Ingênua Esperteza

Theo Padilha

Ainda eram 10 horas de uma manhã qualquer, de uma segunda-feira qualquer, do ano de l986, próximo à rodoviária de Siqueira Campos, norte velho do Paraná.Numa roda de amigos. Parecia dia de festa. Mas o calor já estava sufocante.

Ali naquela cidade são comuns todas as segundas-feiras as pessoas da zona rural vir para a cidade fazer compras, trocar cheques, pagar dívidas, comer bolinho de fubá, tomar cerveja, Vitacana, chupar sorvete. A pequena cidade lembra uma rua da China no tempo dos comerciantes. E num aglomerado de pessoas que conversavam. Trocavam experiências da agricultura. Reencontravam-se padrinhos e afilhados. Alguns exibiam seus produtos. Bem no meio dessa gente aparece um vendedor com um punhado de mangueiras. Dessas coloridas que servem para gastar água tratada que as donas de casa sem escrúpulos usam para varrer o quintal.

Com licença senhores! Vocês querem comprar uma mangueira barata? – gritou o vendedor mostrando as coloridas mangueiras, como serpentes enroladas. Toda a turma fez silêncio. Um dos compadres iniciou o papo com o vendedor:

-É verdade são bonitas e baratas. Mas lá na roça não usamos mangueiras. A gente pega água do poço ou do rio com baldes! E depois nós no momento não temos dinheiro!

-Ah! Meu senhor, não venha com essa que não tem dinheiro! Sei que o seu dinheiro é guardado debaixo do colchão!

-“Debaixo do colchão!” essas últimas palavras provocaram um baque na cabeça do pobre Dito Gouveia. Ele encarou o vendedor. Sua goela secou. Sua cabeça girou. Pensou, pensou e pensou. “Será que esse cafajeste passou lá no meu sítio?” Depois de relutar bastante resolveu sair do grupinho e foi até o ponto de Táxi.

- Por favor, compadre Véio. Leve-me até minha casa na Alemoa. Quero depositar um dinheiro antes que o banco feche!

Dito Gouveia viajou em silêncio. O suor corria do seu rosto. Tremia. “Será que a mulher não fechou bem a casa? E os cachorros? Esses malandros sabem tapear até cachorros!” - pensou.

Quando chegou na Alemoa a casa estava bem fechada. Pegou a chave em baixo da pedra ao lado da porta e correu para o quarto. O dinheiro estava todo lá. Passou a mão num saco de açúcar vazio. Encheu com o dinheiro e pediu para o compadre taxista tocar direto para o Banco do Brasil. Voltava agora muito feliz. Não fora roubado. Pediu perdão ao São Bom Jesus da Cana Verde por ter feito julgamento do pobre vendedor. Aquilo até que serviu de alerta. Já escutara na rádio Bom Jesus, no programa do Dr. Murici, que não é para guardar dinheiro em casa.

Chegando ao Banco do Brasil, no centro de Siqueira Campos, depois de pagar a corrida, entrou no banco e foi direto ao segundo andar falar com o gerente.

- Bom Dia, seu Félix! Quero depositar esse dinheiro que eu tava guardando lá em casa há muito tempo!

O gerente ficou meio assustado, diante de um saco de dinheiro na mão daquele pequeno lavrador, mal vestido e aquele sorriso 1001. Dito possuía poucos dentes.

- Pois não, Seu Dito! Vamos ver quanto tem aqui! – respondeu Félix, pedindo auxílio de um funcionário para a contagem do dinheiro.

O gerente e o funcionário se entreolharam com pena do Dito. Noventa por cento das moedas e notas já haviam perdido seus valores e a importância que valia não passava de quinhentos reais!

Copyright: TIME - Outubro 2007

Theo Padilha
Enviado por Theo Padilha em 14/12/2007
Reeditado em 14/12/2007
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