Cão Por Raposa
O José Teodoro resolveu recomeçar uma criação de galinhas lá no seu sítio, mesmo depois de tomar muito prejuízo com um gavião que fez a festa em seu terreiro. Ele saiu pelas redondezas e comprou algumas cabeças de galinha e um galo carijó. Depois de dois meses investindo na criação, surgiram uma boa quantia de franguinhos que o deixou satisfeito. Logo pensou num jeito de proteger os bichinhos dos gaviões e outros predadores de plantão.
Lá na cidade, quando estava de conversa com os amigos, descobriu que o conhecido Romualdo tinha um filhote de cachorro e queria ficar livre dele. Não perdeu tempo e se ofereceu para ser o novo dono do bichinho. Colocou-o dentro de um saco de estopa e o levou para a sua propriedade. Deu-lhe o nome de Duque. Duque crescia no meio da galinhada e tinha a incumbência de guardar as galinhas de qualquer intruso que se aventurasse a se aproximar do terreiro. Enquanto isso, José Teodoro saía bem cedo para trabalhar e só voltava de tardezinha. A criação ia de vento em poupa com os franguinhos crescendo de maneira satisfatória. Todos os dias José Teodoro apreciava sua criação e estava satisfeito com sua nova empreitada, levando-o a concluir que tinha feito um bom negócio quando adotou o Duque como seu cão de guarda.
A parceria entre os dois caminhava muito bem até que um dia José Teodoro desconfiou que os franguinhos estavam sumindo. A princípio achou que poderia ser impressão sua e não se preocupou. Mas, depois de algum tempo, concluiu que realmente estavam diminuindo. Agora já não era mais uma desconfiança e sim uma certeza, pois passou a contá-los quando chegava do serviço. Ele ficou pensativo e pôs-se a agir como um detetive em busca dos criminosos, no entanto não conseguiu descobrir o que estava acontecendo. Cada dia ficava mais aborrecido, pois mais uma vez sua criação estava indo por água abaixo. Até que, num dia de domingo, acordou com as galinhas assustadas. Olhou pela fresta da janela e seu coração ficou partido ao ver o Duque arrastando um franguinho pela boca. Pulou da cama, saiu no terreiro e observava a cena promovida pela sua sentinela. O Duque, sabendo que tinha feito algo errado, largou sua presa no chão e saiu de fininho. José Teodoro estava decepcionado, mas não maltratou o animal. Sempre procurava conversar com Duque e assim procurou educá-lo com palavras e gestos de carinho. Algumas vezes erguia a voz quando ele não lhe dava ouvidos, mas nunca o espancou e, assim, de maneira coerente, chamou o Duque e fez-lhe um duro sermão:
- Ei, Duque, não acredito no que vi! Ocê comendo os franguinhos?! Não acredito! Não é possível. É assim que ocê agradece? Ocê tava na cidade e ninguém te queria. Eu fui lá e te peguei pra criar e tenho esta surpresa?
Duque abaixou as orelhas, pôs o rabo entre as pernas e parecia que ia sumir de tanta vergonha. José Teodoro continuou:
- Eu te dei ração, leite, casa pra morar e ocê faz isso comigo? Pode ir embora, pegue a estrada e vai embora, não quero um traidor morando comigo.
Duque, vendo que não tinha jeito, saiu pela estrada afora. De vez em quando dava uma paradinha e olhava para trás na esperança de uma mudança de atitude por parte de seu ex-dono, mas José Teodoro não retrocedeu. Fez questão de esperar até que o Duque sumisse na curva da estrada. O pobre animal seguia sem saber para onde ir. Sentia-se humilhado por ser expulso daquele jeito. Fazia muito calor, a sede e a fome o deixavam mais prostrado. Já quase sem forças, parou debaixo da sombra de um pé de cedro que havia na beira da estrada. Diversos medos tomaram conta do Duque. Medo de ser morto por outros cachorros maiores, medo de não encontrar outro dono, medo de ser apanhado pela carrocinha que transitava pela redondeza. Tais medos fizeram com que tentasse mais uma vez o perdão de José Teodoro. Levantou-se, enfiou ainda mais o rabo entre as pernas e voltou até a casa onde fora criado. Ficou de longe, e, meio ressabiado, aguardava com ansiedade o momento que fosse visto. De repente, José Teodoro saiu no terreiro e, ao vê-lo, ficou furioso, entrou dentro de casa, pegou um foguete bem forte, virou-o na direção do Duque e o soltou. Ele se assustou tanto que, mesmo trêmulo, encontrou forças só Deus sabe onde para fugir para bem longe e, se pudesse, fugiria até de si mesmo, tamanha era a decepção que vivia no momento. Desta vez nem parou para descansar, saiu em disparada, pois entendia que ficar longe agora era uma questão de vida ou morte.
Quando a noite chegou, Duque estava muito cansado. Já tinha caminhado algumas léguas sob um sol quente. Achou um lugarzinho debaixo de uma ponte e dormiu profundamente.
Quando amanheceu, logo saiu peregrinando pela estrada afora. Duque levantou a cabeça, farejou o ar e notou que havia gente por perto. Caminhou mais um pouco e deu de cara com o Joãozinho indo para a escola. Então, na ânsia de resolver seu problema, abanou o rabo e se aproximou do menino que foi receptível e deu sinal verde para o pobre coitado:
- Oi cãozinho bonitinho! O que que ocê tá fazendo aqui? Parece que tá perdido. Venha! Vou te levar pra casa. Agora ocê é meu.
Duque estava muito feliz. Não cansava de manifestar sua alegria.
Logo chegaram. Joãozinho chamou sua mãe e apresentou o seu novo amigo. Deixou o cachorro e voltou para ir até a escola. Duque agora estava de bem com a vida. Na sua nova morada havia outros cachorros que dividiam com ele a responsabilidade de vigiar o terreiro. Com o bom trato recebido, cresceu, engordou e estava com o pelo limpo e bonito.
Um dia o José Teodoro deu as caras por lá. Como bom castrador que era, foi intimado pelo pai de Joãozinho, o seu Otaviano, para castrar uns leitões. Quando foi chegando, Duque o reconheceu e veio ao seu encontro, na maior felicidade, como se nada tivesse acontecido. José Teodoro ficou sem graça, mas aceitou o seu agrado. Seu Otaviano observou:
- Parece que vocês já se conhecem!
- Sim, ele passou uns tempos lá em casa, mas depois foi embora.
- O Joãozinho achou ele perdido na estrada e o trouxe para cá. Parece que é um bom cachorro!
- Sim, é um bom cachorro. Não deixa nenhum outro animal comer as galinhas...
O José Teodoro resolveu recomeçar uma criação de galinhas lá no seu sítio, mesmo depois de tomar muito prejuízo com um gavião que fez a festa em seu terreiro. Ele saiu pelas redondezas e comprou algumas cabeças de galinha e um galo carijó. Depois de dois meses investindo na criação, surgiram uma boa quantia de franguinhos que o deixou satisfeito. Logo pensou num jeito de proteger os bichinhos dos gaviões e outros predadores de plantão.
Lá na cidade, quando estava de conversa com os amigos, descobriu que o conhecido Romualdo tinha um filhote de cachorro e queria ficar livre dele. Não perdeu tempo e se ofereceu para ser o novo dono do bichinho. Colocou-o dentro de um saco de estopa e o levou para a sua propriedade. Deu-lhe o nome de Duque. Duque crescia no meio da galinhada e tinha a incumbência de guardar as galinhas de qualquer intruso que se aventurasse a se aproximar do terreiro. Enquanto isso, José Teodoro saía bem cedo para trabalhar e só voltava de tardezinha. A criação ia de vento em poupa com os franguinhos crescendo de maneira satisfatória. Todos os dias José Teodoro apreciava sua criação e estava satisfeito com sua nova empreitada, levando-o a concluir que tinha feito um bom negócio quando adotou o Duque como seu cão de guarda.
A parceria entre os dois caminhava muito bem até que um dia José Teodoro desconfiou que os franguinhos estavam sumindo. A princípio achou que poderia ser impressão sua e não se preocupou. Mas, depois de algum tempo, concluiu que realmente estavam diminuindo. Agora já não era mais uma desconfiança e sim uma certeza, pois passou a contá-los quando chegava do serviço. Ele ficou pensativo e pôs-se a agir como um detetive em busca dos criminosos, no entanto não conseguiu descobrir o que estava acontecendo. Cada dia ficava mais aborrecido, pois mais uma vez sua criação estava indo por água abaixo. Até que, num dia de domingo, acordou com as galinhas assustadas. Olhou pela fresta da janela e seu coração ficou partido ao ver o Duque arrastando um franguinho pela boca. Pulou da cama, saiu no terreiro e observava a cena promovida pela sua sentinela. O Duque, sabendo que tinha feito algo errado, largou sua presa no chão e saiu de fininho. José Teodoro estava decepcionado, mas não maltratou o animal. Sempre procurava conversar com Duque e assim procurou educá-lo com palavras e gestos de carinho. Algumas vezes erguia a voz quando ele não lhe dava ouvidos, mas nunca o espancou e, assim, de maneira coerente, chamou o Duque e fez-lhe um duro sermão:
- Ei, Duque, não acredito no que vi! Ocê comendo os franguinhos?! Não acredito! Não é possível. É assim que ocê agradece? Ocê tava na cidade e ninguém te queria. Eu fui lá e te peguei pra criar e tenho esta surpresa?
Duque abaixou as orelhas, pôs o rabo entre as pernas e parecia que ia sumir de tanta vergonha. José Teodoro continuou:
- Eu te dei ração, leite, casa pra morar e ocê faz isso comigo? Pode ir embora, pegue a estrada e vai embora, não quero um traidor morando comigo.
Duque, vendo que não tinha jeito, saiu pela estrada afora. De vez em quando dava uma paradinha e olhava para trás na esperança de uma mudança de atitude por parte de seu ex-dono, mas José Teodoro não retrocedeu. Fez questão de esperar até que o Duque sumisse na curva da estrada. O pobre animal seguia sem saber para onde ir. Sentia-se humilhado por ser expulso daquele jeito. Fazia muito calor, a sede e a fome o deixavam mais prostrado. Já quase sem forças, parou debaixo da sombra de um pé de cedro que havia na beira da estrada. Diversos medos tomaram conta do Duque. Medo de ser morto por outros cachorros maiores, medo de não encontrar outro dono, medo de ser apanhado pela carrocinha que transitava pela redondeza. Tais medos fizeram com que tentasse mais uma vez o perdão de José Teodoro. Levantou-se, enfiou ainda mais o rabo entre as pernas e voltou até a casa onde fora criado. Ficou de longe, e, meio ressabiado, aguardava com ansiedade o momento que fosse visto. De repente, José Teodoro saiu no terreiro e, ao vê-lo, ficou furioso, entrou dentro de casa, pegou um foguete bem forte, virou-o na direção do Duque e o soltou. Ele se assustou tanto que, mesmo trêmulo, encontrou forças só Deus sabe onde para fugir para bem longe e, se pudesse, fugiria até de si mesmo, tamanha era a decepção que vivia no momento. Desta vez nem parou para descansar, saiu em disparada, pois entendia que ficar longe agora era uma questão de vida ou morte.
Quando a noite chegou, Duque estava muito cansado. Já tinha caminhado algumas léguas sob um sol quente. Achou um lugarzinho debaixo de uma ponte e dormiu profundamente.
Quando amanheceu, logo saiu peregrinando pela estrada afora. Duque levantou a cabeça, farejou o ar e notou que havia gente por perto. Caminhou mais um pouco e deu de cara com o Joãozinho indo para a escola. Então, na ânsia de resolver seu problema, abanou o rabo e se aproximou do menino que foi receptível e deu sinal verde para o pobre coitado:
- Oi cãozinho bonitinho! O que que ocê tá fazendo aqui? Parece que tá perdido. Venha! Vou te levar pra casa. Agora ocê é meu.
Duque estava muito feliz. Não cansava de manifestar sua alegria.
Logo chegaram. Joãozinho chamou sua mãe e apresentou o seu novo amigo. Deixou o cachorro e voltou para ir até a escola. Duque agora estava de bem com a vida. Na sua nova morada havia outros cachorros que dividiam com ele a responsabilidade de vigiar o terreiro. Com o bom trato recebido, cresceu, engordou e estava com o pelo limpo e bonito.
Um dia o José Teodoro deu as caras por lá. Como bom castrador que era, foi intimado pelo pai de Joãozinho, o seu Otaviano, para castrar uns leitões. Quando foi chegando, Duque o reconheceu e veio ao seu encontro, na maior felicidade, como se nada tivesse acontecido. José Teodoro ficou sem graça, mas aceitou o seu agrado. Seu Otaviano observou:
- Parece que vocês já se conhecem!
- Sim, ele passou uns tempos lá em casa, mas depois foi embora.
- O Joãozinho achou ele perdido na estrada e o trouxe para cá. Parece que é um bom cachorro!
- Sim, é um bom cachorro. Não deixa nenhum outro animal comer as galinhas...