O maromba
Atualmente, ter um corpo escultural e definido é mais importante do que tudo no mundo. A maioria dos adolescentes frequentam academias e dietas rigorosas para poderem tirar selfies na frente do espelho e ganhar likes nas suas redes sociais. A questão de estar bem consigo mesmo e estar com uma vida saudável é muito válida e faz bem para essa geração, mas o pensamento de estar cada dia mais marombado e usar isso para encontrar seu lugar de respeito na sociedade é o mal do século.
Marcinho era um dos casos extremos do lado errôneo disso. Ele fazia da academia sua igreja e não tinha outro assunto que não fosse malhar, puxar peso, whey protein, frango, batata doce, trabalhar para pagar a academia e malhar mais. Faça chuva ou faça sol, lá estava ele, todo dia de plantão fazendo seus exercícios físicos e até mesmo quando ela estava fechada ele dava um jeito de correr ou de praticar outra atividade para não perder o clima. Nas redes sociais, como um marcador de ponto, ele postava uma foto sem camisa todo dia, com belas hashtags como #focoforçaefé #nopainnogain #projetocarnaval #treinopesado e por ai a fora.
A questão é que quanto mais ele malhava e ganhava massa muscular, mas ele perdia em massa cerebral. Certa vez, em uma discussão sobre distancia, Marcinho solta a seguinte pérola:
- Que isso sô, lá não é tão longe assim não. Dá uns 5 KM se você for a pé, mas se você for correndo cai para uns 2 KM.
Sem contar que ele cometia erros ortográficos fora de série nas redes sociais. Certa vez ele digitou que precisava comprar uma “causa”. Um colega, tentando zoar indiretamente, perguntou: “Mas pelo menos é uma causa justa?” e eis que Marcinho responde na maior naturalidade: “Não cara, é uma causa jeans mesmo”.
E ele vivia pelo carnaval. Treinava o ano inteiro para esculpir seu corpo e ir para a muvuca exibi-lo. Só que o engraçado era que o sujeito nunca usava camisa. E por nunca, entenda-se nunca. Você o via andando nas ruas, entrando em lojas, de dia ou de noite, com chuva ou sol, sempre sem camisa. Certa vez, um grupo de amigos foi buscá-lo na rodoviária e o viram sair do ônibus com uma camisa (e ainda por cima era um abadá de uma festa antiga). Curiosos, alguém pergunta:
- Uai Marcinho, resolveu usar camisa?
Ele nervoso responde:
- Pois é cara, não me deixaram entrar no ônibus sem camisa. Vontade de quebrar esse ônibus tudo, nada a ver isso vei.
E nos carnavais ele aprontava. O rapaz passava o ano inteiro sem beber por causa da dieta rigorosa e dos treinos constantes, tudo para tentar pegar o máximo de mulheres nos quatro dias de festa. Era a culminância da sua vida aquele momento. Daí ele bebia e ficava insuportável. Caçava confusão com todos durante a festa e na casa que geralmente a galera alugava.
E ele levava o dinheiro somente para o ônibus. Ficava os quatro dias filando comida dos outros e queria brigar caso alguém lhe negasse um misto quente. E se você oferecesse algo para ele dar uma mordida, ele pegava e dominava aquilo para ele e achava ruim se você pedisse de volta. Sem contar que ele brigava com todos na fila do banheiro para tomar banho, depois saia em menos de dois minutos, com a mesma roupa do dia anterior. E havia também a cantoria. Ele decorava todos os funks do momento e cantava e dançava a coreografia umas vinte vezes por hora, só para ensaiar para o show daquela noite. A galera já estava de saco cheio dele e prometia que nunca mais o chamariam para dividir uma casa.
Como de praxe, ele sempre arrumava confusão com alguém e acabava sua noite em uma briga. Era uma forma dele também demonstrar seus treinos para a população. Em uma dessas brigas, ele teve problemas com a polícia e após ser liberado, os colegas perguntaram:
- Mas e aí Marcinho, assinou o B.O.?
A massa cinzenta pensou e respondeu:
- Que nada cara, graças a Deus não! Só me pediram para assinar um Boletim de Ocorrência, mas tá tranquilo.