Lembranças que a vida traz - Cap. IV

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Estranhamente, encontra em seu olhar uma alegria diferente, já não era mais o mesmo amigo de antes de sua partida, a mudança nele era perceptível. Ela sempre soube do interesse dele por ela, mas nunca, em momento algum, ele tocara no assunto. Sempre respeitara seu silêncio e sabia que ele deveria estar em constante tumultuo interno em sua presença.

Abraça-a com tanto carinho, senta-se a seu lado, conversam sobre os “velhos tempos”, brincadeiras, passeios naquele rio logo abaixo do morro, os passeios a cavalo pela estrada da fazenda, e o mais importante dos momentos juntos, a música lenta que ele lhe ensinou a dançar. A garota ainda tímida, não sabia dançar então sempre se sentava em uma mesa no canto do salão para que ninguém a notasse ali. Mas a bondade dele, sempre presente, não a deixara assim por muito tempo. Fora ele quem lhe ensinara a dançar, a sentir a liberdade e movimento do corpo e da mente, e quando estavam assim, não sabia diferenciar se os dois faziam parte da música ou se a própria fazia parte deles. A música? Já nem lembravam mais. Foram tantas que fizeram parte daqueles momentos, que perderia sentido citá-las.

Tudo isso também fazia parte da história dele e era lembrado com muito carinho por ambos. Mas a única coisa que os distanciara era o amor pelo outro rapaz. Ele jamais aceitara este sentimento, não concordara com esse amor e nunca negara isso a ninguém. Já havia feito tudo para separá-los, mas o amor era mais forte, e nem por isso, ela deixou de ser sua amiga.

Reencontrá-lo depois de tantos anos longe dali, faz com que as recordações sejam ainda mais fortes, ele percebia isto em seu olhar. Rindo, diz que vai deixá-la para sonhar acordada, depois voltariam a se encontrar, antes que ela decidisse partir novamente.

Sorri, beija-a na face e sai sem olhar para trás. Será que ele vira em seu coração o que sentia? Será que realmente poderia ler em seus olhos o que sempre tentara esconder? Não, talvez não fosse possível isso. Apenas coincidência.

Volta a viajar nos pensamentos distantes. Depois daquele beijo em sua casa, mal ela conseguiu esperar que a noite chegasse, e com ela, seu amado eterno. Sim, ele voltou para conversar sobre o que acontecera na tarde. A ansiedade era imensa, poucas palavras, muitos beijos, este amor recém descoberto tinha tudo para dar certo. Se não fosse sua mudança em breve, tudo seria perfeito. Ela corria o risco de prender seu coração e depois sofrer com a ausência, mas algo que nunca a assustara era ao fato de amar à distância. Será que ele também iria querer isso? Seria capaz de amar assim? Não tinha outra saída, seria franca com ele e depois veria o que poderia acontecer.

Iria viver este momento, cada segundo dele, para que mais tarde não se arrependesse de ter tentado. Só de pensar no que sentia quando ele chegava perto dela, seu coração faltava saltar do peito, ficava sem ar e o corpo estremecia. Como pudera amar alguém assim? Tão repentinamente, não tivera tempo para raciocinar, as coisas simplesmente iam acontecendo, e ela, se deixando levar pelo coração.

Cada minuto junto a ele parecia não acabar nunca, tanto assunto, tanto sentimento e afinidade, sentia que ela havia esperado por ele a vida inteira. Como era bom amar assim! E o melhor era que se sentia amada da mesma forma.

Seus pensamentos teimavam em não deixá-la esquecer da mudança, em breve iriam ter que se despedir. O que fazer para mudar isto? Ela tinha que pensar em algo. Não queria perdê-lo, demorou tanto para encontrá-lo. Tinha que ser deste jeito?

Sua vida mudara desde aquele despertar, seus olhos brilhavam de maneira diferente agora, a alegria era indisfarçável, era bom demais sentir-se assim.

Um trovão ao longe a desperta deste sonho em forma de recordações. Vai chover muito, hora de levantar e ir embora para casa. O banco da praça vai sempre estar ali para quando ela desejar voltar.

Quem sabe amanhã? Sim, pode ser amanhã, ainda vai ficar mais alguns dias na cidade...

continua...