Triângulo cooperativo

Letícia trabalhava numa locadora de vídeo que possuía também acesso a internet. Ganhava pouco e seu namorado Raul estava desempregado e trancara a faculdade. Precisava procurar trabalho e nem tinha mais como bancar a despesa. Os dois moravam separados, pois não tinham condições para mobiliar ou alugar um apartamento. Ela dividia um pequeno cômodo com sua amiga Francine. Sonhava com o dia em que conseguisse morar com Raul e assim começar uma família. Rogério era um homem de seus quase 60 anos, mas ainda forte e saudável. Já estava aposentado, mas possuía umas aplicações financeiras e para matar o tempo, trabalhava como gerente financeiro em meio turno na empresa de um amigo. Era freguês da locadora há bastante tempo e um bom papo, gostava de conversar sobre cinema e às vezes ficava um longo tempo conversando com a proprietária ou com a Letícia. Naquela tarde de sábado, não havia ninguém na loja e Rogério selecionava uns vídeos para o fim de semana. Letícia puxou conversa enquanto anotava os filmes que Rogério escolhera. Rogério como de hábito aceitou a deixa e conversavam sobre vários assuntos. Em determinado momento, veio a tona sua situação com o namorado. Desabafou com Rogério, que ouvia atentamente. Ela ansiava por poder montar um apartamento onde pudesse morar com Raul, mas as condições financeiras do casal simplesmente não permitiam. Ganhava pouco na locadora e tinha ainda a parte do aluguel do cômodo que dividia com a amiga. Rogério viu ali uma chance. Porque não arriscar? Letícia era uma garota encantadora, jovem, bonita e com um corpo perfeito. Muitas vezes, puxava conversa só para ficar próximo dela e estendia o papo até que algum cliente viesse a roubar a atenção da moça. Apesar de seus 59 anos, Rogério sentia-se ainda em plena forma e com plena capacidade sexual. Sentia falta de uma companheira, mas, até o momento não conseguira nada. Não que não houvesse pretendentes, mas, nenhuma se enquadrava em suas exigências. Então de repente criou coragem e resolveu propor o que tinha em mente.

– Está bem, tenho uma proposta para você pensar. Monto um apartamento mobiliado, pago a faculdade do teu namorado e a despesa de vocês dois, com uma condição. Letícia ouvia atentamente e não estava entendendo onde Rogério queria chegar. - Qual condição?

- Duas vezes por semana, você fica comigo. Letícia engoliu em seco e não sabia o que dizer.

– Não se preocupe você tem o tempo que quiser para pensar. Este é o meu cartão. Quando resolver, me telefone. Rogério despediu-se e Letícia ficou a pensar. Tudo bem, até que o velho era ainda um homem muito atraente, culto, educado e com uma conta bancária nada desprezível. Mas daí a querer que ela aceitasse tal proposta, havia uma distância muito grande. Trabalhava na praia de Ingleses e precisava tomar dois ônibus para chegar ao centro de Florianópolis, onde morava com Francine. Durante o trajeto a conversa com o velho persistia embora ela tentasse desviar o pensamento. Chegou em casa e Francine já havia preparado um lanche. Jogou a bolsa sobre o sofá e sentou-se pedindo a amiga, - Senta aqui, preciso te contar uma coisa. A amiga sentou-se e ouviu atentamente a história que Letícia contava, sem deixar dúvidas de que estava bastante confusa com a proposta do velho. – Eu aceitaria, falou a amiga. Vai depender do Raul, se fosse comigo eu topava. Naquela noite Letícia não dormiu. Rolava na cama, levantava, deitava e não conseguia tirar o assunto da cabeça por mais que tentasse. Tinha dúvidas. Deveria falar com o Raul a respeito? O dia amanheceu e ela mal tinha conseguido uns cochilos sobressaltados. Raul chegou as 15 h, bastante abatido e desanimado. Nenhum dos currículos que enviara surtira efeito e passara a semana batendo de porta em porta sem nenhum resultado. Deitaram-se sobre a cama de Letícia e conversavam sobre a situação. Então Letícia resolveu falar sobre o assunto. Contou ao Raul o que havia acontecido. Ele ficou em silêncio durante um tempo e depois falou,

- De maneira nenhuma, dividir você com outro cara? Nem pensar.

- Raul, eu te amo e não vejo a hora da gente morar junto, criar uma família. Sei que pra você é difícil, mas como vamos conseguir? Tua faculdade está ameaçada. Não consegues trabalho, O que eu ganho não dá pra nada. Raul sentou-se na cama olhou para Letícia, contrariado, - Você acha que nós devemos aceitar?

- Não sei, não posso te pedir isso, mas, que outro jeito tem? Raul ficou em silêncio, pensativo.

- Você tem um cigarro?

– Sim guardei uns pra você. Raul sentou-se na lateral da cama e fumava quase sem tomar fôlego.

– Puxa, até pra fumar, estou dependendo de você. Se a gente aceitasse, poderia completar meus estudos, arrumar um bom emprego e depois eu poderia pagar o velho e acabar com esta história. Ficaram ainda um bom tempo discutindo a situação. Depois de uma longa discussão sobre os prós e contras, chegaram a um acordo. Ele aceitava, com a condição de reembolsar o velho e recupera-la de volta só para si. Assim então foi feito. O velho cumpriu o prometido e duas vezes por semana, Letícia passava a noite com o ele. Raul empenhava-se nos estudos e ia em franco progresso. O velho era experiente, carinhoso e muito bom de cama. O tempo foi passando e Letícia já contava as horas para ficar com ele. O inevitável aconteceu. Letícia apaixonou-se por Rogério e contou para o Raul, que ficou desolado, mas, aceitou a situação. O que poderia fazer? Quando aceitou aquela situação, sabia que haveria este risco. Despediram-se, continuaram amigos, mas o romance entre os dois chegara ao fim. O tempo continuou sua marcha e aos poucos a situação começava a mudar. As economias do velho começaram a minguar. A empresa do amigo falira e as aplicações não estavam rendendo o que deveriam. Finalmente dependendo só da aposentadoria a situação estava bastante difícil. Raul terminara a faculdade, fizera pós-graduação e conseguira um alto cargo numa empresa de telefonia, com um belo salário. Vendo que a situação piorava a cada dia, Letícia resolveu procura-lo e expor o que estava acontecendo. Raul ainda a amava tanto que nem pensara em procurar outra mulher. – Ok, eu ajudo vocês, com uma condição. Duas vezes por semana você fica comigo. Claro que o velho concordou afinal a idéia partira dele mesmo. E assim foi feito, Raul cumpria a parte dele no trato e a tinha novamente pelo menos duas vezes por semana. Um exemplo de cooperativismo? Apenas um jogo? Ou a única saída?

Lauro Winck
Enviado por Lauro Winck em 14/04/2010
Código do texto: T2196477
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