O Retorno da Onça Curiosa

E lá estava Alceu, velho forrozeiro e amante de um bom gole de cachaça, se aprontando para mais uma madrugada na farra abraçado à antiga a e irretocável sanfona, quando ouviu os vizinhos em pânico gritarem: – Olha a onça, olha a onça!

Os casebres espalhados pela periferia de uma Araxá em formação ainda se misturavam à mata do cerrado e eram separados por algumas dezenas de metros, por isso o combinado entre as famílias era de que em caso de ameaça todos se avisariam aos gritos. Havia também a orientação para que em caso de onça nas proximidades todos se abrigassem nos telhados, armados se possível, para protegerem a sim mesmos e aos seus da malvada felina.

Alceu escolado pela madrugada em que passou imitando um cão para não ser devorado foi o primeiro a subir nas telhas de barro e foi com tamanha pressa que se esqueceu de carregar a velha garrucha.

Naquela hora do fim da lida, era fato comum os homens e mulheres dessas casas estarem chegando da cidade ou do roçado e num sinal de alerta poderiam todos, para buscar segurança, subir ao telhado da casa mais próxima mesmo que não fossem as suas próprias. O que valia era o primeiro teto que estivesse na frente.

Nessa vigília do medo, Alceu se deu conta de que um vulto, provavelmente um de seus compadres, estava estrategicamente colocado na outra ponta do telhado de sua casa e parecia fitá-lo diretamente nos olhos. Alceu se aproximou arrastando o traseiro pelas telhas para não fazer muito barulho e cochichou aos ouvidos do compadre: – Ainda bem que a gente tinha esse telhado pra fugir da marvada onça, né compadre Zé?

Nesse momento, mesmo no escuro, Alceu se deu conta de que seu compadre balançava um rabo nervoso à beira do telhado, e que seus olhos refletiam no escuro a luz da lua.

– Eita que é a maldita da onça! – gritou o velho dedando várias vezes o gatilho da garrucha desmuniciada e rolando pelo telhado, caindo na moita ao lado da casa. Os vizinhos de longe ouviram tudo, e também noticiaram o velho Alceu correndo pela trilha abanando os braços e praguejando: – Sai de mim, praga dos infernos!

Ivan Anderson
Enviado por Ivan Anderson em 20/08/2015
Código do texto: T5352596
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.