JOÃO COITADO E SUA NINHADA DE NETOS

Pela primeira vez na vida João Coitado colheu milho e feijão em uma quantidade mais significativa. Embora eu desejasse impetuosamente ver meu compadre em melhores condições de vida, não foi possível. Após a colheita ele se mudou para seu tão sonhado casebre. Fugia de mim como o diabo da cruz. Enquanto duraram os suprimentos de sua safrinha o homem não trabalhou um dia se quer, eu tentei manter contato como ele, mas foi em vão.
La pelo meio do ano ele aparece em minha residência pedindo para voltar. Ao chegar de uma carvoaria o encontrei a minha espera.
-Bom tarde compadre que bons ventos o traz aqui homem-, pensei estar mal de mim, foi embora nunca mais apareceu! Passei em sua casa uma serie de vezes não o encontrei.
--Ieu iscundi doce uas duas ô treis veis, cocê passo perto de casa, mode qui fiquei cum vergonha docê vê ieu atôa incasa. Ma agora a coisa apertô os trem qui ieu cui, mio feijão cabô tudo, até as galinhas, qui nois tava tentano criá nois cumeu tudo. Ieu vim procê mim dá sirviço traveis aqui foi o lugá mió que já morei, noto lugá acabo inrolano e num trabáio direito é nada.
-- Tem um detalhe compadre você tem que colocar seus filhos na escola, aqui não tem escola, alem do mais agora só tenho trabalho na carvoaria.
--Ma é La memo qui ieu to quereno mode a muié ma os minino mim ajudá. Inquanto ieu pico lenha ela pode inchê forno e os mino ajuda. Fais isso pra mim omeno esse resto de ano, no ano qui vem ieu prometo cus minino vai paiscola, ieu sei queze tem de prendê lê. ieu vi qui tem um rancho vazio na carvuera.
-- Como que você sabe de rancho na carvoeira?
-Ieu fui La semana passada te caçano ma ocê passo poto caminho nois acabô num topano, aquel rancho ta até mió qui o meu só esse resto de ano ieu no ano qui vem to cotas idéia vô tentá a sorte potasbanda.
E assim meu compadre trabalhou mais uns três ou quatro meses cortando lenha e enchendo fornos ajudados pela mulher e os filhos. Trabalhava não para mim, mas para o carvoeiro que me prestava serviços. Um belo dia eu encontrei o rancho vazio, perguntei por ele o carvoeiro respondeu dizendo:
-- Mudou-se para o povoado da Extrema, acertei com ele, ficou de encher os fornos a partir do dia seguinte, a tarde ele se mudou sem dizer nada, sem briga sem motivo nenhum.
A partir dessa época perdi o contato com ele por completo, tempos depois eu soube que havia se mudado para Lagoa da Prata, indo trabalhar no corte de canas, soube também que sua esposa falecera e ele quase morreu de paixão. O tempo passou, mudamos para o centro do Engenho, e atarefado no comercio,esqueci do meu compadre. Certo dia minha filha caçula me chamou dizendo:
--Papai tem um veiculo ai fora é uma Brasília o moço ta chamando o senhor disse que não caminha, e pediu para o senhor ir La.
--Fui até La, era meu compadre João Coitado!
-- Ieu chamei ocê aqui, mode ocê vê minha ninhada de neto, tai oh o risurtado dusôvo chocano qui ieu cumi, taveno o istrago qui fiz mei duzia de neto afora arguns qui invem, que inda num saiu da forma. To viúvo pacabá de interá sufri um ar de istorpôr fiquei cum lado isquicido ocê num repara não, mais ieu num vô descê num posso demorà, meu fio tem pegá sirviço de tarde, má ieu num quiria imbora sem tivê.
- --Que bom compadre fico feliz Por ter se lembrado de mim e ao mesmo tempo saber que você ta sendo amparado por seus filhos, melhorou bem de situação, não é mais o João Coitado que conhecemos!
Ah cumpade as coisa num ta ruim não meus fiios ta bem de vida, cus imprego bão, cuidano de mim qui to pusentado, ma ieu quais morro de sodade daquele nosso tempo na roça, inda bem qui ieu tenho essa ninhada de neto mode mim consolá, sinão ieu era capais de morrê de sodade!








 
Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 06/01/2014
Reeditado em 06/02/2014
Código do texto: T4638465
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