Bendita guerra

A madrugada de 10 de maio de 1940 já ia alta, quando um avião foi ouvido voando em círculos, sobre a capital adormecida da Islândia. Alguém teve o cuidado de ligar para o primeiro-ministro, alertando para a possibilidade de que fossem problemas se aproximando.

- Alguma chance de que seja um dos nossos? - Indagou o político, preocupado.

- Não há nenhum dos nossos lá fora, mesmo se contássemos aeronaves dinamarquesas como "nossas" - advertiu o informante.

- Quem acha que pode ser, então?

- Os alemães certamente não mandariam apenas um avião de reconhecimento. Aposto meu salário do mês, que são os britânicos.

Eram. Pouco antes das cinco da manhã, a população reunida no porto de Reykjavík avistou um pequeno grupo de belonaves que se aproximava para atracar. A ilha não possuía forças armadas, e para sua defesa não contava com nada mais que um reduzido quadro de policiais. Ninguém, em sã consciência, iria oferecer resistência face à disparidade de forças.

O cônsul do Reino Unido, previamente alertado da invasão da Islândia pelos britânicos, e presente no porto, ficou melindrado ao constatar a quantidade de locais que haviam vindo assistir o desembarque das tropas. Temendo algum entrevero, dirigiu-se ao comandante dos policiais e perguntou-lhe se poderia pedir à população que liberasse a passagem para os fuzileiros, que estariam no cais em poucos instantes.

- Sem problemas - anuiu o policial, orientando seus homens para afastarem os curiosos do caminho das tropas.

O desembarque ocorreu sem problemas e nenhum tiro foi disparado. Os britânicos asseguraram aos islandeses que a invasão só ocorrera por receio de que os alemães tentassem o mesmo após invadir a Dinamarca, também neutra, de uma forma muito mais violenta.

- Certamente que acreditam que estão trabalhando pelo nosso bem-estar - admitiu o primeiro-ministro a um dos seus assessores. - Mas estou temendo é pelo impacto dessas tropas estrangeiras sobre a nossa população.

A população a qual o primeiro-ministro estava se referindo, implicitamente, era a feminina da ilha. Efetivamente, durante o período de ocupação, muitas locais se envolveram com soldados estrangeiros e mais de 250 crianças nasceram destes relacionamentos.

Só que, felizmente, a esmagadora maioria destas relações eram consensuais e muitas mesmo resultaram em casamento, algo inesperado para uma ação que prometia inicialmente apenas trazer dor e sangue aos envolvidos.

- [14-10-2019]