Roubo de Marcas ( Conclusão )

Continuação Conclusão...

Na manhã seguinte, após tomar um banho, Helena desceu vagarosamente para o andar de baixo da casa na intenção de sai sem ser percebida. Para sua surpresa, seu anfitrião a esperava na sala.

— Bom dia! Vejo que se levantou muito bem disposta. Dormiu bem, Helena?

— Bom-dia, Ernesto! Eu dormi como nunca. Acho que os ares da fazenda me fizeram muito bem. É mesmo uma pena não poder ficar para aproveitar um pouco mais.

— Vamos ao café? Você não imagina o que a Esmeralda faz na cozinha. Suas quitandas são famosas por aqui.

— Deu para notar pelo jantar de ontem. Ela é mesmo muito prendada.

A mesa estava repleta de frutas, café, chá, leite do dia fervido, queijo fresco, broa de massa de queijo e cuscuz. Era o prato principal do café da manhã de Ernesto D’lano. Ele fez questão que Helena provasse.

— Prove do meu predileto, Helena... Há os que não o aprovam, mas não sabem a energia que isso dá durante o dia. Se quiser, pode polvilhar açúcar e canela. Eu prefiro assim para poder sentir todo o sabor do milho.

— Deixa ver... Vou tentar ao natural primeiro. Hummmm! Não é ruim! Pelo contrário, tem um sabor de milho inigualável.

— Ora, ora, você é das minhas! Viu só Esmeralda? Imagine que você é a primeira mulher que gosta do meu cuscuz!

— Fico feliz! Não estou tentando agradá-lo, não! E passe-me logo outra porção. Hoje vou precisar de muita energia mesmo — disse Helena com certa dificuldade, pois comia e falava ao mesmo tempo. Ela cobriu a boca ao perceber que ele ria.

As despedidas foram calorosas, com promessas de que Helena voltasse para um fim de semana. Helena sentiu certo pesar em deixar a fazenda. Pensou que as negociações pudessem tomar rumos não muito amigáveis e gostaria de preservar a amizade de D’lano.

— Não se esqueça Helena, o convite está feito. Quando quiser vir é só ligar. Estarei à sua espera.

— Obrigada Ernesto. Foi muito bom conhecê-lo. Farei o possível para voltar. Prometo! Até outro dia, Esmeralda! Você também foi muito gentil!

Helena tomou a estrada com as indicações de D’lano. Não precisava retornar a Goiânia para fazer o percurso de volta a Uberaba. O dia em nada parecia com o anterior. O sol deu as honras de sua graça logo cedo, as gotas de chuva ainda brilhavam sob as folhas verdes. A manhã seguia ensolarada, iluminada e irradiava felicidade no ar, ou, talvez, fosse mesmo o espírito de Helena que parecia haver sido renovado com a estadia na Fazenda Santa Inês. Sem maiores intempéries chegou tranquilamente em casa às 14 horas.

A semana transcorria sem novidades. Um telefonema de Ernesto D’lano na quinta-feira mudou todo seu cronograma...

— Dra. Helena?

—Sim! Ela mesma.

— Olá Helena. É Ernesto. Como vai?

— Olá! Que surpresa boa! Eu vou bem! E você? Como tem passado! Alguma novidade no caso?

— Sim... Novidades! Estou ligando para avisar que saíram os resultados das análises, e como havíamos combinado, quero saber se poderá vir à Goiânia para comparecermos ao laboratório amanhã.

— Perfeitamente! Estávamos só aguardando! O Dr. José Maurício ficou impressionado com o que lhe contei sobre nossa conversa. Ele acha que você tem razão. Está ansioso pelo resultado. Acredito que ele deva ir pessoalmente para conferir.

— Isso quer dizer... Que você não vem?! — Helena notou certa dose de insatisfação no tom de voz dele. Fez-se displicente. Charme feminino, claro.

— Bem... Ernesto, nós somos uma equipe na assessoria jurídica... Talvez... É... Não seja exatamente eu... a designada — sentiu que sua voz a traia naquele momento.

— Helena — disse D’lano com certa ênfase —, eu gostaria muito se você continuasse a acompanhar o caso... Gostaria de vê-la novamente, entende! — ela sentiu algo “estranho” na voz dele. Intimamente seu ego foi às nuvens.

— Bem, Ernesto — fez uma breve pausa —, eu vou tentar acompanhar as negociações. Mas... é... como você sabe, tem advogados mais influentes do que eu na empresa... e... um deles pode querer tomar as rédeas.

— Pelo menos, tente, está bem! Estarei à sua espera. Assim que chegar, me procure, está bem?

— Está bem. Então, até amanhã — ele parecia que tinha certeza que daria um jeito de ir até lá.

— Até amanhã...

Na manhã seguinte, Helena e os dois sócios diretores da Agropec seguiram para Goiana. Fizeram uma viagem bem mais tranquila que a anterior. Em Goiânia, Helena liga para o Dr. D’lano. Dr. José Mauricio fez questão de conhecê-lo pessoalmente e expor suas indignações. Estava muito confiante de que sua empresa não se prestaria a tamanha falcatrua.

Dr. D’lano os aguardava. Seu corpo esguio e forte dentro de um terno cor de chumbo, uma camisa salmon com gravata do mesmo tom, dava-lhe uma elegância digna de ser apreciada.

Helena apresentou os donos da empresa:

— Boa-tarde, Dr. D’lano! — disse ela mantendo a formalidade — Estes são o Dr. José Maurício e Dr. Haroldo de Mendes, sócios diretores da Agropec.

— Boa tarde! — disse José Mauricio — Devo lhe dizer que o senhor tem me tirado o sono, mas tem lá suas razões. E, nós estamos tão interessados quanto o senhor em resolver esse episódio.

— Hoje vamos tirar isto a limpo. Será bom para todo mundo que tudo se esclareça — disse Ernesto D’lano polidamente.

Após as apresentações, seguiram para a sede do laboratório. Os envelopes lacrados com os resultados foram entregues a cada uma das partes. O clima esteve tenso. Por alguns segundos, cada lado da pendência lia avidamente os papéis. Os olhos iam e vinham do início ao fim da linha. Por fim, o Dr. José Mauricio gritou vitorioso?

— Eu sabia! Eu tinha plena certeza. Ah! Meu Deus, como eu tinha certeza!

Ernesto D’lano reconhece a vitória da Agropec.

— Está certo, Dr. José Mauricio, o senhor venceu esta parada! Agora, sou eu não estou entendendo mais nada! Acho que devo procurar a imprensa para desfazer a denúncia. Poderiam me orientar sobre como fazer isto?

Helena intervém na conversa.

— Calma gente! Nós já chegamos à conclusão que nos interessava. Não é a Agropec que está fraudando o consumidor. Alguém está usando o marketing da empresa, denegrindo nossa imagem e embolsando lucros de mercadoria pirata em cima da nossa marca.

Dr. Haroldo observava tudo vermelho de raiva, esbravejou:

— Você tem razão, Dra. Helena! Agora precisamos por a mão nesse canalha!

Helena insiste:

— Calma, calma! Não devemos nos precipitar agora. O Dr. D’lano não vai procurar a imprensa até que o comuniquemos e nós vamos procurar um serviço de inteligência para saber de onde estão partindo os produtos falsificados a partir do armazém que distribuiu esses lotes. Isto deve ser feito com todo atilamento! E antes que comprovemos, não devemos dar alarde. Só devemos anunciar quando estivermos munidos de todas as provas e aí chegaremos com a polícia e a imprensa para ter uma repercussão satisfatória em resposta àquilo que foi divulgado! O que vocês acham?

D’lano olhou para Helena, atônito. Depois disse, sorrindo:

— Nós somos três empresários “babacas” apanhando da diplomacia da Dra. Helena... Ela sozinha pensou por nós três. Bravo, Dra. Helena! Eu assino embaixo! — virou-se para o Dr. José Maurício e completou:

— Acho que lhes devo um pedido de desculpas! Por favor, queiram aceitar o convite para almoçar comigo? Pelo visto, não almoçaram ainda.

Dr. Haroldo, que já havia reclamado seu almoço, de pronto aceitou pelos três...

— Acho uma ótima idéia! — e riu — Então, vamos agora mesmo, pois temos que pegar a estrada de volta!

Dr. Ernesto D’lano os levou ao restaurante “Piquiras”, um dos melhores da cidade. O almoço — regado de abastados pratos das iguarias goianas e apreciados por todos — foi degustado em meio a muita conversa e planos. Após terminarem suas refeições, Haroldo e José Maurício foram dar uma volta no jardim de inverno, onde havia um imenso aquário.

Ernesto D’lano aproveitou a oportunidade de estar a sós com Helena, arrancou uma pétala de uma flor da decoração da mesa, leva-a lentamente aos lábios e a deixou cair no decote da blusa dela. Helena acompanhou aquele gesto mudo, pois dispensava qualquer explicação. Levantou os olhos. Os olhos de Ernesto D’lano tinham um brilho diferente e ele a olhava profundamente. Helena sentiu um frio a percorrer-lhe a espinha. Nunca, nunca havia sido olhada tão intensamente assim.

Ernesto D’lano deslizou as mãos lentamente por sobre a mesa... Tocou suavemente a mão de Helena. Com sua voz rouca e doce, sussurrou a ela:

— Helena... Eu pensei em você todos os dias. Fique aqui... Vamos passar o fim de semana na Fazenda Santa Inês, por favor! — Helena não soube o que dizer. Tentou uma desculpa.

— Mas... Eu não vim preparada para ficar, Ernesto — foi a única coisa que lhe veio em mente.

— Ah, não! Já ouvi isso da outra vez. Essa desculpa não vale mais, esta vencida... — e soltou um sorriso encantador.

Helena percebeu que os diretores retornavam à mesa. Retirou sua mão e cochichou:

— Mas o que é que eles vão pensar?...

— Você não acha que já está bem grandinha para ter que dar satisfação a outros?

A conversa é interrompida com a chegada dos dois empresários. Dr. José Mauricio puxou as formalidades da despedida:

— E então, Dra. Helena, vamos pegar a estrada de volta?

Helena pensou apenas alguns segundos. Ernesto D’lano a olhava fixamente. Então, ela respondeu decidida:

— Eu não vou voltar com vocês! — olhos dela e de Ernesto D’lano se cruzaram e faiscaram de felicidade — É... eu tenho alguns parentes aqui na capital... Vou aproveitar o fim de semana para visitá-los.

— Bem, então nós já vamos indo! Dr. D’lano, foi um prazer conhecê-lo! Não podemos dizer que morríamos de amores pelo senhor, mas agora com tudo esclarecido lhe oferecemos nossa amizade. O senhor ajudou-nos e muito a descobrir o que estava nos prejudicando realmente. Estaremos sempre à sua disposição para o que precisar e aguardando novas vendas para o seu negócio.

— Realmente foi um incidente o que nos aproximou, mas estarei disposto a prestar depoimentos a qualquer hora e é só me avisar. Por que não ficam para passar o fim de semana comigo na Fazenda Santa Inês? — perguntou, rezando para não aceitassem seu convite — Vocês certamente irão gostar de ver como andam os meus negócios.

— Certamente, nós agradecemos o convite. Mas ficará para uma outra ocasião Dr. D’lano. Temos mesmo que retornar a Uberaba. Até mais.

— Até mais ver, Dr. José Mauricio! Até mais, Dr. Haroldo! — disse Ernesto D’lano.

Helena despediu-se de seus chefes e pegou sua pequena bagagem. O carro dos diretores da Agropec desapareceu em meio à confusão do trânsito.

Ernesto D’lano, surpreso com a decisão de Helena, não escondia sua emoção. Seu olhar e seu largo sorriso eram de pura felicidade. Pegou as mãos dela e segura-as contra o peito. As palavras já não eram necessárias. Apenas, sussurra-lhe ao ouvido:

— Obrigado por ter ficado... Prometo que jamais irá se arrepender disso, minha querida!

— Eu... Eu também tenho certeza que não...

— Então, vamos? A Fazenda Santa Inês lhe aguarda. Estou precisando de uma rainha para comandar meu reino... — e a beijou loucamente ali mesmo, sem se importar onde estavam.

F I M

Observação: Remodelado com a valiosa colaboação do amigo Lucas Durand.

Maria Helena Camilo