O SONHO DE UM CORONEL MACHISTA 22º EPISÓDIO
Venâncio quase não dormiu imaginando como seria sua primeira prosa com Dusanjo, fez diversos ensaios imaginários tentando melhorar seu vocabulário. Mas pau que nasce torto não tem jeito até a cinza é torta quando é queimado acidentalmente. O velho Miro descreveu a ele as qualidades da jovem e o alertou que ela era uma pessoa humilde e simples, mas tinha um linguajar impecável era muito culta. E também exigente com os trabalhadores, tratava a todos com muito respeito, mas ai daquele que pisasse na bola com sua obrigação no trabalho. Isso mexeu com ele.
Acostumado fazer seu desjejum levado à casa de apuração, ora pelo Prudêncio, ora por uma mucama, às vezes pela própria Inhá Chica. Faminto ele não redava o olho da trilha que dava acesso à cozinha da casa grande, sua noite de insônia o deixou varado de fome. Eis que dirrepente surge àquela beldade entrando pela porta com seu tabuleiro de café nas mãos:
-- Bom dia senhor, eu trouxe o seu desjejum. E o colocando sobre a banca de informar rapaduras, tomou dele a espumadeira tocando com suas, mãos finas e sedosas, sobre, as dele grossas e criminosas. Ao sentir aquele toque divinamente delicado o homem quase perdeu o chão.
-- Como é a vossa graça senhor?
--Ieu eeeé Venâncio as vossas orde sinhurinha!
--O senhor tome seu café tranqüilo, eu cuido da taxa de garapa para que não ferva com a espuma!
Enquanto Venâncio engolia quase sem mastigar, encabulado com a formosura daquela jovem, imaginando se teria mesmo coragem de liquidar uma pessoa tão bela e educada, ela recolhia a espuma da garapa com a taxa prestes a ferver. Quando o pistoleiro terminou de se alimentar ela terminava também de recolher a espuma, ele foi assumir a taxa, mas ela ordenou:
--Vá ativar o fogo, prineiro coloque mais lenha na fornalha, para depois prosseguir o trabalho de apuração, a garapa está toda limpa e não há mais perigo em pretejar as rapaduras, agora é só fogo até dar o ponto certo de apuração.
-- A sinhurinha intende memo de fazê rapadura cumo pode ua pessoa tun bunita e sabê fazê rapadura?
-- Olha senhor beleza não se põe na mesa, e o saber não ocupa lugar!
Apanhou o vasilhame que lhe serviu o desjejum e retornou para a cozinha indo ajudar nos afazeres da casa. E o pistoleiro, com seu linguajar matuto, passou o dia inteiro repetido àquela prosa:
--- Bereza num põe na mesa, e o sabê num ucupa lugá!
E ainda imaginado como faria para liquidar uma pessoa tão bela doce e educada como aquela.
Enquanto isso lá na capital da província, o toureiro Tira Teima esperava para viajar ao Bom Jardim, ou melhor, dizendo, à fazenda Bocaina. Trabalhando na montagem do circo de touros Dengoso, que mudou de bairro e nem era tão grande, conforme afirmou a ele, seu proprietário. Mas a carruagem do circo com a qual viajariam dependia de alguns reparos que estavam sendo executados, assim que essa pendência fosse resolvida eles fariam a tal viajem que consumiria no mínimo seis semanas entre ida e volta.
Tira teima pensou melhor e sugeriu ao Nicolau dono do circo, ao invés da viajem cansativa, seria mais prudente e econômico. Poderia o circo numa programação escalonada apresentando seus espetáculos de cidade em de cidade, pela região em direção ao Bom Jardim em cujo municipio situava a fazenda Bocaina. Levaria um tempo maior, mas seria bem mais viável economicamente, embora Bom Jardim sendo uma cidade pequena, mas somando a fama do boi pretête com a carência de eventos culturais na cidade, e o interesse de seu povo por um espetáculo circense. Dificilmente o circo suportaria tanta gente. Talvez obtivessem mais sucesso do que nas grandes cidades onde havia a concorrência de outros atrativos culturais. Nicolau gostou da idéia e resolveu estudá-la.
Lá na fazenda Morrinhos com a lua na sua fase minguante. O coronel Certorio virou hospede, só pernoitava,permanecendo lá até o horário do almoço. Tratando do Terencio como se fosse um rei e não um simples pião de fazenda rancador de erva daninha. Inácia passava o dia fabricando doce, queijo, requeijão e outras iguarias, para no dia seguinte ser levado a ele pelo coronel. Torcendo para que a fase minguante da lua se perpetuasse. Erva em seu latifúndio tinha para não acabar mais. E a lua certa seria a fase minguante para liquidá-la de vez segundo afirmava Terencio.
Diariamente após o almoço lá ia o coronel passar o dia com Jurema atendendo ao pedido do marido que o recomendava:
--Intonse coroné se nun fô ieu pidi dimais, voismicê vortano pra fazenda dá um pulinho inté minha casa na bera do riberão dexa lá pra Jurema, essa merenda qui voismicê troxe cum ixagêro, se ficá puraqui inté de tarde as furniga vai atacá e fazê a festa.
-- Que isso Terencio custa nada é ua vurtinha pititica num chega meia légua. As dispois ieu apruveito pra visturiá a boiada qui tá impastada in nossa divisa. Dexe cumigo qui faço isso pra voismicê cum maió prazê.
Na sua fazenda os escravos estavam eufóricos de tanta felicidade com a modificação implantada por Nicó, e nunca produziram tanto em tão tempo. Bastião e Inácia não cansavam de agradecer ao filho do coronel por tê-la livrado das chibatadas no tronco. Mas por outo lado temeroso, sempre afirmando que tudo aquilo que estava acontecendo era bom demais para ser verdade, que os escravos do coronel Certorio que se cuidassem, porque vida boa de escravo é prato raso, dura pouco. Pois o coronel agora parecia estar influenciado pela lua. Como tantas outras coisas. Na minguante ficava bonzinho, esquecia tudo, até a vingança alimentada pelo ódio que carregava no coração. Mas na lua nova, como não tinha rancação de erva, nem as caricias da mulher do arrancador, tudo voltava ser como antes.
Nicó só pensava No encontro com a Dusanjo, queria aproveitar a ausência do pai durante o dia para ir à fazenda Bocaina, selou um cavalo e mandou o escravo Chico Bento dar um pulo até lá, saber se sua musa já voltara da casa dos avós, o recomendou que sondasse apenas um dos agregados ou algum escravo. Por sorte assim que atravessou o rio e entrou nas terras do coronel Tiburcio cruzou com o Prudêncio levando um carregamento de rapaduras ao Bom Jardim:
-- Bão dia Prudêncio!
-- Bão dia Chico Bento há quanto tempo nois nun se vemo home!
-- Pois é Prudêncio o mardito do coromé Certorio pruibiu a gente de prusiá, ma agora a coisa mudô é o fio dele qui dá orde e sinozinho Nicó, ele saiu puxano a mãe, tem um Curaçao de oro, dá inté gosto de vê o tanto cas coisa miorô La in Morrinho!
-- Ma o qui tá cunteceno é milagre ô coroné Certorio bateu as bota e morreu?
Morreu nada voismicê num sabe qui vazia ruim nunca quebra. Cunteceu qui Nicó tava bandonano ele pru mode das judiação cu mardito tava fazeno cagente, intonse pra isso nun cuntecê coroné intregô pra ele. Os marditos dos capangas dele tumem foro tudo simbora e o home ficô foi suzinho, só cum os iscravo e tava tudo miaçano de Fuji. Se num é Nicó acarmá eze coroné tava era pirdido. Bão ma já qui nois topemo aqui ieu inté vorto daqui memo, ia lá só mode sabê se a fia do coroné Tiburcio já vortô da casa de vó.
-- Pru que isso foi mandado pru quem?
--Pru Nicó, o home virô a cabeça pru ela nun pensa notra coisa!
-- Eeeê isso num vai prestá, coroné tá sabeno disso?
-- Qui Nicó tá paxonado, pru ela sabe, ma qui mandô ieu aqui nun sabe não, tá intirtido pra banda do riberão, passa o dia namorano, inquanto Terenço trabaia rancano erva. Ma voismicê nun respondeu, ela já vortô?
-- Já, vortô sigunda fera ta lá garrada no sirviço ajudano in tudo qué trabaio da fazenda, ela tá sempre trabaiano nun fais outra coisa. Ma voismicê diga lá pru seu sinhozinho mode ele tumá tento, e pensá duas veis ô mais muitas veis inhantes de rumá ua increnca maió de qui á qui já tem, e invem indesde o tempo do bis avô dele.
--Ma esse perrengue Prudêncio só vai tumá fim quando coroné Certorio mudá pru arraiá do pé junto batê a cassulêta e morrê. Memo assim é capais de vortá mode brigá cus Montinegro!
-- Bão ma sabe dua coisa, coroné Tiburcio gostô do pruseio de Nicó, quereno butá fim nessa briga, ma cumo voismicê cabô de dizê isso vai cuntecê só dispois qui coroné Certorio morrê, se cuntecê, coisa qui ieu duvido qui cunteça.
Venâncio quase não dormiu imaginando como seria sua primeira prosa com Dusanjo, fez diversos ensaios imaginários tentando melhorar seu vocabulário. Mas pau que nasce torto não tem jeito até a cinza é torta quando é queimado acidentalmente. O velho Miro descreveu a ele as qualidades da jovem e o alertou que ela era uma pessoa humilde e simples, mas tinha um linguajar impecável era muito culta. E também exigente com os trabalhadores, tratava a todos com muito respeito, mas ai daquele que pisasse na bola com sua obrigação no trabalho. Isso mexeu com ele.
Acostumado fazer seu desjejum levado à casa de apuração, ora pelo Prudêncio, ora por uma mucama, às vezes pela própria Inhá Chica. Faminto ele não redava o olho da trilha que dava acesso à cozinha da casa grande, sua noite de insônia o deixou varado de fome. Eis que dirrepente surge àquela beldade entrando pela porta com seu tabuleiro de café nas mãos:
-- Bom dia senhor, eu trouxe o seu desjejum. E o colocando sobre a banca de informar rapaduras, tomou dele a espumadeira tocando com suas, mãos finas e sedosas, sobre, as dele grossas e criminosas. Ao sentir aquele toque divinamente delicado o homem quase perdeu o chão.
-- Como é a vossa graça senhor?
--Ieu eeeé Venâncio as vossas orde sinhurinha!
--O senhor tome seu café tranqüilo, eu cuido da taxa de garapa para que não ferva com a espuma!
Enquanto Venâncio engolia quase sem mastigar, encabulado com a formosura daquela jovem, imaginando se teria mesmo coragem de liquidar uma pessoa tão bela e educada, ela recolhia a espuma da garapa com a taxa prestes a ferver. Quando o pistoleiro terminou de se alimentar ela terminava também de recolher a espuma, ele foi assumir a taxa, mas ela ordenou:
--Vá ativar o fogo, prineiro coloque mais lenha na fornalha, para depois prosseguir o trabalho de apuração, a garapa está toda limpa e não há mais perigo em pretejar as rapaduras, agora é só fogo até dar o ponto certo de apuração.
-- A sinhurinha intende memo de fazê rapadura cumo pode ua pessoa tun bunita e sabê fazê rapadura?
-- Olha senhor beleza não se põe na mesa, e o saber não ocupa lugar!
Apanhou o vasilhame que lhe serviu o desjejum e retornou para a cozinha indo ajudar nos afazeres da casa. E o pistoleiro, com seu linguajar matuto, passou o dia inteiro repetido àquela prosa:
--- Bereza num põe na mesa, e o sabê num ucupa lugá!
E ainda imaginado como faria para liquidar uma pessoa tão bela doce e educada como aquela.
Enquanto isso lá na capital da província, o toureiro Tira Teima esperava para viajar ao Bom Jardim, ou melhor, dizendo, à fazenda Bocaina. Trabalhando na montagem do circo de touros Dengoso, que mudou de bairro e nem era tão grande, conforme afirmou a ele, seu proprietário. Mas a carruagem do circo com a qual viajariam dependia de alguns reparos que estavam sendo executados, assim que essa pendência fosse resolvida eles fariam a tal viajem que consumiria no mínimo seis semanas entre ida e volta.
Tira teima pensou melhor e sugeriu ao Nicolau dono do circo, ao invés da viajem cansativa, seria mais prudente e econômico. Poderia o circo numa programação escalonada apresentando seus espetáculos de cidade em de cidade, pela região em direção ao Bom Jardim em cujo municipio situava a fazenda Bocaina. Levaria um tempo maior, mas seria bem mais viável economicamente, embora Bom Jardim sendo uma cidade pequena, mas somando a fama do boi pretête com a carência de eventos culturais na cidade, e o interesse de seu povo por um espetáculo circense. Dificilmente o circo suportaria tanta gente. Talvez obtivessem mais sucesso do que nas grandes cidades onde havia a concorrência de outros atrativos culturais. Nicolau gostou da idéia e resolveu estudá-la.
Lá na fazenda Morrinhos com a lua na sua fase minguante. O coronel Certorio virou hospede, só pernoitava,permanecendo lá até o horário do almoço. Tratando do Terencio como se fosse um rei e não um simples pião de fazenda rancador de erva daninha. Inácia passava o dia fabricando doce, queijo, requeijão e outras iguarias, para no dia seguinte ser levado a ele pelo coronel. Torcendo para que a fase minguante da lua se perpetuasse. Erva em seu latifúndio tinha para não acabar mais. E a lua certa seria a fase minguante para liquidá-la de vez segundo afirmava Terencio.
Diariamente após o almoço lá ia o coronel passar o dia com Jurema atendendo ao pedido do marido que o recomendava:
--Intonse coroné se nun fô ieu pidi dimais, voismicê vortano pra fazenda dá um pulinho inté minha casa na bera do riberão dexa lá pra Jurema, essa merenda qui voismicê troxe cum ixagêro, se ficá puraqui inté de tarde as furniga vai atacá e fazê a festa.
-- Que isso Terencio custa nada é ua vurtinha pititica num chega meia légua. As dispois ieu apruveito pra visturiá a boiada qui tá impastada in nossa divisa. Dexe cumigo qui faço isso pra voismicê cum maió prazê.
Na sua fazenda os escravos estavam eufóricos de tanta felicidade com a modificação implantada por Nicó, e nunca produziram tanto em tão tempo. Bastião e Inácia não cansavam de agradecer ao filho do coronel por tê-la livrado das chibatadas no tronco. Mas por outo lado temeroso, sempre afirmando que tudo aquilo que estava acontecendo era bom demais para ser verdade, que os escravos do coronel Certorio que se cuidassem, porque vida boa de escravo é prato raso, dura pouco. Pois o coronel agora parecia estar influenciado pela lua. Como tantas outras coisas. Na minguante ficava bonzinho, esquecia tudo, até a vingança alimentada pelo ódio que carregava no coração. Mas na lua nova, como não tinha rancação de erva, nem as caricias da mulher do arrancador, tudo voltava ser como antes.
Nicó só pensava No encontro com a Dusanjo, queria aproveitar a ausência do pai durante o dia para ir à fazenda Bocaina, selou um cavalo e mandou o escravo Chico Bento dar um pulo até lá, saber se sua musa já voltara da casa dos avós, o recomendou que sondasse apenas um dos agregados ou algum escravo. Por sorte assim que atravessou o rio e entrou nas terras do coronel Tiburcio cruzou com o Prudêncio levando um carregamento de rapaduras ao Bom Jardim:
-- Bão dia Prudêncio!
-- Bão dia Chico Bento há quanto tempo nois nun se vemo home!
-- Pois é Prudêncio o mardito do coromé Certorio pruibiu a gente de prusiá, ma agora a coisa mudô é o fio dele qui dá orde e sinozinho Nicó, ele saiu puxano a mãe, tem um Curaçao de oro, dá inté gosto de vê o tanto cas coisa miorô La in Morrinho!
-- Ma o qui tá cunteceno é milagre ô coroné Certorio bateu as bota e morreu?
Morreu nada voismicê num sabe qui vazia ruim nunca quebra. Cunteceu qui Nicó tava bandonano ele pru mode das judiação cu mardito tava fazeno cagente, intonse pra isso nun cuntecê coroné intregô pra ele. Os marditos dos capangas dele tumem foro tudo simbora e o home ficô foi suzinho, só cum os iscravo e tava tudo miaçano de Fuji. Se num é Nicó acarmá eze coroné tava era pirdido. Bão ma já qui nois topemo aqui ieu inté vorto daqui memo, ia lá só mode sabê se a fia do coroné Tiburcio já vortô da casa de vó.
-- Pru que isso foi mandado pru quem?
--Pru Nicó, o home virô a cabeça pru ela nun pensa notra coisa!
-- Eeeê isso num vai prestá, coroné tá sabeno disso?
-- Qui Nicó tá paxonado, pru ela sabe, ma qui mandô ieu aqui nun sabe não, tá intirtido pra banda do riberão, passa o dia namorano, inquanto Terenço trabaia rancano erva. Ma voismicê nun respondeu, ela já vortô?
-- Já, vortô sigunda fera ta lá garrada no sirviço ajudano in tudo qué trabaio da fazenda, ela tá sempre trabaiano nun fais outra coisa. Ma voismicê diga lá pru seu sinhozinho mode ele tumá tento, e pensá duas veis ô mais muitas veis inhantes de rumá ua increnca maió de qui á qui já tem, e invem indesde o tempo do bis avô dele.
--Ma esse perrengue Prudêncio só vai tumá fim quando coroné Certorio mudá pru arraiá do pé junto batê a cassulêta e morrê. Memo assim é capais de vortá mode brigá cus Montinegro!
-- Bão ma sabe dua coisa, coroné Tiburcio gostô do pruseio de Nicó, quereno butá fim nessa briga, ma cumo voismicê cabô de dizê isso vai cuntecê só dispois qui coroné Certorio morrê, se cuntecê, coisa qui ieu duvido qui cunteça.