeu ela e entrou no ônibus...antes de vencer a portinhola, ainda com a carta na mão, parou e olhou para trás e deu um tchau com a outra mão...
O Tom correspondeu e ficou ali parado...com os olhos cheios de lágrimas... ficou a olhar o ônibus descer a avenida, contornar o trevo e sumir na curva da estrada...Não resistiu tanta dor e as lágrimas voltaram novamente...as pessoas na rua ficaram olhando pra ele, talvez sem entender ou talvez quem presenciou sempre eles ali, tinham entendido...A dor era imensa...imensa...
Logo que a Mel entrou, o ônibus deu partida por isso quando ela conseguiu se acomodar direito, Paraíso já havia ficado para trás e ela não cabia de curiosidade para abri aquela carta.
Com cuidado foi logo abrindo o envelope para não rasgar as folhas, já que o mesmo parecia abarrotado delas.
À medida em que seus olhos iam correndo as linhas dos escritos, seu coração começava a bater em descompasso...algo dentro dela se manifestara de um jeito como nunca havia feito antes, rompendo assim, os limites, as regras, as fronteiras, os dogmas impostos pela vida. Ali naquela poltrona daquele ônibus ela pode ser pela primeira vez “ela mesma” e deixou que o sentimento que tanto tentou esconder lhe viesse à tona...Só agora começava a tomar consciência de quem ela estava deixando para trás...só agora, estava caindo a ficha de que àquela não foi mais um até logo e sim, uma despedida, um adeus...
E mesmo sendo durona, não conseguiu segurar...e um nó se fez na sua garganta...releu muitas vezes e em todas elas as emoções, as lembranças lhe vieram de todos os lados...Só agora tomou consciência do tamanho do seu bem querer por àquele menino...
Se pudesse, voltaria o ônibus e lhe daria um abraço de despedida...lhe dizia um monte de coisa que ora tomava conta da sua alma...a saudade já se fazia presente...E ficava a perguntar: porque a vida tinha que ser assim? porque existiam as despedidas??porque???
Quanta pureza, quanta nobreza, quanto sentimento existiam ali naqueles escritos.
Voltava e relia agora os trechos que mais lhe chamaram atenção e dentre muitos estavam àqueles:
“Oi Mel...
Está chegando a hora da despedida..são tantas coisas pra te dizer que na hora não saberei como falar, então achei melhor ir colocando no papel...”
“...nesse momento sinto um nó tampar minha garganta...as lágrimas insistem em molhar o meu rosto...está muito doído...desculpa, estou chorando...”
“...sei que você ficou aborrecida, chateada porque pegou prova final, né?mas isso foi um jeito que Deus encontrou para que eu pudesse ter a sua companhia um pouco mais...”
Como ela não havia pensado nisso é bem possível que fosse isso mesmo.
Ainda estava a caminho da sua cidade e a alegria das férias já havia dado lugar a uma saudade...o seu coração estava também muito triste, a dor da saudade do seu amigo já apertava o coração.