Acredite se puder: Machismo e/ou Covardia!
O destino por 3 x me levou a Santa Tereza, lindo bairro do RJ que nos remete ao passado. A 1ª foi com Verônica, a 2ª com minha ex, Stella e a 3ª com meu professor Lua Rasta. Com Verônica ia sempre que podia, principalmente aos sábados e domingos.
Mais tarde meu patrão comprou uma motinha de 2ª mão para acelerar as entregas e acelerei diariamente pra Santa.
Nos primeiros dias os moleques esvaziavam meus pneus, obrigando-me a descer ladeira abaixo, empurrando a dita cuja.
A "vagabunda" deu tantos problemas mecânicos que o patrão se desfez dela. Ultimo dia de um ano entre 1975-80, subo a Santa pra desejar Boas Entradas e umas 22 horas saio correndo da casa de Verônica, tentando chegar na praia de Copacabana a tempo de ver a queima de fogos.
O transporte público de Santa Tereza é um bonde cuja peculiaridade é ter um lado, o esquerdo, gratuito. E lá vem o bonde e eu fora do ponto tenho que pega-lo a unha, ou seja correndo. Caroneiro de carteira assinada foi moleza, só que pra meu azar tive que pegar no lado pago, com todo o morro descendo pra balada, o outro estava superlotado.
E lá vem o cobrador chato que já me conhecia de tantas idas e vindas, me apavorei e esse descuido foi fatal. As ruas são estreitas para 2 mãos, fazendo com que os bondes andem bem rente as calçadas, também estreitas, cujos postes ficam a menos de meio metro da rua.
Procurando um lugar vago do outro lado, não reparei que o poste vinha vindo, e POW !, fui atropelado pelo poste, que vinha a 40 km batendo na minha cabeça. Pretiou tudo mas não vi estrêlas, vi tudo em marrom claro, eu caindo em posição fetal, com o braço esquerdo dobrado atrás da costa.
Meu olhar a uns 4 metros acima, olhou meu corpo por alguns segundos, depois veio se aproximando suavemente e entrou pelo meu ombro direito. A medida que ele descia, meu ouvido ia começando a ouvir a freada do bonde e os comentários sobre o ocorrido. Abri os olhos e me vi na mesma posição que tinha visto no trailler, e pensei:
Perdi meu braço!
Tentei levantar meu corpo daquela posição fetal e senti meu braço direito biônico, com músculos de aço. Estranha sensação pensei. Levantei-me, sentia-me leve, tinha perdido pouco sangue mas o dedo indicador entrava tranquilamente no buraco aberto.
Acredito que se tivesse morrido meu "olhar" teria subido!
Levaram-me para o hospital, que naquele dia e hora, só tinha estagiário de Universidade de Medicina. Meia hora depois apareceu um que me deu 4 anestesias na cabeça, um verdadeiro banho, não reclamei, já estava todo molhado de sangue, depois eu estava indo tomar banho de mar mesmo. Não sei se por não ter carne na cabeça, a anestesia só pegou 50%, e para piorar ele costurou em espiral, deixando uma salcichinha.
Recauchutado quis ir embora, as 7 ondas do mar sagrado me chamavam, não deixaram. Meia hora depois chegou o irmão de Madame Satã, (trazido por 3 PMs) bem vestido, tinha até colete. No rosto, tinha um farol avariado e outro completamente apagado, fruto de uma provável bicuda de um dos PMs.
Tinha uma bola 7 (rôxa) de bilhar embaixo da pálpebra, impressionando a quem olhasse, o quanto pode inchar o globo ocular. Dizia desafiador em alto e bom tom:
Tenho a costa quente, estou por dentro da sonoplastia!
Pedi a Deus que me liberassem logo, o cara estava pedindo pra morrer.
Conheci Stella e lá vou eu pra Santa Tereza. Stella dividia uma casa com Calixto um ótimo pintor e ator e Elói Iglesias, famoso cantor performático no Pará, mas que no RJ, salvo engano de minha parte não se projetou.
Numa bela manhã subimos pra Santa Tereza, pegamos o bonde no meio da subida. Os bancos todos ocupados, Stella , grávida de uns 5 meses teve que ir em pé, agarrada no apoio do encosto de um passageiro, e eu fiquei no apoio do corredor.
Não era a toa que só tinha aqueles 2 apoios vazios, subimos e o bonde seguiu, enquanto no banco do meu corredor, um magricela em pé de frente a uma jovem de uns 20 anos, dava um senhor tapa no rosto da mesma.
Eu gelei, (expressão paraense muito apropriada por sinal) mas nem me mexi, afinal eu conhecia a Lei de Muricy:
Na Lei de Muricy, cada um cuida de si!
Também estava embasado pelo velho deitado:
Em briga de marido e mulher não se mete a colher!
Stella ferveu e disse:
Voçe deixa de ser covarde!
Ele não contou até 3 e sentou a mão no rosto de minha mulher.
Aí eu congelei.
Olhei lá no fundo do bonde, um senhor negro, uns 50 anos e bem forte, e pensei:
Bastaria eu dar um peteleco neste vagabundo, e todos os homens (éramos uns 6) fariam picadinho do patife.
Nem me mexi!
As leis incutidas desde pequeno nos amarraram, não sabíamos o tamanho do crime, (leia-se traição) que ela teria feito.
As mulheres conhecem a Lei:
Os homens podem ser "galinhas", as mulheres não!
Até hoje penso se fui Machista ou Covarde, já que não permito um tratamento desses numa criança, mas admiti numa mulher.
O destino não me deu outra chance, mas se ele me der será que farei diferente?
Leiteiro
PS: Apartir deste ocorrido, passei a acreditar que todos que são mortos pelas costas, ou dormindo, vêem seu assassino!
Quem morrer, verá!
Apenas as pessoas que já perderam totalmente a memória publicam suas memórias.
Oscar Wilde
O homem é um animal que pensa que é homem!
(Albert Camus?)
Cada um tem os seus erros... Não faz bem ficarmos aceitando influência negativa no nosso bem-estar devido 'as atitudes alheias.
Sem falar que não somos 100% corretos também!
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http://www.overmundo.com.br/banco/acredite-se-puder-machismo-eou-covardia