Memórias do Circo
A minha infância, adolescência e juventude sempre tiveram uma relação muito íntima com o Circo. Já na fase adulta esta relação foi ficando menos intensa por várias razões de ordem natural. A consciência sobre o maltrato de animais é uma delas. Naquela ocasião os únicos animais que faziam parte do espetáculo eram Bois e Cavalos dos circos de rodeio e aquelelas pessoas da minha geração não tinham consciência do que aquilo representava.
Mas não é sobre isso que quero falar e sim de certos acontecimentos que trago na lembrança de minha maravilhosa relação com o circo.
Como não poderia deixar de ser, toda vez que chegava um circo um minha pequena cidade (Delfim Moreira), a euforia tomava conta da gente.
Lembro-me claramente de alguns deles, inclusive dos seus nomes:
Circo do Mirinho – Este de touradas que inclusive meu pai e outros fazendeiros da região cediam animais para serem toureados e montados. Os toureiros: Mirinho, Canário e Bolacha eram bastante conhecidos na cidade. Neste circo, eu, meus pais e irmãos tínhamos entrada grátis por conta do boi Bolero e outros que meu pai cedia ao circo.
Porém os fatos mais marcantes aconteceram em outro circo de palhaçada que era denominado “Coisinha e sua Cia.”. Neste tínhamos que entrar por debaixo da lona se quiséssemos assistir aos espetáculos.
Eu e meus amigos (Melinho, Tonico, Geraldinho e outros) chegamos a montar um pequeno circo com pedaços de lonas e cobertores velhos, onde a gente procurava imitar tudo aquilo que nós aprendíamos neste circo.
Morávamos na rua do Sapo que ficava paralela ao rio sapucaí (daí o nome), e este circo se instalava do outro lado do rio.
Em uma de suas estadas na minha cidade este circo realizou oito espetáculos e nós assistimos a todos, sempre varando por baixo da lona.
O Plano era simples, atravessávamos o rio que era raso (mal cobria os joelhos) e esperávamos a hora exata de penetrar, uma vez que já estávamos muito próximos da lona, contando ainda com a precariedade da segurança.
Mas foi numa dessas ocasiões que ocorreu o episódio mais engraçado e marcante principalmente para mim.
Eu tinha um primo (e ainda o tenho) que não fazia parte de nossa turma. Esse infeliz tratava sempre de prestar serviços ao circo (vendendo pipocas, pirulitos, amendoins e outras guloseimas) garantindo assim estar dentro do circo durante as apresentações.
Até aí tudo bem, cada um na sua, se não fosse a fama de puxa saco e dedo-duro que ele tinha e que eu conhecia muito bem.
Como nossas relações não andavam lá essas coisas, percebi que teria problemas com ele em uma das apresentações, quando ele veio nos esnobar dizendo que naquela noite ele fora convocado para fazer parte em um dos números do circo.
Para deixar de ser chato, levou uns cascudos no “pé da orêia” e voltou para casa prometendo que se ele visse algum de nós na arquibancada ele iria nos dedurar.
E não deu outra, naquela noite, após eu e um de meus amigos, como de “praxe” furar a lona e sentar-mos sorrateiramente na arquibancada aparece o "benedito cujo" com um dos empregados do circo que, imediatamente nos colocou para fora.
Conseqüência: tivemos que repetir a operação mais tarde quando o espetáculo já havia começado, mas em tempo de ver a “apresentação” do nosso desafeto.
O número consistia numa luta de Boxe entre meu primo e um outro garoto. Estava um de cada lado do picadeiro somente de bermuda e luvas. Foram dadas instruções para que eles se encontrassem no meio do picadeiro e se cumprimentassem antes de começar a luta.
Quando estavam se cumprimentando e a atenção de todo o circo voltada para eles foi que ficaram apenas de luvas, uma vez que suas falsas bermudas haviam sido puxadas por uma corda de Nylon amarradas previamente na parte posterior, pelos funcionários do circo.
Diante daquela situação, ficaram desorientados, sem saber para onde correr e acabaram se escondendo nas tendas dos demais apresentadores, sob gargalhada geral de todos.
Nossa “vingança” estava consumada.
Nos espetáculos que se seguiram não notamos a presença do “disinfeliz” entre os vendedores de guloseimas.
Ainda tiveram que agüentar a gozação na escola, na rua e em casa por um longo período.
Gente, isso ocorreu a mais de 35 anos.
Penso que podem tirar muitas coisas da gente, mas as boas lembranças daquilo que vivenciamos são exclusivas.