CONVERSAS PRÁ BOI DORMIR II - O LOBISOMEM
Essa história eu ouvi quando criança, sentada na varanda da casa dç meu avô durante a quaresma. Bem, meu avô não acreditava nessas histórias, mas “dava corda” aos contadores para depois ficar nos assustando...
“ ...é a mais pura das verdadi, “seu Salomão”, eu juro, nóis inté tava querenô dí falar cum o sinhô, pra mordi dí arrumá umas bala e o revórvi pois num é dí vê que o Tunim si aprontificô di ir mais eu e o Dito na caça do mardito.”
Quando eu ouvi essa parte da conversa, fui chegando mais perto e mais perto, até colar no braço do meu avô e ser abraçada por ele num sinal de que eu podia ficar e participar da conversa dos adultos. Meu avô pediu novamente ao para Antenor contar o que havia acontecido e eu de olhos e orelhas bem abertas quase nem respirava.
“...pois entoces, num é de vê que na sexta fera passada eu fui até lá na Vila de Queimados só pra mordi di tomá uns traguinho e joga um parmo di cunversa fora...mas quando cheguei lá num é qui tava tendo uma disputa di um sanfoneiro lá das banda de Beraba mais o Gérvasio qui é genti nossa e a coisa tava tão boa que eu logo garrei di dançá mais a Dorvalina e num é que perdi a zóras di vim bóra e mi lasquei tudo. To inté agora meio rupiado só di alembra daquela coisa que eu vi...”
Eu nem respirava, mas sentia a mão enorme do meu avô apertando meu ombro e lembrando-me de escutar com atenção. Eu abria mais os olhos tentando imaginar o que o Antenor tinha visto que o deixara tão apavorado.
“... seu Salomão, eu vim mais meus cumpanheiro até na entrada da fazenda, despois cada um seguiu seu caminho e eu piquei a ispóra no Maiado e vim descenô pelo carreadô, eu e mais us dois cachorro qui num larga di eu. Quando cheguemô cá imbaxo, perto daquele pé de marmeleiro, eu apressenti qui o cavalo tava refuganô os pásso e os cachorro também tava meio perreados.
Carquei a ispóra na viria do Maiado mas ele guento firme e refugô. Baxei o chicote e eli refugô. Eu sem intende nada fiquei qui nem palerma, oianô naquele carreado sem fim – foi aí que mim deu uma pancada nus miolo e eu mi alembrei du que tinha faladu quando tava dançanô cum a Dorvalina. Ela havia me preguntado si eu num tinha medo di lubisomê, purque nóis tava na quaresma e o bicho parece sempre. Eu arrespondi que num tinha bicho neste chão de meu Deus, que eu tivesse medo e que se o tár lubisomê vinhésse, eu muntava no lombo delí e carcáva a ispóra.
Num é qui di repenti iscuitei uns barúio nus meio dus pé di café é us cachorro saíro numa currida que devi di ta cheganô em Sumpaulo nessa hora. Seu Salomão, si eu num tivesse ruim das costa eu num tinha caidu du cavalo, mais cumo minha espinhéla ta fora du lugar eu caí e o bicho veio pru meu lado, baxano o arreio pra mórdi eu amuntá nêli, eu tentei corrê mais eli se jogô im cima de mim e nóis se atraquêmo.
Lutei e bati o qui deu, mais acho que foi nessa zóra que ele rasgo o bôrço da minha cárça e o dinherô du pagamento caiu tudo. È só pur causa que to desaprevinio de dinherô que vim aqui lhe pedi um imprétimo das bala e do revòrvi, pra mordi eu í caçá o bicho e arrecuperá o meu dinherô. O bicho era mutio grande e feio. Inté o Maiado chegô a mijá de medo. Parecia um zurso cabeludo, mais era maió e tava cum arrêio e tudo e o zóio do bicho era grande e marélo e a boca tava aberta qui nem si ele tava si rindu di mim...
Quando eu cunsegui me largá do coisa ruim o Maido vortô e eu amontei í carquei a ispóra o mais forte qui pude, e baxei o chicote no lombo do Maiado que se despencô numa carrera inté chegá aqui.”
Meu avô só olhava com atenção balançando a cabeça e fazia: "Huuummm...Sei!..." Eu estava gelada. Petrificada de medo e nem repirava direito. Um lobisomem aqui?! E agora?! Bem, eu estava protegida, afinal ele não seria besta de vir aqui, no casarão do meu avô, mas eu não queria nem imaginar como seria isso. Eu estava aterrorizada com a idéia de um mostro que come criançinhas pagãs estar vagando por ali e meu avô naquela calma toda só fazendo:-"Huuummmm! Sei..." E até que finalmente ele me apertou o ombro e disse: -Mariame, peça para sua avó trazer a minha carteira de dinheiro. Preciso colaborar com o Antenor para livrar a fazendo desse bicho danado!
Depois deu dinheiro ao Antenor que ficou meio sem jeito de pegar, mas embolsou o dinheiro e foi saindo encabulado enquanto meu avô dava uma sonora gargalhada e falava: -"Lobisomem?! Sei..." E ria mais alto ainda dizendo que eles estavam ficando cada vez melhores nas desculpas que arrumavam.
Eu não entendi nada. Mas naquela noite eu posso jurar que ouvi um lobo uivando nos pastos que cercavam o casarão. Não consegui dormir no meu quarto e corri para o quarto do meu avô que me abraçou e disse :-"Huuuuummmmm... Sei..."
www.luciahlopez.prosaeverso.net
Essa história eu ouvi quando criança, sentada na varanda da casa dç meu avô durante a quaresma. Bem, meu avô não acreditava nessas histórias, mas “dava corda” aos contadores para depois ficar nos assustando...
“ ...é a mais pura das verdadi, “seu Salomão”, eu juro, nóis inté tava querenô dí falar cum o sinhô, pra mordi dí arrumá umas bala e o revórvi pois num é dí vê que o Tunim si aprontificô di ir mais eu e o Dito na caça do mardito.”
Quando eu ouvi essa parte da conversa, fui chegando mais perto e mais perto, até colar no braço do meu avô e ser abraçada por ele num sinal de que eu podia ficar e participar da conversa dos adultos. Meu avô pediu novamente ao para Antenor contar o que havia acontecido e eu de olhos e orelhas bem abertas quase nem respirava.
“...pois entoces, num é de vê que na sexta fera passada eu fui até lá na Vila de Queimados só pra mordi di tomá uns traguinho e joga um parmo di cunversa fora...mas quando cheguei lá num é qui tava tendo uma disputa di um sanfoneiro lá das banda de Beraba mais o Gérvasio qui é genti nossa e a coisa tava tão boa que eu logo garrei di dançá mais a Dorvalina e num é que perdi a zóras di vim bóra e mi lasquei tudo. To inté agora meio rupiado só di alembra daquela coisa que eu vi...”
Eu nem respirava, mas sentia a mão enorme do meu avô apertando meu ombro e lembrando-me de escutar com atenção. Eu abria mais os olhos tentando imaginar o que o Antenor tinha visto que o deixara tão apavorado.
“... seu Salomão, eu vim mais meus cumpanheiro até na entrada da fazenda, despois cada um seguiu seu caminho e eu piquei a ispóra no Maiado e vim descenô pelo carreadô, eu e mais us dois cachorro qui num larga di eu. Quando cheguemô cá imbaxo, perto daquele pé de marmeleiro, eu apressenti qui o cavalo tava refuganô os pásso e os cachorro também tava meio perreados.
Carquei a ispóra na viria do Maiado mas ele guento firme e refugô. Baxei o chicote e eli refugô. Eu sem intende nada fiquei qui nem palerma, oianô naquele carreado sem fim – foi aí que mim deu uma pancada nus miolo e eu mi alembrei du que tinha faladu quando tava dançanô cum a Dorvalina. Ela havia me preguntado si eu num tinha medo di lubisomê, purque nóis tava na quaresma e o bicho parece sempre. Eu arrespondi que num tinha bicho neste chão de meu Deus, que eu tivesse medo e que se o tár lubisomê vinhésse, eu muntava no lombo delí e carcáva a ispóra.
Num é qui di repenti iscuitei uns barúio nus meio dus pé di café é us cachorro saíro numa currida que devi di ta cheganô em Sumpaulo nessa hora. Seu Salomão, si eu num tivesse ruim das costa eu num tinha caidu du cavalo, mais cumo minha espinhéla ta fora du lugar eu caí e o bicho veio pru meu lado, baxano o arreio pra mórdi eu amuntá nêli, eu tentei corrê mais eli se jogô im cima de mim e nóis se atraquêmo.
Lutei e bati o qui deu, mais acho que foi nessa zóra que ele rasgo o bôrço da minha cárça e o dinherô du pagamento caiu tudo. È só pur causa que to desaprevinio de dinherô que vim aqui lhe pedi um imprétimo das bala e do revòrvi, pra mordi eu í caçá o bicho e arrecuperá o meu dinherô. O bicho era mutio grande e feio. Inté o Maiado chegô a mijá de medo. Parecia um zurso cabeludo, mais era maió e tava cum arrêio e tudo e o zóio do bicho era grande e marélo e a boca tava aberta qui nem si ele tava si rindu di mim...
Quando eu cunsegui me largá do coisa ruim o Maido vortô e eu amontei í carquei a ispóra o mais forte qui pude, e baxei o chicote no lombo do Maiado que se despencô numa carrera inté chegá aqui.”
Meu avô só olhava com atenção balançando a cabeça e fazia: "Huuummm...Sei!..." Eu estava gelada. Petrificada de medo e nem repirava direito. Um lobisomem aqui?! E agora?! Bem, eu estava protegida, afinal ele não seria besta de vir aqui, no casarão do meu avô, mas eu não queria nem imaginar como seria isso. Eu estava aterrorizada com a idéia de um mostro que come criançinhas pagãs estar vagando por ali e meu avô naquela calma toda só fazendo:-"Huuummmm! Sei..." E até que finalmente ele me apertou o ombro e disse: -Mariame, peça para sua avó trazer a minha carteira de dinheiro. Preciso colaborar com o Antenor para livrar a fazendo desse bicho danado!
Depois deu dinheiro ao Antenor que ficou meio sem jeito de pegar, mas embolsou o dinheiro e foi saindo encabulado enquanto meu avô dava uma sonora gargalhada e falava: -"Lobisomem?! Sei..." E ria mais alto ainda dizendo que eles estavam ficando cada vez melhores nas desculpas que arrumavam.
Eu não entendi nada. Mas naquela noite eu posso jurar que ouvi um lobo uivando nos pastos que cercavam o casarão. Não consegui dormir no meu quarto e corri para o quarto do meu avô que me abraçou e disse :-"Huuuuummmmm... Sei..."
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