SUBSTANTIVO.

Descobri que embaixo da minha cama vive um jabuti; e ele não me deixa em paz. Eu nunca o vi, mas sei que lá está ele, dia e noite... debaixo da minha cama... à espera constante para de mim retirar noites de sono.

Espantam-se quando de mim recebem a mesma resposta às perguntas sobre a origem do bicho: - não tenho ideia; quando eu cheguei para morar no lugar, ele já estava lá.

No entanto, não satisfeitos com a resposta, prosseguem: - e o que diabos um jabuti quer embaixo da sua cama?

- Ah! Por favor! Eu já disse: atormentar-me, é óbvio. Ele deve se nutrir disso... do meu desespero. Acredito ainda que esse jabuti deve adorar saber que eu passo noites em claro, irritado com o barulho que ele faz... um barulho como se estivesse arranhando o chão... ele adora atrapalhar meu sono e minha paz de espírito. Odeio jabutis!

Não sei, de fato, o que mais me cansa: se o jabuti embaixo da minha cama, ou se as perguntas que me fazem sobre a existência dele: - e por que você não se livra do bicho?

No auge do meu esgotamento mental, tento argumentar: - O quê? Não! Não, eu não posso... pois apesar de irritante, o barulho dele faz com que eu não me sinta tão só. É um outro sinal de vida.

Costumam insistir: - mas o barulho que ele faz, arranhando o chão, incomoda você... então por que não se livrar desse sofrimento de uma vez por todas?

Saiba que, como bom taurino, sou mais insistente que a própria insistência, e declaro: - eu já disse que não quero e nem posso livrar-me da presença do bicho... eu reclamo que o barulho é irritante, mas ainda assim, ajuda-me com o ensurdecedor silêncio das noites.

E quando finalmente se dão por satisfeitos, ou fingem estar, finalizam com a mesma indagação, ainda que lexicalmente divergentes: - e o que você pretende fazer?

E com um ar um tanto quanto resignado, concluo: - eu não sei... ainda não sei como vou fazer, nem o que vou fazer... mas sei que algo precisa ser feito. Inclusive, já dei o que considero ser "o primeiro passo", nomeei-o.

Curiosos, espantados e eufóricos, interrogam: - nomeou?

Externalizando o mesmo ar agitado, mais por conveniência que por verossimilhança, prossigo: - sim! "Esperança" é o nome escolhido.

Debocham ou não acreditam na escolha feita por mim: - o quê? "Esperança"?...

Sorrio sem mostrar os dentes, pois compreendo o sarcasmo na pergunta, e não me dou por vencido: - não sei, talvez... a única certeza que tenho, por ora, é de que Esperança tranquilamente dorme, como quem por si mesma espera.

EMauSan
Enviado por EMauSan em 03/10/2024
Código do texto: T8165605
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