Sigo Caminhando...
Caminhando... empurrando vento, dois passos à frente e um para trás, areia molhada por água chocolate, pura mãe d'água, algas, coisas dos mares abertos do sul, deparei-me com algo estranho ao ambiente natural. Uma lâmpada, dessas de livro de estórias ou filmes para criança, dita mágica. Ora bolas! Lâmpada mágica aqui! Bem capaz! Nem vou perder tempo e juntar... juntei! Curioso!... Olhei para um lado, neblina que só vendo e nada vendo, olhei para o outro; idem. No mar, como rebatizamos oceano por aqui, "vixe" (homenagem a irmã que mora na querida Bahia), nem dá para enxergar. Sê há barco ou navio, está bem escondidinho. No continente, muro caído, casa dependurada, gramado "esgualepado" (1 - esse é termo gaúcho) não pela maré, mas pela burrice de construir quase dentro da água. Bate aquela hora boba! Sozinho! E sê esfregar... apenas... um pouquinho a lâmpada, sem ninguém ver. Quase como cagar nas dunas, só a areia batendo... nas pernas e limpar com capim; sem testemunhas. Vamos lá, fala uma voz do além, no ouvido que tudo quer ouvir nessa hora. Arrisco. Uma esfregada, duas, três, quatro... Nada! Sê tinha gênio aí mudou-se ou morreu. Preparo para lançar a lâmpada para o quinto dos infernos e, súbito, ouço uma voz: - calma tchê (1)! Deixa eu limpar a... Chacoalhei a lâmpada. Calma! Vou sujar os dedos, pô! Não acreditei! Sai-me um gênio levantando a bombacha, gordo de churrasco, faca atravessada no cinto, botas, lenço e chapéu. Um gênio gaudério. Você é um gênio!?... Lógico! Morando numa lâmpada você esperava o que? Olha só! Um gênio! Só um gênio não; sou um gênio gaudério. E tenho nome! Eugênio!... Putz! Prazer seu gênio Eugênio. Sou o poeta Fabio. Poeta? O que é isso!? Bem, é meio complicado explicar, mas eu vivo assim, meio no mundo da lua, e escrevo poesias. Poesias!? É!... Falo da lua, do sol, das estrelas, flores, beija flores, falo do amor, desamor, sentimentos. Mais vai cagar!... Bem mais fácil ser gênio. E ainda dizem que sou maluco por morar numa lâmpada. Melhor que escrever... poesia. Mas seu gênio Eugênio, você é gênio mesmo? Desses que faz pedidos!?...
Dá para ver que é poeta. Sabe de nada o inocente! Mas é claro (dito aos berros) burro! Desculpe! Não queria ofender. Posso fazer três pedidos? Não! Mas para que serve um gênio sê não posso pedir nada!? De que adiantou esfregar a lâmpada!? Aprenda... poeta! Antes que me peça, quer riqueza... trabalha, mulher bonita... conquista, vida longa... te cuida. E lá sê foi o infeliz, espremendo-se o bombachudo gorducho para dentro da lâmpada. Esfreguei, esfreguei, esfreguei, esfreguei... cansei. Já era o gênio. Mandei a lâmpada para o quinto dos infernos... e ouvi um aí!... Acertei a pinha dum trouxa caminhando num dia ruim de praia que só vendo. E eu que pensei que o único trouxa era eu larguei em pernas antes que o infeliz acordasse com uma lâmpada de um gênio meia boca ao lado e um galo na cabeça... Para mim agora, lâmpada mágica só em estórias e, sê encontrar outra... nem esfrego. Ou será que esfrego!... Bem, achar uma é difícil, duas então, nem pensar! Melhor esquecer. Sigo caminhando...