O CAIPIRA SEM CARÁTER

Nos anos cinqüenta do século passado vivíamos, influenciados pelos princípios repassados por uma tradição de moral e respeito ao ser humano, fundamentados por uma doutrina de religiosidade que consumava no amor ao próximo e o temor a Deus. Qualquer ato profano cometido por um membro da comunidade o colocava a margem dos conceitos sociais e por si próprio ele se marginalizava como se estivesse cavado sua própria sepultura social.

Carola não foi apenas um mentiroso sem importância, foi também um tremendo de um mau caráter, e acabou caindo no descrédito da comunidade tornando-o visto como um elemento desaprovado e nocivo.

Enrolou uma pobre coitada filha de uma viúva agregada em uma fazenda a margem do velho Chico. Usou as piores mentiras para ludibriar a garota, sua mãe, e seu irmão. Jurando fazer dela uma rainha, com mil promessas de uma vida abastada, conseguiu seduzir a família inteira e engravidou a moça. Uma camponesinha trabalhadora e humilde como era também a mãe e o irmão.

Ele mentindo bem situado na vida como funcionário de uma empresa de BH, afirmando que gozava uma temporada de férias premio. Por ter trabalhado quase dez anos sem tirar férias. Crédulos o irmão e moça manifestaram o desejo de conhecer sua mãe.

Sabendo que a mãe não compartilhava de suas mentiras armou uma estratégia dizendo que ela viajara as pressas para assistir uma tia. E que só voltaria para seu casamento. Mas fazia questão que seu futuro cunhado fosse conhecer sua casa, recém construída, já com sua mobília, cheirando a verniz também novinho em folha.

O cunhado aceitou o convite e veio conferir. Por coincidência estava sendo descarregado moveis novos em uma casa recém construída numa das principais ruas do povoado, momento oportuno para o mentiroso confirmar sua embromação. Mas com um pequeno detalhe, que seu cunhado não teve a curiosidade de perguntar, ao transportador da mobília, contratado pelo proprietário, da casa cujo casamento se realizaria naquele fim semana. Carola que o esperava na venda conforme, haviam combinado conseguiu enganar o cunhado afirmando que era sua, aquela residência. Ele não hesitou em aprovar o enlace do malandro com sua irmã.

Marcou o casório. Dizendo que sua mãe e seu único irmão não iriam comparecer, pois sua tia estava nas ultimas dependo de sua assistência. Realizou o casamento, apenas no civil, prometendo se casar no padre quando a mãe voltasse de viagem.

A pobre jovem o acompanhou toda feliz, imaginando estar realizando um sonho muito além da sua expectativa de certo modo até emocionada, ao encontrar uma casa nova, bem mobiliada como testemunhou seu irmão. Isso estava muito a frente do seu desejo de roceira simples honesta e trabalhadora.

Quanta canalhice é capaz de praticar um homem sem caráter. Ela uma jovem frágil enganada de forma tão cruel por um brutamonte sem coração. O máximo que o canalha ofereceu a ela foi um casebre sem reboco mal conservado sem se quer um giráu que servisse como leito para o casal. Cedido por um senhor, para o qual ele fazia pequenos bicos de vez em quando. Sua mãe que nunca viajara conforme descreveu o pilantra, quase morreu de susto, mas como era uma excelente pessoa, os acolheu com todo carinho, pobre e sem recursos financeiros, pouco pode fazer para o casal, a não ser recorrer aos amigos, que acataram seu apelo, e cederam alguns moveis usados para que ele se instalasse no tal casebre.

Trabalhando como diarista fazendo bicos aqui e ali, bebendo e mentindo ele não perdeu a pose se gabando com o casamento, enquanto ela era assistida com muito carinho pela sogra.

Embora esse fator a tenha confortado um pouco, sua depressão fizera com que seu bebê nascesse subnutrido vindo há falecer poucos dias após vir ao mundo. Apesar do grande apoio que a comunidade consternada lhe ofereceu após tomar conhecimento de seu drama. Abatida pela paixão com o seu coração de mãe dilacerado pela tristeza, a morte a levou também!

Geraldinho do Engenho
Enviado por Geraldinho do Engenho em 20/05/2013
Reeditado em 20/05/2013
Código do texto: T4299615
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