Raimundo do Bento e a Vela

A Vela

Introdução do Causo: A Vela

Cantado

Dá licença, dá licença

Pa mode eu intrá

No arforge trago o velço

E a prosa no imborná

Quem traiz o sertão na álima

Pruseia im carqué lugá.

Nóis pruseia ô num pruseia?

Sô do mato

Feitio um carrapato

Mais num largo o sertão...

Sô Jiquitibá

Cerne de Aruêra

Pesco na corredêra

E iscondo no capão

Óia Moço!

Sô ave de rapina

Sô mandacaru

Sô o sertão que insina

Ao pensamento nu

Sô nôte inluarada

Sô o canto da cachuêra

Sô o gado na invernada

O gatio da cartuchêra

Sô o arforje e a bainha

Do suó o sale

Da reza a ladainha

E a ponta do punhale

Sô a curva do rio

E os mistéro do sertão

A criação no cio

E o corte do facão

Sô labareda ao vento

E a corredêra a cantá

O incanto da passarada

Sô a noite de luá

Quando a tristeza me amola

Eu pego a viola

E faço uma canção

Sô aranha

Sô a teia

Nada me receia

Alumio ca Candeia

Quando tô na iscuridão

Escuita Seu Moço!

Im minhas andança

Já lidei cum burro brabo

Já tirei lête na onça

E peguei cobra pelo rabo

Já vi coisa dôto mundo

Que inté consome o sono

Vi o Remundo dizeno

Que lidô cum o lubisome

E ele numa prosa astuta

Pidiu uma cachaça e tomô

E eu caladim na iscuita

E ele essa istóra contô:

A VELA

- A vela alumia o cabôco

Pur entre o distino e sertão

Lá fora a criação

Um arvoroço de dá medo.

A prosa daquela rigião

É que in nôte de lua cheia

Tem uma tar tentação

Que assombra os chiquêro

Fazeno um ribuliço

Que inté o santo pade

Arreune as cumade

Pá mode fazê a oração.

Minha vela é benta

A álima é santa

E eu da minha humirde paioça

Ispio a danada... pelos buraco da porta.

Trago um telço no peitio

Que agarante a minha fé

Meus juêi cai pro terra

E a luz da minha vela

Crareano o terrêro

E seja o que Deus quiser.

Meus cabelo arripia!

Ispeta inté o pensamento.

Inté parece ispin águia.

Mais eu na força do vento

Cramo pelo meu São Bento

Pá mode mandá aquela fera

Lá pras cucuia!

Logo sô atindido

E o pade chega suado!

Cum sacristão do lado

Cum os zóio feitio um brasêro

Rezei um credo no home

Ele isprudiu feitio um fuguete

Perto do ingazêro.

E o pade cum os zóio arregalado

Num sabia que do seu lado

Tava aquela criatura

Que virava lubisome

E aturmentava a rigião.

Pur isso que ele cumeu

Inté as prenda do leilão

E diz que danado

Tumava o vinho do pade

Pra mode tumá corage

E assustá inté assombração.

Sô um cabôco inraizado

Minha vela tem pudê

E crareia a minha devução.

Já que tudo acarmô

Vô inroscá na Teresa

A chama dela ta acesa

Vô guardá a minha vela

Pá mode alumiá in ôta ocasião

Se pricisá!

Mais logo vô ponteá a viola

E isperá a Juriti

Cantá no meu nobre sertão!

Aqui é o meu santuáro!

Aqui é o meu pedaço de chão!

Eu teço a prosa

De acordo ca pessoa

A má querença me injoa

E me fere o coração!

Sô Matuto de nascença

Matuto de profissão!

Inté meu cumpade...inté!!

Mestre Tinga das Gerais
Enviado por Mestre Tinga das Gerais em 04/01/2020
Código do texto: T6833958
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