No segredo do escuro
O dia lindo de sol se entregou ao cansaço e fechou os olhos levando a luz embora, o sono do dia trouxe a escuridão e os segredos traiçoeiros da noite.
Esta escuridão feroz pegou uma garota sozinha e desprevenida na sala de uma casa de campo abandonada no meio de uma plantação de abóboras. Com a falta de iluminação elétrica na casa a garota acendeu algumas velas e começou a saborear o gosto amargo do medo num estado de aflição e insegurança.
Os raios de luz lançados pelas velas eram fracos sendo facilmente abraçados e devorados pela escuridão. O contraste de efeitos visuais oferecia um foco certeiro para os amantes das sombras, onde estava ele à espera de uma boa oportunidade para se aproximar dela.
A noite estava silenciosa e estrelada amenizando um pouco a obscuridade do local, porém as luzes das velas levavam a uma sensação de maior escuridão externa e essa agonia torturava atormentando sua calma.
No meio de tanta escuridão surgiu uma luz na cabeça de abóbora de um espantalho no meio da plantação. Nesse momento de tensão, além do estado desesperador de medo também surgiu a insegurança, pois havia mais alguém camuflado naquele negrume da noite.
Ela se aproximou da janela e fixou seu olhar nos olhos vermelhos do espantalho que piscavam na escuridão para chamar a sua atenção. A insegurança do medo se perdeu na curiosidade. Como poderia um espantalho piscar se ele não tem vida? Porém os olhos vermelhos do espantalho continuavam piscando, então para acabar com as dúvidas ela resolveu adentrar nos segredos escuros da plantação de abóboras e descobrir o mistério dos olhos do espantalho.
O movimento da chave abrindo a porta arrepiou sua pele trazendo um calafrio repentino que caminhou pelo seu corpo desagasalhado, essa sensação de calafrio fez seus olhos arregalarem de medo. Para amenizar o frio do medo ela vestiu seu casaco vermelho que estava sobre a mesa e caminhou lentamente para os braços e abraço frio da escuridão, deixando para trás o abraço quente da segurança da luz.
O caminhar atento entre as moitas de vegetação seca era atento, mas nem o pisar leve sobre os gravetos secos evitavam que eles se quebrassem e estalassem condenando sua intenção de passar despercebida indicando sua atual posição entre as moitas.
Caminhando com cautela ela chegou próxima ao espantalho e ficou admirando com atenção os detalhes da cabeça de abóbora, que parecia estar feliz no meio de tantas abóboras, mas com certeza quem acendera aquela vela ainda estava por perto, por isso era melhor ficar esperta para não ser surpreendida.
A garota de casaco vermelho se aproximou do espantalho e observou as luzes das velas clareando as janelas da casa, então resolveu piscar os olhos do espantalho cabeça de abóbora também e no momento em que estava piscando os olhos dele com os movimentos das mãos, assinalando sua posição no escuro ela percebeu as luzes das velas da casa apagarem, sendo engolidas pelo apetite da noite faminta.
O momento era de tensão, então ela olhou para todos os lados procurando se defender e escutou gravetos secos sendo quebrados por alguém que se aproximava lentamente. O barulho estava cada vez mais perto.
Ela faz silêncio tentando localizar de onde vinham as passadas, porém o silêncio tomou conta do lugar deixando-a apreensiva e isso a faz caminhar cautelosamente para trás. Ao encostar-se a uma moita seca foi abraçada por trás, sentindo a respiração de um lobo pertinho dos seus ouvidos, então ela perguntou:
- Para que essas garras tão afiadas?
- São para te abraçar.
- Para que essa boca sedenta?
- Ela está sedenta pelos seus beijos.
- Por que seu coração está batendo tão forte?
- Ele bate forte de amor por você.
A garota virou lentamente reconhecendo o lobo mau e falou:
- Você se lembra de mim lobo? Eu cresci e voltei para matar a saudade das suas garras fortes.
O silêncio da escuridão terminou com o estalar de gravetos secos quebrando entre as moitas. O dia acordou abrindo seus olhos e trazendo a luz. Ao abrir os olhos o dia encontrou o lobo solitário, que foi cassado e dominado pela garota de casaco vermelho.
O lobo olhou para a estrada da vida entre as plantações de amor e dominado pelo coração caminhou atrás da garota de casaco vermelho.
Caminhou no sol quente, na noite gelada, na chuva forte, nas manhãs de inverno, no sonho, porém a distância que os separavam era longa, não havia como se aproximar dela, então a fera se perdeu no caminho e no tempo derrotado pela garota, que carregava uma poção altamente venenosa chamada amor, que o atingiu profundamente o coração, matando-o aos poucos, pois o único antídoto capaz de curar essa dor insuportável no coração era o amor, que ela levou embora para sempre.
Paulo Ribeiro de Alvarenga
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