DONA ZUMIRA

Há pessoas que realmente tem saúde vivendo em lugares não muito fáceis. Vou relatar muito rapidamente sobre uma dessas preciosidades que vive no interiorzão do nosso imenso Brasil.

Numa fazenda um pouco perto de Guaranilândia, naquelas terras áridas da fazenda do Sapê, no Alto Jequitinhonha, nas Minas Gerais, digo nas Minas Gerais, porque Minas são muitas, como já dizia Guimarães Rosa. Lá naquelas terras vive Dona Zumira com seus oitenta anos. Uma mulher simples, sertaneja, de pele queimada, olhos pequenos, pano branco sempre protegendo os cabelos carrapixados, já bastante brancos, com suas rugas profundas no rosto, poucos dentes amarelados devido ao tabaco que foi se calando ao longo dos anos. Sempre com o seu cigarro de palha no canto da boca, fumo de rolo vindo de longe no canto da cantoneira de madeira, pintada de cor azul há muito tempo. Assim, dona Zumira, viúva de dois maridos, sem filhos, proprietária de meio alqueire de terra ressequida na beira da mata da fazenda do Sapê.

Numa tarde daquelas bem encaloradas, do Zumira descansava à sombra da mangueira frondosa no canto do terreiro varrido. De repente, Tustão, um cachorro vira lata amarelinho latiu anunciando que estava chegando visita. Eram duas profissionais da saúde familiar que estavam fazendo a visita da saúde preventiva na região, para ajudar as pessoas a terem melhores condições de vida salutar.

As moças, uma de Guaranilândia e outra de Almenara, simpáticas como todos moradores da região, logo foram batendo palmas e pendindo licença para chegar. Dona Zumira se levantou, limpando as mãos no avental meio rosa, feito de tecido com um bolso na frente, e foi logo convidando-as para chegarem. Uma conversa daqui, outra conversa dalí e foram para dentro da humilde residência de dona Zumira.

Uma delas verificou sua pressão arterial, que estava em perfeita sintonia, batimentos cardíacos memoráveis, enquanto a outra lhe perguntava, com o fichário nas mãos, se ela tinha alguma doença ou tomava medicamentos contínuos ou controlados. Nesse interrogatório, dona Zumira foi logo destrinchando:

- “Mia fia, eu intuda mia vida, só tive ispinhera caída um veis, dordói tamem tive, sapinho i boquera nunca tive, impingi já tive, asveis tenho gastura, asveis quando vô lenhá, pego cobrero, vem du sarpexe. E tenhu bico de papagaio na iscadera, sulitária nunca tive, us porcu daqui num tem quirerinha. Eu, quando fico meia duenti, fico di resguardu e logo passa. Quando era nova eu tia muin isquentamen, dispoi cabô. Mia vizim teve barriga d’água i virô doença rúim, eu não. Tossi cumprida eu tive, uma veis tive zizimpela, miqüim tive muitas veis. Bucho viradu, nó na tripa, issu num tive não. Quando cai água nuszuvido tamém dói. E constipadu qui as veis a gente pega né mia fia, e carrerinha tamém conteci né. Achu qui é só isso.”

Depois de uma resposta como essa, as duas profissionais da saude deram os parabéns à Dona Zumira pela sua saúde e foram embora. Para elas, essa linguagem cabocla é normal, entendem tudo e ainda correm o risco de falar assim também. Vive lá um pouco para ver, logo logo você fica humilde, simples e sem medo de dizer sobre si mesmo sem dar voltas.

Parabéns pela saúde dona Zumira!

É isso aí!

Acácio Nunes

Acácio Nunes
Enviado por Acácio Nunes em 05/12/2018
Código do texto: T6519707
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