O MEU NOME É PAULO EOBERTO

O MEU NOME É PAULO ROBERTO!

Foi no ano de 1969, época dos Festivais da canção, auge do movimento musical da Jovem Guarda, quando eu conheci Paulo Roberto.

Um ano antes ou seja, em 1968, Roberto Carlos havia conquistado o 1º lugar, no Festival de Sanremo com a música, “Canzone Per Te.” Por sua vez Cynara e Cybele haviam conquistado o primeiro lugar com a música, “Sabiá” de Tom Jobim e Chico Buarque de Holanda, no Festival Internacional da Canção realizado pela Globo no Maracananzinho, interessante que sob vaia do público que não concordou com a decisão dos jurados e entenderam que no primeiro lugar caberia a que ficou em 2º lugar ou seja, a música, “Para não dizer que não falei das flores,” de Geraldo Vandré.

Por tudo isso e diversos outros acontecimentos musicais que classifico a época como dos festivais e foi nesta ocasião, pela então situação que no ano de 1969, os estudantes de Unaí/MG tiveram a maravilhosa iniciativa para promover o Festival da Canção Unaiense e nesta perspectiva criaram uma comissão, elegeram o Professor Geraldo Nininha para presidente, elaboraram e publicaram um edital com o regulamento para realização do evento.

As regras eram severas acerca da apresentação e elegância dos participantes. A bermuda e camiseta ainda não eram usadas, ainda assim, o saudoso professor que era alfaiate, portanto prezava pelo bem vestir, determinou em uma cláusula no regulamento, que os artistas deveriam comparecer vestidos a rigor, de preferência trajando terno ou no mínimo, calças Lee (jeans) com blusa de malha, gola rolê sob japona de veludo, ainda porque, apesar da cidade ser quente, o evento aconteceria numa noite, em tese fria, pois no mês de julho.

A animação era total e o Festival aconteceu no auditório do Cine Cristal após a única sessão daquele dia. Mesmo sendo fim de semana foi seção única em virtude do evento.

O regulamento preconizava que o concorrente pagaria uma taxa de inscrição num valor considerável e inicialmente, para mais conteúdo à festa e avaliação do potencial cantaria uma música de sucesso da época e uma vez aprovado pela comissão, apresentaria uma música inédita para concorrer o 1º lugar no festival e levar o prêmio.

Como era época da Jovem Guarda, a exemplo de hoje, que geralmente todo e qualquer jovem sonha ser jogador profissional de futebol, naquele tempo todos sonhavam ser cantor (a) de sucesso e não perdiam a oportunidade de mostrar seus dotes musicais. Isso fez do festival, um evento importante, concorrido e com um público recorde em evento da cidade. Seria sem sombras de dúvidas um importante evento cultural, na cidade!

Os candidatos a cantores, bem ensaiados pelo conjunto musical, Os Phosflorecentes e trajados com requinte e muito emocionados, tentaram fazer e fizeram o melhor que conseguiram para conquistar o primeiro lugar, única colocação premiada que valia statos; admiração do público; uma linda taça e uma generosa importância em dinheiro, oriunda da porcentagem das inscrições, entradas e do patrocínio do comércio local.

No início, para entrarem no clima festivo de festival compareceram alguns cancioneiros não inscritos, que dispuseram a cantar voluntariamente, portanto, sem passar por avaliação da comissão ou do júri nem concorrer a prêmio algum.

O auditório do Cine Cristal se encontrava superlotado e a expectativa era grande entre os presentes.

A cerca dos participantes, cometerei alguma injustiça, pois não me lembro o nome de todos, assim não os citarei na totalidade, pelo que desde logo peço desculpas, vez que não me furtarei a oportunidade de citar os que restaram na minha lembrança, como por exemplo, Geraldo Balá que cantou, Balada de nº 7, música de Moacir Franco.

Entre os inscritos e músicas inéditas: Liberino Cunha cantou, Menina Mão Chore Tanto, samba canção com letra deste contista, Jaques Valadares; Ildeu Pereira, cantou de sua autoria, ....., outros e outras que infelizmente já não me lembro, também concorreram com certeza se destacando. Mas o vencedor do festival, para espanto geral foi Paulo Roberto, um até então desconhecido que se inscreveu na última hora sob protestos dos concorrentes, mas sob a “batuta” do professor Nininha. Isso segundo os demais candidatos foi um desrespeito ao regulamento.

O vitorioso se tratava de um jovem simples e bem novinho, talvez, no máximo com vinte anos de idade. Ele chegou parece que sem nenhuma programação e não estava trajada a contento, muito humilde, com vestimenta pobre e desleixada: calças de naycron, bem surrada e blusa, volta ao mundo, também surrada sob um modesto casaco de flanela xadrez, puído na altura dos cotovelos. Um contraste com os demais presentes.

O rapazinho depois de algumas perguntas a algumas pessoas, procurou o Professor Nininha e alegou ter uma música inédita, da sua autoria e desejava inscrevê-la no Festival. O Professor subiu no palanque e usando o microfone convocou a comissão e a todos os inscritos, para uma reunião de emergência e pediu ao Conjunto que continuasse o evento com músicas de seu repertório enquanto durasse a ausência da direção e candidatos ao prêmio do Festival.

O Presidente falou na reunião, da pretensão do jovem em se inscrever para o festival. A idéia não foi bem aceita, pela intempestividade como outras razões que comentaremos a seguir: – No edital que promoveu o festival se encontrava o regulamento estipulando prazo para a inscrição, portanto no caso seria uma inscrição atípica que o violaria, agrediria e desrespeitaria, segundo os já inscritos. Alegaram que não conheciam o jovem nem sabiam do seu potencial, portanto, não era marcação, tampouco temor. Todavia importava respeito as normas do regulamento que foram elaboradas com cuidado, para o requinte e qualidade da festa; as inscrições haviam se encerrado há uma semana e, depois tinha a questão da exigência do traje que o novo candidato não atendia de forma alguma. Não era questão de discriminação, mas de respeito ao regulamento, fidelidade ao público e aos figurantes do elenco, do show então proposto.

Porém o Professor Geraldo Nininha, com a autoridade de presidente ditador, haja vista época da Ditadura, retrucou: “O rapaz é um visitante, a quem nós como bons anfitriões, devemos por questão de elegância, recebê-lo com respeito e toda atenção. ‘O hóspede em nossa casa, é rei,’ NÃO SE ESQUEÇAM DISSO! Eu, como presidente, portanto representante do evento, não deixarei de atendê-lo. Sou o representante da comissão e conforme o edital, fica a meu cargo resolver os casos omissos e como no edital não se encontra previsto o tratamento à forasteiros, por minha iniciativa respeitando minha formação e costumes o receberei ‘de braços abertos,’ com a hospitalidade de bom mineiro. Assim, fica decidido por mim que ele fará sua inscrição e defenderá sua composição musical NO FESTIVAL DA CANÇÃO UNAIENSE!”

Paulo Roberto, imediatamente foi convidado pelo Presidente a se inscrever. Porém surgiu outro problema: ele não tinha o dinheiro para pagar a inscrição, mas o Professor que havia se transformado em seu protetor fez uma discreta e rápida “vaquinha” e resolveu mais este problema.

O então forasteiro foi convidado ao palanque para cantar um sucesso atual, como previsto no regulamento, então recebeu o microfone e com toda naturalidade solicitou do conjunto uma guitarra, pois tinha o costume de cantar auto-acompanhando.

De posse da guitarra, muito a vontade ajustou-a na altura da cintura e com algumas dedilhadas arrancou perfeitas notas da canção, Meu Pequeno Cachoeiro, sucesso de Roberto Carlos que estourava em todas as paradas.

Ao término da canção houve verdadeiro alarido acompanhado de maciço coro de aplausos. Paulo Roberto foi aprovado pela comissão do evento e aclamado pelo público a defender sua música inédita e o fez anunciando o título da canção para o público e o tom à banda e começou com voz grave e um você bem longo: “Vooocê, muito me surpreendeu/quando me disse adeus, pra nunca mais voltar./ Vooocê não vai nunca dizer que eu lhe magoei fazendo-lhe chorar./ Meu bem sei que vai voltar, pois não vai ficar assim/ tão distante de mim...

A letra da música, embora muito rimada, mas simples com rimas pobres da primeira conjugação, não chamava muito a atenção, assim também era a melodia, simples. Porém, a interpretação foi impecável, digna de grandes nomes do ramo. Foi primeiro lugar absoluto e em seguida recebeu a taça e o dinheiro do prêmio e se mandou deixando para traz protestos dos demais concorrentes e um Geraldo Nininha com grande sorriso no rosto alegre pela sensação de haver feito justiça.

Naquela noite eu acreditei e todos os presentes acreditaram e apostaram em um Paulo Roberto estourando em sucesso pelo mundo, muito em breve. Ora, naquele jovem nada faltava nada para um cantor em dimensão mundial, era uma questão de tempo e pouco tempo!

Como tudo passa e só a Palavra de Deus permanece. O festival passou, os anos passaram e eu passei a morar Urucuia e durante anos não ouvi falar de Paulo Roberto, ainda porque, quando vinha a Unaí me encontrava sim com alguns amigos, mas, jamais me lembrava de perguntar por ele. Não por ingratidão ou descaso, mas por não conhecê-lo bem, afinal eu o vi apenas naquele festival. Claro que ele destacou, mas o mundo está cheio de talentos. Contudo eu esperava qualquer dia ligar o rádio e ouvir o radialista anunciar mais ou menos assim: “E agora com vocês, Paulo Roberto!” Porém, infelizmente isso não aconteceu.

Depois de 35 (trinta e cinco) anos, voltei à morar em Unaí, trabalhava na Prefeitura Municipal, na Secretaria de Meio Ambiente, Cultura e Turismo, e por ocasião de determinado aniversário da cidade, àquela Secretaria organizava as comemorações e ocupava os demais servidores, pelo que eu me encontrava sozinho, quando um senhor muito simples com fisionomia sofrida, muito abatido entrou na sala e me pediu muito humildemente que lhe fizesse a Xerox dos seus documentos pessoais, para ele se inscrever para cantar nos festejos que se aproximavam. Então lhe perguntei: O senhor é cantor? Ele respondeu que sim. Então lhe perguntei qual o seu nome? Ele me respondeu: O MEU NOME É PAULO ROBERTO!